Morreu Fantomas. Naqueles ensolarados dias da infância e também nos dias cinzentos e chuvosos eu ia caminhando para a escola. Caminhando e fumando um Macedônia, cujo maço eu carregava na mala junto com uma cebola para não ficar cheiro. Caminhando, fumando e pensando na identidade secreta do Fantomas. E vendo os Cap-4 do Aeroclube de São Paulo fazer a perna do vento. Com eles e seu amarelo Caterpillar começou a nascer a compulsão de voar. Quem seria Fantomas? Eu tinha pistas que aos poucos foram eliminadas. Fantomas não poderia ser Pirota e ao mesmo tempo lutar contra Pirota. Ou será que no dia dessa luta alguém se disfarçou de Fantomas? Assunto quente para a hora do recreio, quando eu fazia pose de intelectual para a nova vizinha. Também não poderia ser o índio paraguaio Russiti, sujeito mau de verdade que chegava ao extremo de levar limão para esfregar nos olhos dos adversários. Sempre fui contra isso. Entre o Macedônia da ida e o da volta, sem tragar, apenas enchendo a boca de fumaça e soltando no ar como Humphrey Boggart, eu me imaginava adulto, pegando o ônibus Estações em movimento para ver luta-livre. Nas noites de sextas-feiras, no Ibirapuera, lutava o grego Kostólias, campeão mundial. Tenho essa falha no currículo, quando chegar a hora da verdade serei obrigado a admitir que nunca vi Kostólias lutar. Ele não participava das noitadas da TV Record aos sábados. Meu pai dizia que era porque estava cansado da luta de sexta-feira. Fazia sentido, a explicação tinha lógica. Naquela época eu já estava começando a entender as coisas pelo prisma da visão científica. Mesmo assim voltei a fumar na adolescência e só parei quando percebi que não valia a pena. Pra quê?
Nota do Editor: Sidney Borges é jornalista e trabalhou na Rede Globo, Rede Record, Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo (Suplemento Marinha Mercante) Revista Voar, Revista Ícaro etc. Atualmente colabora com: O Guaruçá, Correio do Litoral, Observatório da Imprensa e Caros Amigos (sites); Lojas Murray, Sidney Borges e Ubatuba Víbora (blogs).
|