O Jornal “Bom Dia Brasil” do dia 17/03, que pode ser consultado no site http://globo.com/bomdiabrasil, fez uma grave denúncia: os livros de Geografia produzidos pela Fundação Vanzolini e que estão sendo usados na rede de ensino estadual apresentam mapa da América do Sul em que desaparece o Uruguai e, no seu lugar, aparece o Paraguai; também há problemas na demarcação da Bolívia e do Paraguai. O pior é que, procurada pela reportagem, a Secretaria se recusou a gravar reportagem, distribuindo uma nota de que os livros não serão recolhidos porque a Fundação já fez uma correção e que os professores já foram comunicados, via internet. Segundo a especialista Silvia Gasparian Colello, isso não seria suficiente porque o uso do livro não se restringe à sala de aula, com o professor presente; pode ser consultado numa biblioteca, em casa ou em qualquer outro lugar e estaria disseminando uma informação falsa. Na década de 80, trabalhei na Fundação do Livro Escolar, onde várias equipes analisavam a qualidade do livro e organizavam oficinas para discutir com professores, editores e pesquisadores essas questões. Um problema apontado pelos professores era a dificuldade que tinham para convencer os alunos de que certas informações dos livros não estavam corretas. Talvez isso se deva a supervalorização do escrito pelo seu caráter de maior permanência, visto que o falado se perde, a não ser que seja gravado. A Fundação chegou a constatação que era necessário investir na formação de professores e só publicar materiais alternativos e relatos de boas práticas de ensino. Nesse momento, as editoras se sentiram ameaçadas em seus interesses comerciais e pressionaram o governo do Estado. Assim, o trabalho foi interrompido e continuamos a ver a repetição desse fato divulgado pela Globo. Um outro fato constatado pela Fundação é que muitos livros enviados à escola pelo Governo Federal não eram utilizados pelos professores ou eram desviados pelo caminho. Assim, não haveria necessidade dos governos estaduais e municipais gastarem verbas com a produção de livros didáticos, a não ser que fossem para complementar informações inexistentes nos livros de distribuição nacional, ou seja, relacionadas à cultura e à geografia regional e local. Como as escolas particulares apresentaram um desempenho no IDEB – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica - um pouco melhor que as escolas estaduais e municipais, e que, em geral, essas escolas usam apostilas e materiais próprios, talvez se tenha achado que a solução para melhorar o IDEB estivesse aí, ou seja, produzir seus próprios materiais. Propostas para a educação do século XXI No final da década de 90, a UNESCO criou uma comissão para analisar a educação, apontar problemas e soluções. Dirigida por Jacques Delors, antigo ministro da Economia e Finanças da França, contava com quinze especialistas de diferentes partes do mundo. O relatório dessa comissão, com propostas para o século XXI foi publicada com o nome de “Educação – Um Tesouro a Descobrir”. Segundo esse relatório, “... importa por de lado, a todo custo, qualquer tentativa de produtividade a curto prazo que possa comprometer a qualidade do ensino. Assim, o aumento do número de alunos por turma não tem razão de ser quando esse número é já muito elevado...” Também afirma que “... o desenvolvimento das novas tecnologias não diminui em nada o papel dos professores, antes pelo contrário; mas modifica-o profundamente e constitui uma oportunidade que devem aproveitar (...) o professor já não pode, numa sociedade de informação, ser considerado como o único detentor dum saber que apenas lhe basta transmitir. Torna-se, dalgum modo, parceiro dum saber coletivo, que lhe compete organizar situando-se, decididamente, na vanguarda do processo”. O Estado, então, em vez de gastar verbas com a compra de livros didáticos, faria muito mais pela educação se reduzisse o número de alunos por sala, investisse mais na formação de professores e garantisse melhores condições de trabalho e de higiene nas escolas.
Nota do Editor: Rui Alves Grilo é professor da rede pública de ensino desde 1971. Assessor e militante de Educação Popular.
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