Uma vez escrevi um conto que falava de uma possibilidade tecnológica do futuro, uma possibilidade cada vez mais real e que poderá nos remeter, de volta, aos tempos mais obscuros da idade média. Era um conto, hoje parece premonição. Nesse conto, relatei a coroação dos esforços fundamentalistas de todas as matizes. Destruir em nome de Deus. Começou quando um pesadelo que durou quase cinqüenta anos parecia ter chegado ao fim. A ameaça da hecatombe nuclear. No final da Guerra Fria os soviéticos haviam desenvolvido artefatos nucleares portáteis, pequenos, porém desajeitados e difíceis de serem contrabandeados. Eram do tamanho de uma mala de viagem das grandes. Pesavam cerca de cento e oitenta quilos. Ninguém jamais saberá quantos artefatos desses foram fabricados, nem sua potência. Sabe-se que a miniaturização estava em curso e que os cientistas que trabalhavam nisso ficaram desempregados. Quem garante que não estejam em algum laboratório subterrâneo, nos confins do Oriente Médio, diminuindo ainda mais as tais bombas? Primeiro elas ficariam do tamanho de uma mochila escolar, depois de uma garrafa térmica. Nesse momento o problema seria apenas de quantidade. Quando a escala produtiva atingisse alguns milhares de exemplares, restaria distribuir as bombinhas pelas principais cidades do ocidente e detoná-las. Milhões morreriam, as cidades ficariam inabitáveis com os resíduos de radiação. Faltaria tudo, comida, luz, água, remédios, assistência aos feridos e nesse estado viria à tona o verdadeiro eu do ser humano, fera travestida de animal social. A fome faria renascer o canibalismo, crianças seriam caçadas como presas, para serem comidas. A sociedade organizada existiria apenas na lembrança dos mais velhos. O quadro futuro nem precisaria ser pintado, todos os esforços seriam no sentido de dar o troco, os arsenais nucleares seriam acionados e em pouco tempo não haveria mais vida no Oriente Médio, morreriam todos, inclusive os aliados, o quê fazer? A radiação se espalharia pelo mundo, atingindo o Brasil, aqui a morte seria lenta, ninguém acreditaria no fim, até estar enterrado. Enquanto isso, nos Estados Unidos, no fundo de uma caverna cavada na rocha, com abastecimento para cem anos, Bush e seus generais, passariam os dias ociosos atentos às informações dos satélites. Procurando a localização exata de uma caverna no Afeganistão. Lá ficaria o esconderijo de Bin Laden, que há cinqüenta metros de profundidade, estaria voltado para Mecca, rezando.
Nota do Editor: Sidney Borges é jornalista e trabalhou na Rede Globo, Rede Record, Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo (Suplemento Marinha Mercante) Revista Voar, Revista Ícaro etc. Atualmente colabora com: O Guaruçá, Correio do Litoral, Observatório da Imprensa e Caros Amigos (sites); Lojas Murray, Sidney Borges e Ubatuba Víbora (blogs).
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