O Terêncio era o filho mais velho do seu Pedroso, um vizinho e compadre do meu avô paterno. Moço despachado, conhecedor de toda a lida do campo, juntara uns trocos trabalhando na esquila e no ofício de alambrador. Com vinte e poucos anos já era dono de uma ponta de campo e de umas cabeças de gado lá pros lados da Bossoroca. Nas horas de folga, com auxílio dos irmãos, construiu um rancho de pau-a-pique, piso de chão batido, coberto de santa fé, uma beleza de morada, perto do arvoredo de uma tapera velha que existira por ali. A essas alturas da vida Terêncio sentia falta de uma companheira, sentia que era a hora de arrumar um cambicho, uma prenda para alegrar os seus dias e esquentar as suas noites. Mas essa não era uma tarefa fácil naquelas bandas pois existiam poucas moças solteiras e disponíveis para casar. Haver até havia, a filha mais linda do seu Juvêncio, a Leonora. Mas acontece que essa Leonora era conhecida pela sua brabeza, mandona como ela só, uma cruza de jaguatirica com cruzeira que espantava qualquer pretendente. Mas Terêncio não era homem de assustar com cara feia e resolveu enfrentar a fera. Como mandavam os costumes daqueles tempos, começou pedindo permissão ao seu Juvêncio para namorar com a Leonora, que tinha boas intenções e que era um homem trabalhador e essa coisa toda. O futuro sogro aprovou de imediato e disse que fazia muito gosto de ter um genro assim trabalhador e honesto mas que tinha também a obrigação de lhe avisar que a filha era geniosa, briguenta, birrenta, teimosa, empacadeira como uma mula e por qualquer me dá cá essa palha já armava um medonho dum escarcéu. Deixe comigo, disse o Terêncio, sei bem como se amansa uma potranca xucra. E assim transcorreu o namoro e o noivado, Terêncio procurando um lado de chegar e a Leonora escoiceando e corcoveando. E Terêncio só insistindo: quando casar se ajeita... deixe comigo. Casaram num sábado chuvoso de agosto, a noiva mais ou menos comportada como a cerimônia exigia e o noivo mais faceiro que pica-pau em tronqueira. E logo depois do almoço já iniciaram a viagem de umas duas léguas até o rancho onde iriam viver. A condução era um luxo para aquela época, uma aranha puxada por uma gateada mais que acostumada com aqueles corredores cheios de macegas e tacurus. E foi num lançante meio brabo que a égua resolveu empacar. O Terêncio desceu da boleia, puxou o revólver, apontou para a cabeça da égua e gritou: é um... é dois... e a égua resolveu seguir em frente sem novos problemas. Já chegando na casa, uma galinha começa a cantar bem no meio do pátio. Terêncio puxa o revólver, aponta para a galinha e começa a contar: é um... é dois... é três... e dispara um tiro na galinha dizendo: no meu terreiro galinha não canta... e tu, mulher, aproveita e vai limpá essa galinha pra fazer uma canja que estou com fome! A jaguatirica saltou ligeiro: - e eu lá sou mulher... no que foi interrompida pelo Terêncio que começou: é um, é dois... é... e a Leonora, meio assustada, conclui: - e eu lá sou mulher que precise mandar duas vezes! Sim senhor, meu marido! E viveram felizes por muitos e muitos anos, tiveram uma penca de filhos e um montão de netos, a Leonora sempre a mais meiga e carinhosa das esposas, o Terêncio o mais orgulhoso e faceiro dos maridos.
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