Lúcio na fila do banco, esperando há mais de 50 minutos para ser atendido. Um senhor vira-se e puxa conversa. - Que demora, hein! - É. - O pessoal dos caixas fica de conversa e a coisa não anda. - Pois é. - Todo dia é a mesma coisa! - Pois é. - Hoje ainda só tem dois caixas atendendo. - É. - Ficam brabos se a gente reclama... - É. - E esse tempo, hein? Chove ou não chove? - Não sei. - Vi na previsão que não chovia, mas pelo jeito vai cair uma água... - Pode ser que sim. - Tem chovido muito nestes últimos dias... - É. - O início do apocalipse. Está na Bíblia! - Pois é. - Sabe por acaso que jogo vai passar na TV, hoje? - Não. - Também, não! Mas acho até que vou assistir ao jogo do meu time na casa do cunhado... Sabe como é cunhado: se fosse bom não começava com essas duas letras... Pelo menos para alguma coisa tem que servir, né? Há! Há! Há! - É verdade. - E essa fila não anda! Outro dia eu fiquei uma hora e meia esperando. O bom é que a gente vai conversando e nem vê o tempo passar... - Pois é. - Veio receber? - Não. - Eu vim. Sou aposentado. Trabalhei 25 anos em uma empresa que fabrica lâmpadas... - Bom. - Ela faz outras coisas também. Mas eu sempre trabalhei na área de lâmpadas. - Pois é. - Trabalha? - Não. - Essa crise pegou todo mundo mesmo! Os empregos sumiram... - É. - Mas não desiste, meu filho! Daqui a pouco tu achas um... É jovem! - Acho. - Quando eu tinha a tua idade cheguei a trabalhar de garçom, vigilante de boate... - Bom. - A gente vê cada coisa por essas noites... - Pois é. - Depois que casei, larguei a noite... - Bom. - É casado? Tem namorada? - Não! - Está certo! Com esse monte de guria bonita que anda por aí, só louco para casar! Elas que estão atacando agora, né meu filho? - Pois é. - No meu tempo não era assim. Era coisa mais reservada. Hoje, está tudo solto... - Pois é. - Estava te olhando agora: quem é o teu pai? - Jorge. - O da fruteira? - Não. - Tu és parecido com o Jorge da fruteira. Conhece? - Não. - O que o teu pai faz? - Agora, nada! - Aposentado? - Não... Não... Falecido. - Ah... Faz tempo? - Não. Um dia. - Oh Meu Deus! Meus pêsames... Meus pêsames, meu filho! - Arãn. - Será que eu conhecia o teu pai? Onde ele morava? - Em São Paulo. - Acho que eu não conhecia, não! - Preciso ficar um pouco em silêncio. Ainda estou muito abalado. - Claro! Claro! Compreendo. Segundos depois... “Ufa! Que velho chato! Que conversa chata! Mas acho que me livrei dele com essa estória! Graças a Deus!” Pensou Lúcio. Três minutos depois do fim do bate-papo, o pai de Lúcio entra no banco e logo vê o filho. - Filho! Que bom que tu estás aqui! Paga essa contar pra mim enquanto eu vou abastecer o carro! Toma: dinheiro e contas... Fui! Lúcio ainda ajeitava as contas deixadas pelo pai quando o senhor virou-se e indiscretamente, com um ar de deboche, bateu em seu ombro e disse: - Agora já posso morrer, meu filho! Já vi de tudo nesta vida... Até morto andar!
Nota do Editor: Rodrigo Ramazzini é cronista.
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