- E do Adelmo Junior. Lembra? - Claro que lembro! Ah! Ah! Ah! - Ah! Ah! Ah! Boas lembranças. Ótima época. - Ai ai! Só você, Fátima, para me fazer rir. As recordações dos seus namoricos da adolescência trouxeram-me um pouco de alegria. Até relembrei alguns dos meus... - Uma pena foi você não ter encontrado, ao longo desta vida, alguém que lhe amasse como mereceria, minha irmã. - Pois é... Pensava sobre isso esses dias. Acho que fui amada e não soube ver esse amor. - Que história é essa? Como assim? Todo mundo sabe que os teus maridos nunca lhe deram o devido valor... - Infelizmente isso é uma verdade, mas... - Mas? - Pegue a minha carteira dentro daquela bolsa. Vou lhe mostrar algo que guardo há muitos anos... - Toma. - Leia. - Pelo estado do papel, faz muito tempo que esse bilhete está aí... - Faz mesmo. Muitos anos... - Bem. Aqui diz: “Amada Marta. Pensava que apenas os loucos viam a vida de uma forma diferente. Foi então que me apaixonei e juntei-me a eles. O problema é quando a loucura do amor não é correspondida e leva-nos a fazer coisas de loucos. Assinado Rodolpho”. Que história é essa, Dona Marta? Pode contando tudo? - Bem! - Não enrola! - Bom! O Rodolpho foi um namorado que tive em um dos meus períodos escolares. Você era pequena, por isso não lembra desta história. Ele não era muito bonito, e sim, simpático e inteligente. Vivia dizendo que há anos queria me namorar, que me amava, coisa tal... Dei-lhe uma chance. - E daí? - Bom. Daí, na época namoramos um tempo, mas minhas amigas o achavam “estranho”, por ser um cara muito fechado e nada bonito. Por influência acabei o desprezando. O larguei para ficar com o Milton, o “queridinho” das meninas da escola. - Entendi! Só não entendi onde entra esse bilhete? - Calma! Vou chegar nele. Depois que terminei, mesmo estando com o Milton, o Rodolpho insistiu uma centena de vezes para voltarmos. Utilizou as mais diversas maneiras, fazendo infinitas declarações de amor... - E? - E daí, era uma sexta-feira de agosto. Acho que nunca vou esquecer. Esse bilhete chegou pelo correio. Na hora li, mas não compreendi. Só fui entender o significado no dia seguinte, quando soube que Rodolpho havia se suicidado... - Minha irmã! Que história essa que você está me contando. E a família dele, o que disse na época? - A família falou que Rodolpho sofria de depressão e que esse era provavelmente o motivo, coisa e tal. Mas a verdade é que eles nunca ficaram sabendo da existência deste bilhete. Não sabem o verdadeiro motivo. - Duro. Mas romântico, por outro lado. - Pode até ser romântico pelo ato, mas não para os que ficam. Ainda mais eu, que carrego uma ponta de culpa nesta história. Sofri muito por vários anos. - E carregou essa história durante a vida toda e não a contou a ninguém? - Sim! Foi um segredo que guardei ao longo da vida. Deitada aqui nesta cama de hospital, à beira da morte, esta história voltou com força em minhas lembranças... - Não diga isso minha irmã! Você vai sair dessa... - Você sabe que não! Não tem volta... Sabe minha irmã, a proximidade com a morte nos leva a refletir sobre a vida que levamos enquanto estivemos aqui na terra. A pensar sobre as coisas certas e erradas que fizemos ao longo dela, se vivemos como gostaríamos de ter vivido. Deveríamos fazer este tipo de reflexão durante a vida, e não no final, afinal, agora não dá para mudar mais nada. Não acha? - Você tem razão! - Foi em uma dessas reflexões que lembrei de Rodolpho. O fato de recordar essa história e saber que fui verdadeiramente amada uma vez nesta vida me reconfortou. - Bom saber, minha irmã! - Pois é... Então, religiosa como sou, para driblar a tristeza deste meu fim, comecei a acreditar que Rodolpho está me esperando em algum lugar do lado de lá. Passei há aguardar as horas de forma ansiosa, para que, finalmente, eu possa viver esta história de amor!
Nota do Editor: Rodrigo Ramazzini é cronista.
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