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COLUNISTA
Rodrigo Ramazzini
27/07/2007 - 10h10
O seu Esperança
 
 

Era uma visita prometida há muito tempo, mas que só ocorrera agora. O Gilmar finalmente voltara à cidade onde passou a infância. Era no interior do estado, sendo que um tio era o único laço sanguíneo que ainda possuía por lá, pois o resto da família havia se mudado para a capital.

Foi recebido com festa. Os olhos do casal de tios marejaram. Há dez anos não se viam. Era 11h00min da manhã. Feita a calorosa recepção, a tia Emy “correra” para volta das panelas para preparar um saboroso almoço. Gilmar e o tio Garibaldi sentaram-se à sombra de uma árvore, ao lado da casa, para colocar os assuntos em dia e tomar chimarrão.

Entre uma cuia e outra, um assunto e outro, tio Garibaldi acenava para quem cruzasse pela rua em frente à residência. Cidade pequena (sabe como é) “todo mundo” se conhece. Foi então que apareceu o seu Esperança, de bicicleta, com uma pequena caixa de madeira adaptada na garupa, oferecendo para compra melões. Tio Garibaldi gentilmente recusa a oferta. Seu Esperança despede-se. Gilmar questiona:

- Quem é tio?
- O seu Esperança, não lembra dele? Era dono do bar que vocês roubava pirulito quando guri...
- Não recordo, não!
- Vida sofrida a do seu Esperança... Vida sofrida...
- Ah é!
- É... É sim!
- Conte-me!

Tio Garibaldi começa então a narrar à história de vida do seu Esperança.

- O seu Esperança é o caçula de 14 irmão. Só Deus sabe onde foi parar essa gente toda. Ele não sabe se tão vivo ou morto. Foram se espraiando por esse rincão, mas não se falaram mais. Hoje, mora ele e a mulhé. Mulhé essa que acabou de se curar de um câncer... Câncer nos rim... Eta doença ruim! A véia fico carequinha carequinha... O seu Esperança teve uma única cria... Morreu com o único tiro que se deu por essas bandas... O guri tava andando de bicicleta na praça, quando ocorreu uma briga no buteco. Um dos brigão tava armado e prendeu fogo, mas o infeliz tava tão bêbado que erro o tiro e pego no guri.

- É tio?

- É... É sim! Tempos atrás, o seu Esperança teve um bar. Esse que ti falei antes. Não é que o bendito bar do homi pego fogo. Não sobrou nada... E pior, além do bar, a casa do infeliz que ficava nos fundo também queimo. Ele e a mulhé ficaram só com a ropa do corpo, não salvaram nada...

- E aí tio?

- Ai meu filho é que cidade se sensibilizo, e ajudou o seu Esperança. Ele ganho ropa, cumida e até uma terrinha, onde planto melancia... E não é que quando o véio tava com uma boa plantação, até tava ganhando um dinheirinho, não é que caiu um temporalzão de granizo? Coisa mais feia do mundo! Era cada pedrão que só vendo. Não sobrou uma melancia inteira...

- E aí tio?

- Depois das melancia, ele não desistiu... Eu já tinha desistido da vida, mas o seu Esperança não! Com o últimu dinheirinho que tinha, o véio compro uma carrocinha e um cavalu meio pestiado. Cuido du bicho, o bichu fico bom, boto então o cavalu na carroça e saiu à cata papel pela rua. E não que as autoridade começaram a reclama que a carroça do seu Esperança tava atrapalhando o trânsitu. Achavam bom o que ele fazia, mas que tinha que paga impostu, daí o seu Esperança teve que pará com a catação de papel...

- E aí tio?

- Aí... Aí se eu fica ti contando a história do seu Esperança vo entra a tarde adentro. Só pra ti resumi. O véio agora ta aí, vendendo melão da fruteira do seu Aldo de casa em casa...
- Pô tio, que história! Só o que o senhor contou-me já daria um livro... Esse justifica o apelido Esperança. Um legítimo Brasileiro. Não desiste nunca... Trabalha crendo que o amanhã será bem melhor que o hoje...
- Pois é meu filho... Pois é... É não! Esperança não é apelido não! É o nome dele mesmo...


Nota do Editor: Rodrigo Ramazzini é cronista.
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