- Ele é o homem que eu sonhava! Confidenciava a Michele para o seu travesseiro. - A mina é gostosa! Gabava-se o Carlinhos no bar para os amigos. Assim iniciou o namoro. Adjetivos e suspiros para todos os lados. Não se desgrudavam. A paixão tomara os corações. Entre apresentações a familiares, aumento da intimidade e pequenas brigas, o tempo transcorria. Quando se aperceberam, já estavam a comemorar o primeiro ano de relacionamento. Festa! E foi nesta celebração que tudo começou. Apesar de ser aniversário de namoro, foi festejado em família. Na mesa do jantar, cercado pelos pais e irmãos da Michele, o Carlinhos comia tranqüilamente a lasanha preparada pela sogra, quando o sogro, após uma breve “tossidinha”, falou: - Coff! Coff!... Carlinhos, meu filho! A Michele comentou comigo sobre os seus planos de casar em breve... Quando o sogro proferiu tal frase, o Carlinhos engasgou-se com a lasanha, tendo de ser acudido pela sogra. Não cogitara, nem ao menos comentara com a Michele uma única vez tal possibilidade. Recuperado, olhou-lhe. Ela estava com um brilho no olhar. Há tempos não via alguém assim. Desencorajou-se em desmenti-la, apesar de notar que tal cena havia sido muito bem ensaiada. Pensou um pouco, e respondeu: - Hmmm hum... Er... Ahn... Estamos estudando tal possibilidade sim, senhor Mendes! Ao término da frase, Michele “voou” no pescoço do Carlinhos, e beijando-o, só dizia: - Meu amor! Obrigado meu amor! Obrigado! Assim começou o tormento da vida do Carlinhos. Desde dia em diante, a Michele só falava do casamento, não tinha outro assunto. Comentava dos detalhes da festa, do seu vestido, dos padrinhos, e assim, neste planejar sem fim, passou-se mais um ano. Quando o Carlinhos pronunciou que, por falta de capital, eles não teriam uma festa de casamento, os olhos da Michele ficaram marejados. Mas logo ela reagiu, abraçando-o, e dizendo: - O que me importa é ficar com você! Bom! Além da prova de amor recebida, Carlinhos acabara de se livrar dos festejos. Algo que, segundo os seus conceitos, só servia para gastar e encher a barriga dos outros. Três anos se passaram após este episódio. Carlinhos, com o dom de enrolar que poucos possuem, nem tocava na palavra casamento, nem ao menos morar juntos. Michele, seus pais, irmãos, sogros, tios, primas, vizinhos, iniciaram uma convicta campanha. O pressionavam quase diariamente. A protagonista Michele não perdia uma chance de cutucá-lo, fosse por indiretas, em conversas com amigos, ou diretamente, tentando falar do assunto, onde o foco agora nem era mais o casamento em si, e sim, morar juntos. Repetia: - Quando tivermos a nossa casa... – Não vejo à hora de dormirmos junto. Dentre outras coisas. Carlinhos reagia com a calma de monge tibetano, e apenas sorria. Foi então que, em uma noite de sábado, o “milagre” aconteceu. Carlinhos fora fazer a barba antes do banho. Olhou-se no espelho do banheiro por alguns minutos. Notou que a face jovem começara a dar lugar a pequenas rugas. Passou a mão dentre os cabelos e alguns fios brancos apareceram. Analisou-se da cabeça aos pés, seminu, observara a pequena “barriga de cerveja”. Refletiu: - Estou ficando velho... E assim a decisão foi tomada. Ligou para Michele, queria encontrá-la em uma hora, pois tinha novidades. Não quis adiantá-la por telefone, apenas dissera: - É boa! Decorrido o tempo, lá estavam eles em um restaurante no centro da cidade. Carlinhos começa o discurso: - Michele, meu amor! Hoje tomei uma decisão importante. Refleti e resolvi, após os seus vários apelos (Se assim posso chamar), atender os seus anseios. Decidi... Decidi: dentro de cinco meses iremos morar juntos, ou seja, em dezembro próximo. Esperando uma efusiva comemoração por parte de Michele, Carlinhos abre um sorriso e os braços, esperando o “jogar” da sua amada sobre si. Não é o que acontece. Michele baixa a cabeça, pensa um pouco, e responde: - Por que não deixamos para maio do ano que vem? Vai-se entender a cabeça das mulheres...
Nota do Editor: Rodrigo Ramazzini é cronista.
|