Era o melhor clínico-geral do Hospital Central Diamond, um conceituado e luxuoso centro médico, freqüentado pela classe média alta, embora também atenda a comunidade em caso de emergência grave. Tem um convênio com a previdência social para realizar os atendimentos gratuitos. Suas consultas eram corretas e seus diagnósticos, precisos. Era procurado por todos os pacientes que davam entrada no Diamond. Alguns tinham sorte. Outros eram atendidos pelo médico que estava de plantão durante as folgas do Doutor Jonas Nascimento. O Doutor Jonas era um homem ético, talentoso e adorado pelas crianças, adultos e idosos. Também era respeitado pelos atendentes, faxineiros, enfermeiros e metade da equipe de médicos do hospital onde trabalhava. Quando o caso necessitava de um tratamento mais intensivo, encaminhava para o quarto de emergência ou para o CTI. O cardiologista, o neurologista, o pneumologista etc., assumiam o tratamento. O Doutor Jonas também não realizava cirurgias. O Doutor Jonas foi preso. Assinava as receitas, mas não carimbava. Os pacientes, preocupados com a enfermidade própria ou dos parentes, não percebiam a ausência do carimbo com o registro no conselho de medicina. Nenhum dos pacientes do Doutor Jonas tinha o caso agravado pelo falso atendimento. Um deles, no entanto, percebeu, desconfiou e resolveu procurar o conselho regional. A entidade procurou em seu arquivo e não encontrou nenhum médico chamado Jonas Nascimento. Acionou a polícia. Um policial à paisana marcou uma consulta com o Doutor Jonas. Alegou sentir uma dor de cabeça. O Doutor Jonas receitou dipirona sódica. Assinou. Não carimbou. Antes de sair do consultório, o policial pediu para olhar mais de perto um diploma emoldurado que enfeitava a parede. Era um diploma de jornalismo. Perguntou por que a receita não tinha carimbo. O suposto paciente identificou-se como policial civil e deu voz de prisão ao Doutor Jonas por exercício ilegal da medicina. - Eu sabia que alguém ia descobrir o meu segredo. Foi como o Doutor Jonas recebeu a ordem de prisão. Saiu algemado do consultório e do hospital, para o olhar de espanto, surpresa, indignação e revolta de todos os pacientes e colegas de profissão. Foi empurrado para o camburão como um bandido. Na delegacia, o Doutor Jonas contou toda a verdade. Formou-se em jornalismo. Provou, com o seu diploma autêntico, que ficava exposto na parede do consultório, o registro no sindicato, fotos da formatura e comprovação de sua matrícula na faculdade de comunicação social. Não conseguiu estágio. Ficou cinco anos desempregado. Fez pós-graduação, mestrado e doutorado em marketing. Quando foi obrigado a trabalhar, por causa de uma crise financeira familiar, conseguiu uma vaga de recepcionista no Hospital Central Diamond. Era o melhor funcionário da casa. Autodidata, aprendeu os ofícios da medicina. Pesquisou, fez e decorou o juramento de Hipócrates. Foi promovido a clínico, mesmo sem diploma. Só aceitou a promoção porque queria que os médicos sentissem como era ver alguém exercendo a sua profissão e tirando o seu espaço, sem nunca ter se formado em medicina. Nota do Editor: Gustavo Carmo é jornalista e publicitário. Criou o blog Tudo Cultural e do fotoblog Guscar. Publicou o romance "Notícias que Marcam", pela Giz Editorial (SP).
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