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COLUNISTA
Eduardo Souza
02/02/2006 - 14h22
O macaco e o caiçara
 
 

Ocorrência inusitada em nossa cidade: no ano passado, um macaco atacou violentamente G.S., caiçara, septuagenário, residente em um dos bairros ao norte do município. Gostaria de ouvir a respeito dois dos melhores sábios desta aldeia - Julinho Mendes e Carlos Rizzo. Respondam-me: como deverá ser resolvido o caso desse macaco-prego que mordeu a mão direita de G.S., a ponto de inutilizá-la para sempre? Por Tutatis! Por César, ave! E por Souza também! Um macaco-prego! O velho caiçara pretende processar o Estado. Tentará uma indenização em decorrência desse crime praticado pelo elemento silvícola que se evadiu do local do crime. Encontra-se foragido desde então em algum lugar da Mata Atlântica. Primata pertencente à família dos cebídeos que hoje em dia, como qualquer outra espécie selvática, por causa da legislação ambiental, criada pelos nossos impolutos legisladores, foi elevada na hierarquia do ser. Na verdade, o homem é que foi rebaixado. Em breve estaremos valendo menos que um mineral, uma pedra. O personagem, o imputável, o vilão desta história, será levado a júri popular caso seja capturado? O defensor será nomeado pela justiça gratuita para assegurar o contraditório? O crime foi perpetrado - há uma radiografia da mão direita de G.S. e um laudo médico que especifica terem sido as violentas dentadas do macaco-prego a causa dos ferimentos que inutilizaram a mão do infeliz caiçara.

Vamos aos fatos, conforme me contaram. Uma vizinha de G.S. criou em sua dela casa, sem a devida observância ao Estatuto do Menor e do Adolescente Primata, o M.P. - o macaco-prego. De vez em quando, usava de alguma dose de violência para educá-lo. Não, não praticava o crime de aplicar umas palmadinhas na bunda de M.P., trancava-o numa gaiola - sobre o fato de palmadas na bunda de crianças se tornar crime, mesmo que aplicadas pelos pais, vide projeto de lei da magnificente deputada Maria do Rosário - PT/RS, que está no Congresso Nacional nas mãos dos nossos impolutos legisladores. Bem, continuando a narrativa, certo dia, o macaco escapuliu e foi se esconder na casa de G.S. Instalou-se num canto do teto e logo começou a praticar atos de vandalismo e outras contravenções, sem contar a invasão de domicílio. O velho caiçara procurou a polícia ambiental para que tomasse alguma providência. Na verdade, G.S. queria mesmo era partir para as vias de fato com M.P., porém, lembrou-se de seus conterrâneos que, por muito menos, por uma simples árvore cortada para um roçado de mandioca, foram punidos nos termos da legislação ambiental. Macaco escaldado, digo, gato escaldado, tem medo de água quente. Justo com o caiçara, que sempre viveu em harmonia com a natureza! Depois de registrada a queixa, os policiais apareceram na casa de G.S.

Constatada a presença arredia do elemento fugitivo, positivo e operante, retornaram dias depois com uma gaiola de ferro para capturar o vândalo. Pediram então os préstimos da vítima para a captura do meliante. A idéia foi estupenda: amarrar uma corda na porta da gaiola para que G.S. pudesse, a alguma distância, fechá-la assim que o macaco entrasse para pegar a isca. Os guarda foram embora. A gaiola e a cordinha ficaram lá no meio da sala da humilde casa de G.S. O tempo foi passando. Nada do biltre descer. G.S. resolveu então mudá-la de lugar. Foi aí que a coisa fedeu! No que se abaixou para pegar a gaiola, M.P. desceu de onde estava e atracou-se com o velho. Mordeu-o primeiramente na coxa, depois na mão direita, quando G.S. tentava se desvencilhar do infame. Praticada a ação, M.P. evadiu-se do local do crime, deixando a vítima toda ensangüentada.

A pergunta que não quer calar: se o homem morder um macaco, inutilizando-lhe qualquer órgão, é crime inafiançável; mas se o inverso se der como é que fica? Hein, Rizzo? Como é que fica, Julinho? O que diriam a respeito os pupilos idiotizados da mamãe Gaia? Pimenta nos olhos dos outros é refreshment. E a reciprocidade jurídica que consiste em que ao direito de um corresponde uma obrigação para outro? Se existe o dever moral de abster-se de crueldade com os animais, estes não têm o direito de exigir o cumprimento desse dever porque é meramente um dever moral, sem fundamento jurídico, necessariamente intersubjetivo, ou não?

Até hoje o Estado não promoveu, em relação aos caiçaras, nenhuma ação compensatória por ter restringido absurdamente o exercício do direito natural e constitucional à propriedade e por ter cerceado tão radicalmente a existência dos meus conterrâneos que sempre viveram da agricultura de subsistência, da caça e da pesca, sem que acarretassem danos aos ecossistemas (argh! Odeio esta palavra!). Está na hora de se fazer alguma coisa. Poderiam começar indenizando G.S., que ficou impossibilitado de trabalhar porque perdeu o movimento dos dedos da mão direita. Se já existe gente aposentada por ter perdido o inútil dedo mindinho, porque não compensar o velho caiçara, brutalmente ferido por um macaco de bosta? Hein, Julinho? O que me diz, Rizzo?


Nota do Editor: Eduardo Antonio de Souza Netto [1952 - 2012], caiçara, prosador (nas horas vácuas) de Ubatuba, para Ubatuba et orbi.
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