Bem, o inverno chegou. Tempo de recolhimento, edredons, reflexões e muita conversa de botequim. Assunto é que não vai faltar: a corrupção no governo e no PT, o partido cujos militantes e dirigentes até ontem brandiam a espada da moralidade como aqueles que atiraram pedras na mulher adúltera. Os homens que detinham as prerrogativas da ética, que se colocavam acima do bem e do mal. Nelson Rodrigues dizia que "Não há ninguém mais bobo do que um esquerdista sincero. Ele não sabe nada. Apenas aceita o que meia dúzia de imbecis lhe dá para dizer". Brigam as comadres, aparecem as verdades. Querem fazer um cordão de isolamento sanitário em torno do presidente. Queda de ministro, reforma ministerial, reforma tributária, demissão de funcionários comissionados, um pacote anticorrupção, como se já não bastasse o cipoal de leis que tratam do assunto: medidas para mostrar ao povão que o presidente não está dormindo no ponto. No entanto, porque tentaram de todo jeito evitar a CPI do Waldomiro e esta do Mensalão? Por que criar uma nova lei para punir funcionário público por corrupção se já existe a nº 8.429/92? Uma no cravo, duas na ferradura. Fala-se também em reforma política. Mas quem serão os autores? As raposas que estão tomando conta do galinheiro? É preciso mudanças já para que tudo continue sendo como sempre foi. No fundo de tudo isso, há séculos, está uma coisa chamada patrimonialismo, defendido tanto por nacionalistas xenófobos, quanto pela esquerda, que adora estatização e coletivização. No poder, integrando a nomenclatura, todos querem é se locupletar. Paulo Mercadante escreve em A Coerência das Incertezas: "Nacionalismo, ufanismo, xenofobia, patrimonialismo, burocratismo, cartorialismo, corporativismo, mantidos pela dinâmica dos impostos, confiscos, perdimento, descaminho, devassas, arrestos, seqüestros, prisão por dívidas, indisponibilidade de bens, tributos, contribuições e empréstimos compulsórios, taxas, pedágios, multas, laudêmios, foros, custas, emolumentos: eis algumas das denominações, de natureza medieval, próprias ao fenômeno envolvendo a economia, a sociologia, a jurisprudência e a política. Com o monte proveniente das receitas obtidas dos cidadãos, a nobreza e sua sucessora histórica, a nomenclatura, realizavam e realizam seus meios e fins tanto práticos quanto teóricos". Se você quer conhecer melhor o Brasil e se conhecer melhor, leia este livro. Os corruptos que ocupavam a mídia até ontem parecem peixes pequenos diante dos robalões organizados que ocupam o atual cenário putrefato da nossa lastimável república. Ouvi um dirigente petista dizer que os acontecimentos não caracterizam "um mar de lama". De fato, a coisa tem dimensões oceânicas. E como fede! Interessante, a propósito desse furdunço, os artigos "Foro de São Paulo e Diálogo Interamericano" e "O Diálogo Interamericano e as Forças Armadas dos Países Periféricos: pacto firmado em 1993" no site Mídia Sem Máscara. Fiquei pasmo. Será por isso que o PSDB deu uma murchada? Na verdade, não podemos matar a vaca a pretexto de exterminar os carrapatos. É a tal da governabilidade. Paulo Francis é quem dizia que a realidade é mais forte do que convicções ideológicas. Ó mulher! Dê-me o edredon, que o inverno promete!
Nota do Editor: Eduardo Antonio de Souza Netto [1952 - 2012], caiçara, prosador (nas horas vácuas) de Ubatuba, para Ubatuba et orbi.
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