Julinho Mendes | |
Domingo passado foi a vez da revisitação à praia Brava do Camburi. Atrasei em meia hora devido a conversa telefônica com o editor-chefe Luiz Moura, que disse ter conhecido aquela praia no início da década de setenta. Uma aventura pr’aquelas datas! Chegamos no “estacionamento” à beira da rodovia, no Km 4 aproximadamente, por volta das 11 horas; ali deixamos o carro e iniciamos nossa caminhada até a praia. Fazendo uma pausa nessa narração, vou dizer uma coisa: - P-q-p! Depois que Dudu aumentou e inflacionou a taxa de estacionamento da Zona Azul, em qualquer lugar, seja área pública (faixa do DER, DNIT, marinha...) ou particular, a turma tá cobrando R$ 10 por carro. Antes se pagava R$ 2, R$ 3, até aí tudo bem, mas agora, o exemplo equivocado e injusto de nosso prefeito e de nossos vereadores que autorizaram, ou que não questionaram contra a cobrança da Zona, paga-se R$ 10. Como diria Casoy: - Isso é uma vergonha! E eu digo: Isso é uma “sem vergonha”! Já não basta o que pagamos de impostos! Mas continuando... Logo na descida da trilha de acesso à praia Brava do Camburi, tem-se uma vista panorâmica que eu diria “surreal”; a gente que já está acostumado em ver tanta paisagem bonita de nossa terra, fica de boca aberta. Vou dizer que a trilha pra chegar até a praia não é fácil; do início até a metade, é, como diz o pessoal da roça: um “quebra-cú” desgraçado. É íngreme e escorregadia, cheia de pedras e raízes, e como dica de mateiro que sou, digo que se deve ter atenção e olhar aonde se vai pisar, porque nesse tipo de trilha pode ser que uma hora ou outra tenha uma jararaca de boca aberta esperando um tornozelinho desprovido, mas não é para se assustar com isso, é só precaução, mas caso queiram se garantir mais ainda é bom esfregar um dente de alho na canela e fazer o sinal da cruz para espantar as peçonhentas. Araçás e goiabas, enjoa-se de comer de tanto que têm nessa época; passarinhos e borboletas com seus cantos e cores dói os ouvidos e cansa os olhos de ver e ouvir. É ruim, hein! É praia brava mesmo, é praia pra surfista, mas tem o cantinho sul com um “corguinho desaguante” que é uma beleza, pode deixar criança à vontade e sem preocupação. Do meu kit praia, tirei minha linhada, peguei uma tatuíra na areia de volta-onda e joguei pra ver se pescava um parati barbudo, um pampinho ou um carabebe que fosse, mas nada! Ao contrário de trinta anos atrás, quando estive lá pescando com meu pai, hoje não tem nem pra remédio. É verdade que peixe anda com as marés e com as correntes, mas que tá diminuindo, não resta dúvida. Dessa praia lembro-me que uma vez, no frio do mês de junho, fomos passar picaré para pescar tainhas; não nos decepcionamos, mas foi um sacrifício subir aquele caminho à noite com peixe, rede, calão e lanterna nas mãos. Um causo que ficou marcado contou-me certa vez o irmão do Toninho Guimarães, o saudoso “Coelho”, assim carinhosamente chamado; eu nunca soube o nome correto dele, mas dizia ele o seguinte: “- Ah, Julinho, fomos passar picaré na Brava do Camburi. Foi o Antônio Gomes que nos levou lá dizendo que a praia era muito boa de tainha. Descemos aquele morro à noite, só com uma lanterna. Rapaz, chegamos lá, abrimos a rede e nem bem caiu na água começou bater tainha. O Antônio Gomes, muito afobado, assobiou para fechar; veio 18 tainhas, tudo tara, daquela ovada. Por azar o Laureano pisou num bagre e o ferrão atravessou e regaçou com o pé. O cara gemia de dor que nem cachorro quando leva estilingada na canela. Tivemos que vir embora. Tinha uma tainhada na praia que dava até pra sentir o cheiro delas. Viemos embora com dó, não do Laureano, mas de deixar a tainhada que tava no ’lagamá’. Era cedo ainda, mais ou menos umas 9 horas da noite, mas pra subir aquele morro com dezoito tainhas, com uma lanterninha, picaré, calão e o Laureano gemendo de dor, foi um sacrifício danado. Chegamos lá no alto da estrada onde estava o carro por volta da meia noite e mais uma hora estávamos na Santa Casa, tirando o ferrão do bagre do pé do Laureano. Depois disso, fomos levar o Laureano em sua casa e lá o Antônio dividiu os peixes em quinhões. Aí é que a história passa por uma questão, no mínimo, curiosa. O Antônio abriu o saco de peixe e começou a divisão com seis quinhões, de três peixes cada, e disse pra cada um de nós escolhermos uma parte. O Laureano, que até então tava gemendo, vendo aquela injusta divisão, falou: - Ôôô Antónho, que quinhão de seis é esse se nós somos em três? O Antônio, sem o menor constrangimento, respondeu: - Somos em seis, sim: você, o Coelho, eu, o meu carro, a minha gasolina e o meu picaré. Pegue a sua parte que tá bom demais; você, além de nos dar trabalho, ainda fez a gente perder a tainhada que tava naquela praia; hoje nós matava umas duzentas tainha! Eu sempre pesquei com o Antônio e já sabia dessa divisão que ele fazia, mas quem ia pela primeira vez ficava puto da vida. O Laureano dizia que nunca mais ia pescar com a gente; mas que nada, virou nosso companheiro de picaré! Mas tava certo, o Antônio Gomes dava o carro, gastava com gasolina, a rede era dele, levava bolacha, chocolate quente e café pra gente comer e nós ainda enchia o carro dele de areia e água salgada; a Brasília vivia na funilaria tirando ferrugem.” Causo caiçara! Assim me contou o Coelho que, hoje, tanto ele como o Antônio Gomes arrastam picaré lá no “lagamá” celeste. Só não sabemos como é feita a divisão da pescaria lá em cima.
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