Julinho Mendes | |
Juvenal era um homem de mais de meia idade, na verdade a linha de seu gráfico de vida já estava descendo o “cabo da boa esperança”. Tinha um biótipo forte e esbelto, porém gostava de fumar um cigarrinho e apreciava água que passarinho não bebe. Depois da aposentadoria, o sedentarismo tomou conta um pouco mais de seu corpo; não era homem que reclamava de dores, não sentia pressão alta, apenas tinha muita prisão de ventre, mas para esse problema nada que meio quilo de batata doce ou mesmo um punhado de saquaritás não resolvesse, porém após essas refeições precisava se isolar do mundo porque ninguém agüentava a catinga de seus peidos. A coisa era medonha. Um dia, Juvenal sentiu-se mal, era uma quinta-feira pré-carnaval; teve tonturas pela manhã, não sentiu fome no almoço, sentia seus músculos, em certa hora flácidos e em outras, rígidos que nem um pau. Na sexta-feira, por volta das dezesseis horas, aquela sensação de rigidez muscular atacou-o por completo, atingiu até o músculo do coração. Branco feito neve, Juvenal caiu duro... Marcaram o enterro sábado de carnaval. Vestido com seu terno preto (ainda o terno do casamento), Juvenal passou a noite de sexta e o dia de sábado deitado em seu caixão, sendo velado pela família, parentes e amigos, esperando a hora do enterro. Uma coisa era notório no defunto Juvenal: sua barriga estava muito grande; achavam que não daria para fechar o caixão, mas o velório acontecia. De um lado a família chorava e fora do recinto fúnebre, amigos e conhecidos de Juvenal lembravam os momentos de alegrias vividos e a conversa que mais prevalecia era sobre o seu “malfeitoso” peido. Naquela rodinha de hilários causos vividos e acontecidos com Juvenal, Tião Roleta, compadre e parceiro de caçada, contou uma do Juvenal que não teve um que não riu dentro do velório. Dizia Tião que numa caçada com seu compadre, em certo lugar, encontraram rente a raiz de uma árvore, um ninho (buraco) de tatu; fizeram uma “vanca” de madeira e começaram a cavar o buraco do bicho; depois de um metro de profundidade o buraco desviou por dentro das raízes da árvore e não teve jeito de continuar a escavação. Juvenal, empanturrado, já fazia uns três dias e na vontade de comer um tatu no feijão começou a massagear e dar pancadas na barriga; não deu outra, a coisa veio com tudo, sentou-se na beira do buraco e soltou o torpedo. Bummmmm! Melhor dizendo: Pummmmm! Não deu dez segundos o tatu pulou pra fora do buraco já estrebuchando; não precisou gastar cartucho para matar o bicho, colocaram o bicho dentro do “emborná” e vieram embora. Meses depois repararam que até a árvore rente ao buraco também morreu. No momento em que Tião encerra a história do tatu, a turma que velava o defunto no recinto fúnebre começou a sair correndo, abanando o rosto com as mãos e uns apertando o nariz. Foi um Deus nos acuda! Uns diziam que o defunto Juvenal já estava podre e que precisavam enterrá-lo o mais rápido possível. Depois de duas horas de abandono ao defunto, o pessoal começou a voltar ao recinto e notaram que a barriga do falecido Juvenal tinha se esvaziado. Ficou uma pergunta no ar: Juvenal estava podre, ou peidava mesmo depois de morto? Teve início a marcha fúnebre e no caminho para o cemitério um fato inusitado aconteceu: o funeral encontrou com uma folia. Era, na verdade, um improvisado bloco de carnaval que vinha com tudo; metade de seus integrantes estavam bêbados a outra metade “trêbados”; metade batucava samba, metade batucava axé baiano. Cruzaram com o cortejo do defunto Juvenal, aí foi um “balaio de gatos”. Juntou tristeza com batuque de surdão. Largaram o caixão no chão e ía começar uma discussão e uma provável briga quando, de repente, por força interna, a tampa do caixão se abre e o que era defunto se levanta. Juvenal estava vivo! Cuspindo o algodão que estava enfiado na boca e espanando pétalas de flores que estavam em seu paletó, Juvenal pediu explicações para o que estava acontecendo. Um doutor neurologista que batia surdo na bateria do bloco, finalizou a explicação ao Juvenal: - CATALEPSIA, foi o que aconteceu! Que palavra era aquela e que coisa era aquilo, ninguém sabia, mas já não interessava mais e a sorte do Juvenal foi encontrar com a folia e foi o batuque do surdão que fez reativar e pulsar seu coração. O coração do ex-defunto Juvenal, batia outra vez. Viva! Todo mundo dava vivas de alegria. Feliz da vida e com poderes de rei Momo, Juvenal assumiu o apito da bateria, tomou uma talagada de caipirinha e ordenou que todos acompanhassem, pulando no bloco “Pé de cana”. A ex-viúva, filhos, parentes e amigos, concordaram em seguir o bloco, desde que Juvenal não soltasse nenhum de seus fétidos torpedos. Pois é, minha gente, tomem cuidado com a catalepsia! E é com essa história que iremos representar a música “Catalepsia”, hoje, dia 17, no VII Festival de Marchinhas Carnavalesca de Ubatuba, no coreto da Praça da Igreja Matriz, Centro, a partir das 20h30. Compareçam! Catalepsia: “Estado em que se observa uma rigidez cérea dos músculos, de modo que o paciente permanece na posição em que é colocado (parecendo morto). Observa-se a catalepsia principalmente em casos de demência precoce e de sono hipnótico”.
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