Ia escrever sobre os fatos que marcaram 2011; mas esse foi, com raríssimas exceções, um ano tão chato que desisti. Escrevo, então, sobre um evento que se realizará brevemente: dentro de alguns dias serei oficialmente velho. Entrarei para a terceira idade, ou melhor idade, como querem os que ganham a vida edulcorando a velhice, de olho nos aposentados, nesse filão, nesse rentável segmento do mercado. O foco é o corpo, os sentidos, a qualidade de vida. Quanto ao espírito... Na mídia, nada de imagens de doença, de decadência física e da dependência como destino inevitável dos que envelhecem. O negócio é impor estilos de vida, criar uma série de regras de comportamento e de consumo de determinados bens e serviços para que o sujeito não se sinta velho. Aproveitar a vida, cuidando do corpo, freqüentando academias de ginástica, praticando esportes, divertindo-se em excursões, bailes, concursos de beleza etc. Tudo para o prazer da galera geriátrica. Quanto às questões do espírito... Nada de preocupação com a prestação de contas final que não tardará nem falhará... Quer saber? De minha parte acho a velhice um pé no saco. É deixar de fazer e de comer uma porção de coisas que antes fazíamos e comíamos e que nos dava um baita prazer... Há, todavia, alguns aspectos que me interessam, alguns privilégios na tal da terceira idade: preferência no atendimento em bancos, em órgãos públicos, nas filas de casas lotéricas, supermercados, hospitais etc. Já baixei o Manual do Idoso disponibilizado na internet e irei lê-lo avidamente. Nesse negócio de envelhecer, aprendi uma coisa: o pior inimigo do homem é a soberba, que o faz colocar-se no centro do universo, e que o melhor antídoto para isso é a humildade e a caridade. Recentemente assisti a um filme - Late Bloomers -, com a Isabella Rosselline e o William Hurt, que me fez refletir sobre o comportamento, sobre a aparência do idoso. Como vivemos numa era de igualitarismo, de padronização, do politicamente correto, ou seja, de uma era que nos quer bovinos, comportados, como devemos agir? Acho que, diante desse infortúnio que é a velhice, cabe resignar-se e rir, rir muito dela. Não querer ser jovem ou velho, mas você mesmo, com todos os seus reumatismos, com todas as suas limitações físicas, cultivar as coisas do espírito, o otium cum dignitate e rir. Não se esquecendo de mandar à PQP quem se achar no direito de nos cagar regras disso ou daquilo. Chatos e pentelhos há em todas as faixas etárias. Conviver com crianças e jovens faz bem, desde que respeitem nossa individualidade, e que, na relação, prevaleça sempre a cordialidade. Esqueçamos, pois, essas promessas da eterna juventude que só serve ao mercado de consumo. Feliz 2012 a todos os da primeira, da segunda e da terceira idade!
Nota do Editor: Eduardo Antonio de Souza Netto [1952 - 2012], caiçara, prosador (nas horas vácuas) de Ubatuba, para Ubatuba et orbi.
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