| Julinho Mendes | | | | Uma ova e tanto! |
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Não troco por farofa de içá! Cada um com sua cultura, com seus costumes, com suas tradições. Se nós caiçaras apreciamos uma ova, uma ostra, marisco, guaiá... os caipiras, dentre outras especiarias, apreciam uma farofada de içá. Na redondeza entre as ruas Maranhão e Cunhambebe, ruas D. João III e Liberdade, era uma região arenosa no centro de Ubatuba, de muito sapê e capim melado (lugar de formiga). Tinha um pessoal de Lorena que tinha uma casa nessa região; era a família de seu João que tinha dois garotos de nossa idade que se misturavam em nossas brincadeiras. Lembro-me de uma época como essa, talvez até foi um feriado prolongado de 12 de outubro ou de 15 de novembro, que durante a noite roncou uma forte trovoada e pela manhã o céu escureceu de formigas voadoras; eram as içás (fêmeas das formigas saúvas) que saíram de suas tocas para se acasalar e formar um novo formigueiro. Das caçadas de rãs, preás, marrequinhas, nessa época tínhamos mais esse atrativo: caçar içá. Mas nós apenas brincávamos com as formigas; numa crueldade sem consciência, espetávamos uma fita da folha do sapê na bunda da formiga e soltávamos só pra ver seu vôo maluco e rodopiante. Ouvíamos, sim, falar da farofa feito com a bunda da formiga içá, e foi justamente com os garotos de Lorena que pela primeira vez experimentamos da tal culinária; depois de capturarmos mais de quilo de formiga, seu João preparou aquela farofa de bunda de içá. Pra quem comia farofa de rã, farofa de marrequinha, farofa de preá... farofa de bunda de içá não seria diferente. E comemos a iguaria acompanhado de Ki-Suco de uva. Não sei como foi feito e não me lembro do gosto, sei apenas que comemos tudo. Escrevo esta memória em função de encontrar no caderno agrícola do jornal O Estado de São Paulo a matéria sobre o assunto. Segundo o que diz o produtor rural Ocílio José Ferraz ao jornal, a içá tem outras qualidades, é antibiótico natural e afrodisíaco. Sabendo do fabuloso afrodisíaco que contem o caldinho amarelo da bunda da içá: Toninho Guimarães, Marino Fonseca e o Eduardo Souza já estão equipados com os mais diversos apetrechos de caça, esperando o próximo esvoaçar nupcial das formigas saúvas para capturarem as içás. Pelo visto, os nobres amigos irão comer as içás “in loco” e “in natura”. Amigos, se sobrar alguma, me tragam para que eu faça uma farofa, seguindo a receita de Ocílio Ferraz. Ingredientes: 1 litro de içás limpas (ou seja, só o abdômen, sem o ferrão, asas e pernas); 200 gramas de banha de porco, sal com alho e farinha de mandioca crua. Como fazer: Colocam-se as içás numa panela, em fogo baixo, até que comecem a torrar. Quando começar a sair um cheiro característico, acrescenta-se a banha de porco. Quando chegar no ponto ideal de fritura, retira-se a mistura do fogo, acrescentando sal com alho e farinha de mandioca crua. A farofa está pronta para ser consumida.
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