Julinho Mendes | |
Com a filha de João, Dito Bento ia se casar... Nessa história Pedro não fugiu com a noiva na hora de ir pro altar porque o amor de Maria por Dito fazia com que ela não olhasse para Pedro nenhum e a mesma coisa acontecia com Dito, o amor dele por Maria era tamanho que Dito não tinha olhos para mulher nenhuma; era um amor imenso... O casório estava marcado para o dia 29 de junho, Dia de São Pedro Pescador. Como não poderia deixar de ser, a festa seria tipicamente caiçara, a beira do mar, com direito a ova e tainha, mandioca, batata doce, milho verde... tudo isso assado na brasa da própria fogueira que se ergueria no meio do terreiro; sem contar, o pau de sebo, quadrilha, fogos, vinho quente e, logicamente, o fabuloso quentão feito com a saudosa pinga Ubatubana. O cavalo que foi preso no curral do Conselho pelo fiscal da Prefeitura, se transformou em bicicleta; da bicicleta que expôs a ova para fora, se transformou em sanfona; da sanfona que perdeu três baixos, ficou parecendo berro sapo boi e se transformou em pato ensopado com batata, pato esse que foi oferecido em banquete pelo vovô Lindolfo ao legítimo dono do cavalo, que foi ganho numa rifa pelo professor Ernesto de Oliveira Filho, conhecido por professor Maninho, irmão do nosso já saudoso Washington de Oliveira, Seu Filhinho. No saborear do pato com batata, Maninho perguntou a vovô Lindolfo o paradeiro de seu cavalo e vovô, sem cerimônia, respondeu: - O cavalo é esse que você está comendo! Maninho deu um pulo da mesa e pediu explicações a Lindolfo. Vovô então explicou: - O cavalo foi preso, troquei com uma bicicleta; a bicicleta pôs a ova para fora, troquei com uma sanfona; a sanfona perdeu três baixos, troquei com o pato; o pato que você chupou até o pescoço, era o seu cavalo. - Explicou isso ao Maninho e foi uma gargalhada só. Esse fato é mais um dos pitorescos fatos ocorrido ou aprontado por vovô Lindolfo (O preeeega fogo), que muito mamãe me contava e que foi relatado por Seu Filhinho no livro “UBATUBA Lendas & outras histórias”. Relatei esse pitoresco fato porque quem animou a festa de casamento de Dito Bento com Maria foi justamente a tal sanfona, tocada por vovô Lindolfo, juntamente com seus amigos: Leopoldo Louzada, Zé Fragoso, Zico Rosa, Quinito, Eduardinho, Livio Brás (sogro do João Barreto) e outros; foi nessa festa que a sanfona perdeu os três baixos e que depois disso ficou parecendo sapo-boi berrando em noite de tempo chuvoso; por essa razão a sanfona foi trocada um o pato do Alfredo sapateiro. A cidade, compreendia-se entre a rua do Comércio (rua Maria Alves), e alguns vilarejos praianos espalhados, tanto para o norte como para o sul; todo mundo se conhecia, todo mundo era amigo... Quando acontecia alguma festa, tinha que ser para a cidade inteira. Tainha não ia faltar porque era mês de junho, e a abundância desse peixe era grande. Vinha tainha do Ubatumirim, Puruba, Prumirim, Perequê-Açú, Itaguá, Enseada... umas secas, outras, cortadas em postas, lanhadas, farofadas... Dito Bento queria oferecer aos pais da noiva um peixe que não fosse tainha, um peixe de primeira, um prato elegante: O Azul Marinho... Uma semana antes do casório, encomendou para seus amigos pescadores: Alfredo Vieira, Fifo, Zé Capão, Guerra e Silvio Prado; o peixe cavala-verde, um peixe realmente saboroso e que dava um prato elegante e saboroso. A época da cavala era mês de fevereiro, tempo quente, não no mês de junho, tempo frio... Mesmo assim, os quatros pescadores, aceitaram a encomenda... Em dias alternados, saíam os pescadores a procura de cavala... Na segunda-feira, Alfredo Vieira preparou suas linhas de mão e anzóis novos e foi pro lado da Ponta Grossa do Farol... Foi, não demorou uma hora, voltou sem peixe e sem nenhum anzol, pois tinha lá um baiacu que lhe comeu todos os anzóis, pois as linhas estavam sem alça de arame. Relatou isso aos amigos que lhes tiraram sarro... Terça-feira saíram juntos Fifo e Zé Capão, pro mesmo pesqueiro, numa canoa só; esses, mais precavidos, levaram linhas com alça de arame e muitos anzóis... Trinta anzóis do Fifo e quarenta e cinco do Zé Capão, tiveram o mesmo destino; o baiacu levou tudo. Com mais de quarenta anos de pesca cada, nunca tinha acontecido aquilo; acontecia sim, muito esporadicamente um baiacu cortar a linha e ir embora, mas geralmente o bicho se ferrava e virava filé, frito com farinha de mandioca. - Estão vendo só? Vocês tiraram sarro de mim, agora foram vocês que perderam os anzóis! - Vingou-se Alfredo Vieira. Quarta-feira, agora mais preparados, saíram Fifo e Zé Capão numa canoa e Alfredo Vieira com o Guerra em outra. Nas linhas, agora, colocaram alça com arame de aço mais grosso e com três braças de comprimento. Não ia falhar? Dessa vez o BAIACUZÃO estava ferrado... Ferrado nada! Do mesmo jeito que foram, voltaram; sem cavala, sem baiacu, e o pior, sem anzóis. Perderam juntos setenta e cinco anzóis; um prejuízo que não tinha tamanho, pois até anzol importado o bicho carregou. Silvio Prado tinha um compromisso em entregar um concerto de rede até quinta-feira e por essa razão ainda não tinha ido atrás das cavalas, mas estava a par dos fatos e dos prejuízos dos companheiros, fato muito estranho que não abalou e muito menos amedrontou o tranqüilo pescador. Silvio Prado ainda brincava e tirava sarro dos companheiros: - Esse baiacu anda com alicate debaixo dos braços! Esse baiacu, do jeito que cortou arame de vocês, deve estar com os dentes todos cariados! Esse baiacu antes de cortar os anzóis de vocês, afia os dentes no esmeril!... E assim por diante a gozação foi a semana inteira... - Olha companheiros, amanhã já é sexta-feira, véspera do casamento do Dito Bento. Vocês não sabem pescar! Deixa comigo que irei trazer não só a cavala como também trarei o baiacu que pelo jeito tá com a barriga que é só arame de aço e anzol! Vocês verão, irei trazer as cavalas e desse baiacu que já comeu mais de duzentos anzóis de vocês, irei fazer um balão para soltar na festa de São Pedro, no casamento do Dito com Maria!!! A bicicleta que pôs a ova pra fora (câmara de ar, que naquele tempo era alaranjada), que vovô Lindolfo trocou com um cavalo, era do pescador Silvio Prado; nas rodas dessa bicicleta faltavam vinte e quatro raios, raios esses que quando Silvio Prado precisava de anzóis era de lá que ele retirava, fabricando assim excelentes anzóis. Foi com um desses anzóis que Silvio Prado pescou uma cavala de trinta e dois quilos, para o casório de Dito Bento. E o baiacu que comeu cem metros de arame e duzentos anzóis dos desprovidos pescadores que fim levou??? O baiacu, conforme prometido por Silvio Prado, subiu ao céu, feito balão! Sim, feito balão! Para quem não sabe, o baiacu tem dois dentões na frente parecendo o Fenômeno Ronaldinho. Para se defender dos predadores ele enche sua espinhosa barriga de ar que realmente parece um balão não dando para seus predadores engoli-lo. Esse baiacu, em especial, que comeu cem metros de arame de aço e duzentos anzóis, pesava cinqüenta e oito quilos e tinha dois metros e vinte centímetros de comprimento. Silvio Prado pegou o baiacu, que tanto comeu os anzóis dos companheiros, e levou para a borracharia do saudoso PELEGO, e com o compressor de ar, fez do bicho um enorme BALÃO; meteu-lhe uma tocha de arame umedecida com breu e na noite da grande festa, soltou o baiacu pro céu, feito balão, muito bonito por sinal, porque o baiacu tem uma coloração parecida com a bandeira brasileira, ou seja: do lombo para a barriga forma um degradê com tons: azul, verde, amarelo e branco. É realmente um peixe brasileiro. Foi a alegria da criançada na noite de São Pedro. A sorte foi que esse balão baiacu caiu no mar, se tivesse caído na mata teria causado grande incêndio na Mata Atlântica. “Cuidado, crianças, não soltem balões, porque esse artefato põe em risco não só a Mata Atlântica como também a cidade, as favelas, os postos de combustíveis...” Pois é! Estão curiosos e querem saber como foi que o grande pescador Silvio Prado pescou o temido baiacu? Irei revelar. Foi fácil! Com tanto arame de aço e tanto anzol dentro da barriga do baiacu, Silvio Prado amarrou um IMÃ numa de suas linhas e jogou no mar; na hora que o baiacu passou perto, o bicho foi puxado pelo imã e assim veio puxado pela barriga, desde a Ponta Grossa do Farol até a praia do Itaguá.
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