Na manhã desta terça-feira capturamos, o Osvaldinho, eu e a Marlene, uma cobra coral adulta, já subindo na soleira da porta de casa, aqui no pé do morro do Funhanhado. O Instituto Butantan não costuma identificar cobras corais por fotografia, porque há grande diversidade desses ofídios e é preciso examinar dorso e ventre, em toda a extensão do animal, o que nem sempre é possível através de fotos. No entanto, foi possível negociar, por telefone, com o pesquisador Amauri Ferraz, daquele instituto, pelo menos uma tentativa de identificação do bichinho. Adiantou que, por sua experiência, cerca de 80% das corais encontradas na região de Mata Atlântica são verdadeiras. Marlene fez as fotos, encaminhei-as por e-mail e, minutos depois, o pesquisador informou que se tratava de uma coral verdadeira, Micrurus corallinus. O pesquisador mostrou interesse em obter o animal, que, no entanto, precisa ser entregue no Laboratório de Herpetologia, no bairro Butantã, na Capital. Sugeriu contato com o órgão municipal de controle de zoonoses, para viabilização do transporte. Não é comigo. Este parece ser o procedimento padrão do Controle de Zoonoses de Ubatuba quanto a cobras peçonhentas. No primeiro contato, o funcionário que atendeu o telefone disse que o órgão só cuida de cães e gatos. Depois de horas de tentativas, foi possível contato com a dra. Márcia, que informou não haver nenhum protocolo para recebimento e remessa de cobras. Afirmou que casos assim são da alçada da Polícia Ambiental. Questionada sobre a atuação do órgão quanto a animais peçonhentos - escorpiões, cobras, aranhas, taturanas - disse que, se houver um número elevado de casos, o Centro de Zoonoses toma providências. E disparou: "Você quer morar na Mata Atlântica e não ter contato com esses animais"? Objetei que moro em área urbanizada e que, dependendo do critério, então toda Ubatuba deveria ser evacuada. Tentei contato com o o superintendente de Proteção à Saúde, o biólogo Neílton Nogueira de Lima, mas ele estava em reunião. Deixei recado com a telefonista, pedindo retorno, que não houve. Não é comigo. Este também parece ser o procedimento da Polícia Ambiental de Ubatuba, quanto a cobras peçonhentas. Segundo o policial que fez o atendimento, o máximo que pode ser feito é a remoção do animal para seu habitat natural. Disse que, no passado, já foram levadas cobras para o Instituto Butantan, mas que, por orientação de algum biólogo e devido aos custos de deslocamento de viaturas, isso deixou de ser feito. Agradeci, mencionando que então o problema era meu, e desliguei o telefone, sem que o policial tivesse efetivamente oferecido ajuda para dar destino ao animal. Ninguém disse, mas fica no ar algo assim: o mais fácil é sacrificar o animal. O Instituto Butantan tem algo a dizer sobre isso: "Uma serpente, como qualquer outro animal, faz parte do ambiente e contribui para o equilíbrio ecológico. Assim, é altamente recomendável que o animal não seja retirado de seu hábitat natural, para se evitar desequilíbrios no meio ambiente. Uma serpente só deverá ser trazida ao Instituto Butantan caso haja risco de acidente para as pessoas que habitam ou transitam no local. É preferível que as serpentes sejam trazidas vivas (pois algumas espécies são muito importantes para obtenção de veneno e produção de soro anti-ofídico). Porém, o Instituto Butantan também aceita a doação de espécimes mortos (neste caso recomenda-se que o animal seja colocado em um recipiente com álcool, no qual se introduz um pedaço de papel com local e data de coleta anotados à lápis)." Bem, é provável que alguma pobre lagartixa doméstica vá servir de refeição à pequena coral, enquanto tentamos resolver o problema do transporte, ou sua soltura em local da Mata que seja bem distante de áreas habitadas. Atualização (20/01/2011) Na manhã desta quarta-feira, ao tentar novo contato com o superintendente Neílton - que não estava - o telefonema acabou sendo encaminhado ao biólogo Benedito Carlos, conhecido na unidade como Chandeco. E Chandeco foi a solução. Resgatou, de algum velho depósito do Centro de Zoonoses, uma velha caixa de madeira, própria para o transporte de cobras para o Instituto Butantan. Cuidadosamente, despejou a cobrinha da caixa provisória para a apropriada, e fechou a tampa com parafusos. Na desorganização que é o exíguo espaço para tantos veículos oficiais na Superintendência de Atenção à Saúde, um motorista desatento, ao estacionar em frente à porta principal da unidade, atropelou a caixa, que, felizmente, não sofreu danos. Agora resta aguardar que a remessa ao Instituto Butantan ocorra sem novos sobressaltos. O laudo do Instituto será encaminhado a Ubatuba e espero que uma cópia chegue às minhas mãos. Chandeco era a solução. Ali mesmo na Superintendência, onde nos primeiros contatos ninguém sabia a quem encaminhar a demanda. O superintendente Neílton ainda não retornou o pedido de contato, imerso em reuniões e mais reuniões, algumas com foco no combate à dengue, trabalho que vem sendo desenvolvido com seriedade em Ubatuba. Mas a Superintendência tem uma vida burocrática, administrativa, que não pode ser samba de uma nota só.
Nota do Editor: Elcio Machado (cidadania.e@gmail.com), 60, batizado como Elciobebe, sob as bênçãos e maldições de Cunhambebe, caiçara em construção. Mantém o blog Exercícios de Cidadania (cidadania-e.blogspot.com). Permitida a reprodução, desde que citados a fonte e o endereço eletrônico original.
|