O inquérito que apura o assassinato do blogueiro e jornalista Marcos Guerra ainda não aponta possíveis autores e está em fase de distribuição a uma das três varas judiciais de Ubatuba. Já se passa mais de um mês desde o assassinato de Guerra, que foi morto a tiros em sua casa, na antevéspera do Natal. Com isso, ocorreu o final do prazo para o relatório conclusivo ou pedido de dilação de prazo. O sistema informatizado do Cartório Distribuidor não indicava, na quarta-feira passada, a distribuição do inquérito para uma das três varas criminais de Ubatuba, não estando definido, portanto, o juiz que acompanhará o caso. Quanto ao Ministério Público, pela distribuição de tarefas que tem em Ubatuba, e em vista de não haver indícios de latrocínio, o inquérito e eventual ação penal estarão sob responsabilidade da 2ª Promotoria de Justiça de Ubatuba, que cuida dos crimes dolosos contra a vida afetos ao Tribunal do Juri. A titular do órgão é a promotora Raquel Tiemi Hashimoto. O delegado de polícia titular de Ubatuba, Fausto Macedo, informou que as investigações continuam, que há linhas firmes de investigação mas que, “para não dar um tiro no meu próprio pé”, não pode dar informações mais detalhadas. Manifestou confiança de que o crime será desvendado e assegurou que as investigações continuam sob responsabilidade da equipe de Homicídios da Delegacia, composta por três investigadores. Sobre mandados de busca e apreensão, aventados dias atrás, quando o delegado mencionou um “quebra-cabeças”, disse que não foram solicitados, porque “ainda falta um elo”. A delegada titular da Seccional de Polícia de São Sebastião, Nilze Baptista Scaputiello, através de assessor, disse que, para que pudesse se manifestar sobre o inquérito, dependeria de uma pauta emitida pela Delegacia Geral de Polícia. Na DGP, Eduardo Paglioni, assistente administrativo do delegado geral, disse, por assessora, que o assunto era da alçada da própria delegada seccional. O diretor do Departamento de Polícia Judiciária de São Paulo Interior – Deinter 1, João Barbosa Filho, de São José dos Campos, através de assessora, disse que o mais indicado a falar sobre o inquérito aberto para apurar o assassinato de Guerra é o próprio delegado de Ubatuba, Fausto Macedo, que o preside. Crime de mando? Tão importante quanto o pouco que disse o delegado Fausto Macedo é o que não disse. Não disse se as linhas de investigação referem-se apenas à autoria material (os pistoleiros) ou se incluem também o óbvio, a autoria intelectual (o mandante). Tamanha penúria de informações objetivas faz supor que ou a polícia está completamente perdida nas investigações ou tem trunfos que não quer divulgar para não assustar os investigados e, assim, evitar eventual fuga ou ocultação de provas. O que a maioria da população de Ubatuba presumivelmente acha (e todos os grãos de areia da praia do Tenório suspeitam) é que foi crime de mando. O autor intelectual (talvez mais de um) teria sido objeto de denúncia ou espinafração em alguma (ou algumas) das 3.090 matérias postadas por Guerra no seu blog Ubatuba Cobra, nos três anos e nove meses que esteve na internet, o que aponta para o uso de uma lógica inversa de investigação. Normalmente, a investigação apura fatos e circunstâncias, a partir dos quais identifica autores e chega a uma conclusão. Da outra forma, a investigação baseia-se numa tese, para então apurar fatos e incriminar (ou não) os autores já tidos como suspeitos. O problema é que Guerra operava uma metralhadora giratória, que atingiu muita gente em Ubatuba, e que defenestrou alguns ocupantes de cargos públicos, tanto em função do blog como resultados de procedimentos judiciais a que deu origem. Mesmo sem ser advogado, Guerra tinha sólidos conhecimentos na área jurídica, tanto quanto a leis como a processos penal e civil, bem como administrativo. Com isso, deu origem, em nome próprio ou por acionar o Ministério Público, a diversos procedimentos no âmbito do Poder Judiciário e também junto ao Tribunal de Contas do Estado. Em alguns momentos, bateu de frente com promotores de justiça, dois dos quais posteriormente removidos da comarca, e foi processado pela corporação, que agiu para defender a honra de um de seus membros. Guerra usava frases pesadas e agressivas como “Ubatuba não pode mais conviver com a nefasta presença de Promotores de 'Justiça' incompetentes, negligentes e omissos”, “até então prefeito (ou vereador, ou promotor, ou juiz)”, e dizia, de prefeitos, “além de omisso é incompetente, negligente, inconsequente e corrupto!”. Vez por outra utilizava o vocábulo “canalha” e numa das vezes endereçou-o a um proprietário de quiosque na praia do Tenório. Reforço Não consta que o delegado Fausto Macedo tenha pedido reforço, de pessoal e meios, para acelerar as investigações referentes ao inquérito de Marcos Guerra, nem tampouco que os delegados seccional e regional tenham oferecido qualquer reforço não relacionado à operação verão. No entanto, pelas suas características peculiares, por envolver atentado contra a liberdade de expressão, por calar um jornalista e blogueiro que desafiava autoridades e tinha forte discurso contra a corrupção, seria justo esperar alocação de recursos materiais e de pessoal para reforçar a Delegacia local e afastar a sensação de que o inquérito poderá morrer à míngua.
Nota do Editor: Elcio Machado (cidadania.e@gmail.com), 60, batizado como Elciobebe, sob as bênçãos e maldições de Cunhambebe, caiçara em construção. Mantém o blog Exercícios de Cidadania (cidadania-e.blogspot.com). Permitida a reprodução, desde que citados a fonte e o endereço eletrônico original.
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