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COLUNISTA
Julinho Mendes
12/11/2010 - 09h05
Dito Jordão, lembrança viva
 
 
Julinho Mendes 

Dito Jordão era um caboclo caiçara do sertão do Itamambuca. Caçador dos bons, gente da família dos Januário Leite, ultimamente morador das mediações da fazenda Mercúrio Correia, em Itamambuca. Tinha sua casinha lá, e como eu sabia que seu quintal era cheio de pés de jabuticabas, numa bela manhã de domingo, eu e meu pai fomos até lá a procura de um pezinho de jabuticaba para plantar no quintal de minha casa. Depois de um “café de cana”, mandioca, batata doce cozida e lembranças de grandes caçadas naquele sertão, já de enxadão em punho fomos retirar a mudinha de jabuticaba. Coitada! Tava só no cepo, mas ainda com alguns galhinhos resistentes. Tal depredação foi provocada por um filhote de porco do mato que devastava tudo que avistava de verde dentro do cercado onde vivia e onde estava a tal arvorezinha desgalhada. Retiramos assim mesmo e sob advertência de seu Dito, de que por muita sorte poderia vingar e que se viesse a dar frutos, não daria antes de quinze, vinte anos.

Já tinha aproximadamente um metro de altura. Replantamos no quintal de minha casa.

A arvorezinha gostou do lugar e foi rebrotando, e foi crescendo, e foi ficando viçosa.

Lembro que um dia o saudoso Ney Martins, presente em minha casa, me aconselhou a colocar umas pedras nos vãos dos galhos para ela “se abrir” e disse para eu deixar uma mangueira gotejando no pé da jabuticabeira para ela frutificar mais rápido. Nessa época a árvore já tinha uns oito anos, e segui os conselhos do Ney. Que nada! Faleceu Dito Jordão, Ney Martins e um punhado de caiçaras conhecidos, e a danada da jabuticabeira não dava nem sinal de flor. Uns diziam que era macho, outros falavam que era do tempo. Não sabia, preferi esperar os quinze, vinte anos proferido pelo seu Dito. E foi o que aconteceu, quinze anos depois ela deu sinal, e numa tímida florada acabou dando meia dúzia de jabuticabas; isso foi em 2006. 2007 e 2008, uma frutinha aqui, outra ali. Dei uma podada pensando em castigá-la. Foi pior, ano passado, de ruindade, a filha da mãe nem ameaçou uma florzinha sequer. Passei então a ameaçá-la, falando bem alto que ia meter o machado em seu pé; acho que a danada ouviu e nesse ano veio com tudo. Ficou branca em flor, e numa rapidez espantosa surgiram as frutinhas, que rapidamente cresceram e ficaram madurinhas. Chupei um punhado de jabuticabas, pensei em levar algumas ao Eduardo Souza, só não levei porque não sabia (como ainda não sei), se ele gosta de jabuticabas. Arrisquei ainda em fazer um licor, procurei na internet uma receita e mandei ver: Numa vasilha de vidro coloquei, como medidas, dois pratos fundos de jabuticabas, 800 g de açúcar, um copo de 250 ml de pinga e um litro de água fervendo. Vai ficar em repouso por trinta dias, já se passaram oito. Será que o Eduardo gosta de licor? Ano que vem, tentarei fazer geléia de jabuticabas e, desde já, peço a quem souber de uma receita, para me enviar.

É uma árvore, por si só, bonita, passarinhos dormem nela por ser bem fechadinha e segura de predadores maiores. Descrevo seus frutos como sendo os olhos de uma mulata que vi no Rio de Janeiro, sambando na quadra do Salgueiro. Que beleza!

Os sanhaços, tiés e saíras também são chegados nas jabuticabas, mas acabam derrubando e esperdiçando muitas frutas. Penso, em outra safra, colocar um edredom estendido no chão, para quando caírem não lascarem com o impacto, assim as recolho intactas para levá-las ao Eduardo, caso eu souber que ele gosta de jabuticabas.

Bom, vou me despedindo e esperar o licorzinho apurar, e se tudo der certo, faremos um brinde.

Tintim.

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