Um dia ainda teremos o correto entendimento do papel do parlamento nos regimes verdadeiramente democráticos. Não faz muito tempo, o jornalista português José Pacheco Pereira em seu blog Abrupto, dizia sobre a importância, em Portugal, da fiscalização do poder executivo e das comissões de inquérito: "É fácil o discurso de quem preferia governar sem baías desvalorizar o escrutínio parlamentar, acusando-o de ser uma distracção daquilo que é ’importante para o país’. Não é uma observação desinteressada, vinda de quem não quer explicar com clareza o que fez e tem um enorme incómodo em ser escrutinado. É fácil a uma comunicação social sobranceira e ignorante ’gozar’ com as comissões de inquérito, interiorizando muitas vezes os argumentos governamentais que pretendem pouco escrutínio e muita retórica. Mas, pouco a pouco, mesmo a partir de uma base pouco experiente e com erros de percurso, os méritos do escrutínio vão-se acumulando e o Parlamento cumpre a sua função principal, centralizando em si o papel de principal instituição de controlo e vigilância da governação e de debate político entre partes diferentes, o cerne da democracia". Tanto lá como aqui no Brasil os chefes do poder executivo fazem de tudo para governar sem baias, a exemplo do atual governo e de seu partido, que tem pretensões de ser único, tal como nas ditaduras do tipo cubana. O mesmo se dá no âmbito dos municípios em que os que fazem oposição e críticas ao poder executivo são qualificados de difamadores que se opõe ao progresso, ao desenvolvimento da cidade. O papel de fiscalizar e de cobrar resultados das ações empreendidas pelo gestor municipal é fundamental ao desenvolvimento do município, à melhoria na qualidade de vida da população, ao emprego eficiente, oportuno e adequado dos recursos financeiros, evitando-se as rotineiras malversações do dinheiro público. Não temos a tradição de cobrar resultados. As coisas sempre começam e falecem na oratória de palanque, nos discursos eleitoreiros, nos pródigos e prodigiosos planos de governo, não seguem adiante e, quando seguem, os resultados são quase sempre pífios. Sobre o mesmo tema, tive a satisfação de ler as sábias palavras do Marcos Guerra, em sua coluna aqui no O Guaruçá, quando diz: "Ao retornarem, os vereadores, deverão assumir definitivamente o papel de fiscalizadores do Executivo (grifo meu), transformando os anseios da população em Leis e principalmente demonstrando a independência que deve existir entre os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário." Poderia acrescentar: se não assumirem esse papel, o preço será o de serem confundidos pelo eleitorado que poderá qualificá-los como sendo farinha do mesmo saco da política de maquinações oportunistas. Acabarão seus mandatos perpetrando moções... Mas, como são inteligentes, hão de entender que as eleições de 2012 foram detonadas com esse episódio burlesco do afastamento que acabou trazendo à luz do dia certos interesses que dormitavam esperando a oportunidade para uma ação política com a qual alguns dos vitimados não contavam. Se atentarem para a nossa carta magna - a Lei Orgânica do Município - saberão que lhes compete fiscalizar e controlar os atos do Executivo, inclusive os da Administração Indireta (art. 13, inciso IX) mediante Pedidos de Informações, Comissões Permanentes, Comissões Parlamentares de Inquérito e exercerem o controle externo com o auxílio do Tribunal de Contas do Estado (arts. 268 e 269), realizando inspeções e auditorias de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial nas unidades administrativas de ambos os poderes, legislativo e executivo. Se fizerem isso, terão o reconhecimento da opinião pública e, possivelmente, do eleitorado.
Nota do Editor: Eduardo Antonio de Souza Netto [1952 - 2012], caiçara, prosador (nas horas vácuas) de Ubatuba, para Ubatuba et orbi.
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