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COLUNISTA
Julinho Mendes
07/04/2010 - 08h03
Mictório ambulante, já!
 
 
Julinho Mendes 

Domingo de Páscoa acordei e pensei em ter um dia de rei. Por que não? Com algum dinheiro preso na sunga, passei a mão na bike e pedalei até a praia Grande. Por volta das nove horas lá cheguei e me sentei na areia da praia. Não tardou e meus momentos de rei começaram a surgir. Primeiro me apareceu um ambulante, e com toda sua lábia, dizendo que o chão estava poluído e a radiação ultravioleta estava em seu máximo, me vendeu uma esteira e um guarda-sol. Cinco minutos depois, um outro me serviu com um jornal da capital. Comprei! Ao iniciar a leitura do primeiro artigo, um sorveteiro me vendeu um picolé. De repente escureceu, pensei ser uma nuvem tampando os raios do sol, mas não, era sim um artefato com rodas de bicicletas, estrutura de madeira e com cobertura de plástico azul cheio de cangas, camisetas, bonés, biquínis, lenços... Comprei tudo que me serviu; era meu dia de rei! Já com aqueles apetrechos, chupando sorvete e iniciando a leitura de meu jornal, um cheiro de queijo derretido me entrou pelas narinas. Nem acabei o sorvete, entrei no espetinho de queijo mineiro. Eeeeta coisa boa! Tava salgado, mas nada que uma cervejinha gelada não desse jeito, e junto com a cervejinha, parecendo tudo combinado, uma senhora de meia idade me apareceu com uma bandeja com espetinho de camarão, comprei uns quatro. A reportagem que tentava ler no jornal era sobre política e falava sobre o apoio oficial do PR (Partido da República) à candidatura de Dilma Rousseff. Não é que bastou aparecer o nome da Dilma me veio um cheiro de lula?

- Lula à dorê moço, o senhor aceita?

- Como não? Me vê três espetinhos e por favor pede pro rapaz do quiosque me mandar mais uma geladinha!

Aquele carro alegórico de roupas (loja ambulante) tinha estacionado bem na minha frente, me tirando a visão e a brisa do mar, mas a sombra me confortava, até que, por volta das dez horas o sol levantou por cima do alegórico trambolho e causou claridade excessiva em minha vista. Precisava de uns óculos! Como um rei árabe possuidor de um gênio da lâmpada que a cada pensamento me atendia de prontidão, diante de meus olhos estavam ali dois ambulantes vendedores de óculos. Comprei logo sete, um para cada dia da semana. Baratinho!

O segundo parágrafo de minha primeira leitura dizia que: “O líder do governo na Câmara, deputado Cândido Vacarezza (PT-SP)...”

- Olha o churrasquinho, tem de lingüiça, de coraçãozinho e de carne de vaca, vai um aí moço?

- Um não, me deixa três!

- Um de cada?

- Não, só de carne de vaca, o tal Vacarezza me deixou com fome! Tem cerveja aí?

- Não, moço, mas tá vindo aí o Tiãozinho da raspadinha com groselha. Experimenta só, é uma delicia!

- Que vá, traga o Tiãozinho aqui!

Vou mandando um beijinho / Pra filhinha e pra vovó / só não posso esquecer / da minha eguinha Pocotó. Pocotó pocotó pocotó...”

Era o que estava faltando no pedaço, um som descente para quebrar aquela batida de metal produzido pelos vendedores de espetinho, matracas de amendoinzeiros, apito de salva-vidas. “A eguinha Pocotó” chegou na hora, veio conduzida por uma turma que parecia ser de ônibus de excursão. Que legal! Minha música predileta “A eguinha Pocotó” em pleno domingo de Páscoa, em plena praia Grande! Realmente, coisa de rei!

Já eram onze horas quando iniciei o terceiro parágrafo, ainda da primeira notícia, e me apareceu então um vendedor de suporte de latinha de cerveja.

- Só compro se você me buscar uma cervejinha lá no quiosque.

- Não, senhor! Eu tenho aqui geladinha!

- Então me vê o suporte com o distintivo do Palmeiras, uma skolzinha e chama ali o vendedor de castanha-de-caju pra eu fazer um tira gosto! Fica com o troco menino!

A turma ao lado, tirou “A eguinha Pocotó” do aparelho e colocou Chico Buarque cantando: “joga merda na Geni, joga bosta na Geni...” Aí não dá! Peguei minha cervejinha dentro do suporte do Palmeiras e sai em caminhada pela belíssima e radiante praia Grande de Ubatuba. Que bacana! Uma 25 de Março em plena praia: artigos de praia e comes e bebes, para rei nenhum botar defeito! Estava ali representado, num pequeno pedaço de praia, todo o povo brasileiro: índio, português, negro, rico, pobre, baiano, mineiro, marbateano, farofeiro, corintiano, gordo, magro, sarado, barrigudo, cinturinhas de violão... Tudo em alegria, harmonia, paz, respeito, diversão... Cada um em seu pedacinho de areia, de sol, de mar... Tudo em meio a quiosqueiro, sorveteiro, queijeiro, amendoinzeiro, castanheiros, pasteleiro, barraqueiros, churrasqueiros, tatuadores, bijuteiros, artesões, jornaleiros, redeiros, pipeiros, chapeleiros, cangueiros, vendedores de guarda-sol, alugadores de pranchas e de bóias, corretores de passeio de escuna e de banana boat, zona azul... Todo mundo vendendo, todo mundo comprando, todo mundo vivendo, todo mundo sobrevivendo. Deixa o povo se virar! Pra que legislar pra ordenar?

Por falar em legislar, atenção politiqueiros de Ubatuba, fica aqui a idéia para que os senhores criem leis para abrirem espaço de trabalho para massagista, barbeiro, pedicure e manicure... e porque não criar o mictório ambulante, nas praias de Ubatuba? O meu dia de rei na praia Grande seria completo se tivesse a meu dispor, esses trabalhadores e principalmente o mictório ambulante. Adivinhem aonde dei umas mijadinhas?

Viva a praia Grande, lugar onde o povo vira rei!

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