Transatlântico não é nada perto do submarino que já andou por nossas águas. Assim me relatou o saudoso João de Souza: “Esse fato aconteceu durante a segunda Guerra Mundial.” Dia no largo, dia na beira da costeira, outro no parcel raso. Tava ruim a pescaria, não adiantava mais irem nesses lugares de costume. Resolveram então sair do gagadô e irem a águas mais profundas. Tudo arrumado e preparado saíram os dois, por volta das três da manhã, em direção à Ilha Anchieta. Na verdade remaram três léguas a mais. Nesse dia, além dos apetrechos de pesca (linhas e anzóis, muito bem preparados) levavam, cada um, uma marmita e uma garrafa de café. Tinham dormido bem e descansado bastante, pois sabiam que precisavam ter forças para remar e conduzir a canoa até o local da pescaria... Depois de seis horas remando, já com os braços sentindo câimbras, chegaram no pesqueiro, local chamado “parcel de fora”, donde se avistavam as praias de Caraguatatuba. Era um local profundo, onde, tanto a linha de pesca como a corda da poita tinham que ter, no mínimo, duzentos metros de comprimento para alcançar o fundo do mar. Era época de cação. Antes de arriar os anzóis na água, comeram ali metade do tutu com ovo e o café que levaram. Linhas na água, começaram a pescar... A isca era metade de uma sardinha em cada anzol, e não tardou a ferrar; a cada tranco na canoa era uma corvina que vinha, a bicha era daquela de papo amarelo, pesando mais ou menos uns quatro quilos; quando chegava na borda da canoa, vinha com o bucho pra fora, devido à pressão sofrida em função da profundidade. Estavam ali apenas uma hora e já tinham matado umas vinte. De repente a pegadeira parou. Tira sardinha, coloca camarão, tira camarão coloca lula e nada de peixe. - Vamos mudar a poitada? - perguntou Marcimiano. - Puxe a poita e deixa a canoa a rola! - respondeu Tibúrcio, que também se cansou do lugar. Enquanto o terralão soprava a canoa pra terra, Marcimiano e Tibúrcio proseavam no banco da canoa. - Tiburcio, cadê o cação que você falou que tinha aqui? - Calma Marcimiano, calma que eles vão aparecer, ainda é cedo! - Sabe Tibúrcio, dizem que neste lugar é louco pra ter tintureiro, e dizem que esse bicho é muito bravo! - É verdade, Marcimiano, mas esse cação só tem lá pros lado de Alcatrazes, eles não vêm pra cá! - Mas o Isaias, andou aqui de barco e viu um desses com a galha de fora, dando volta ao redor do barco! - E se esse bicho aparecer pra nós, aqui com essa canoinha? - Deixa de ser bobo, rapaz, esse bicho não ataca! - Nãããão éhhhh! Disse-me o Isaias que esse que eles viram, dava cabeçada no fundo do barco, que o barco chegava balançar. Tiveram que voltar pra terra com medo de que o bicho rachasse o casco do barco! - Deixa de ser medroso, isso é conversa fiada do Isaias!!! Conversa vai, conversa vem; de repente Marcimiano sentiu uma triscada na linha e em seguida deu uma ferrada. O bicho fez uma briga danada. E puxa Marcimiano, e puxa o peixe, até que o peixe cansou; cansou e chegou na borda da canoa. Era uma cambeva de uns oito quilos. - Tá vendo Marcimiano, elas estão chegando; vamos apoitar aqui! - ordenou Tiburcio com grande euforia. Foi uma só que deu o ar da graça. Não desanimaram, e ansiosos esperavam que outra ferrasse no anzol. Uma hora da tarde, a barriga roncava mais que roncador no fundo da canoa; então amarraram a linha no dedão do pé e comeram o restante da comida que sobrara na caçarola... Deu no Marcimiano, uma vontade louca de fazer xixi; então pegou a cuia de tirar água da canoa, ajoelhou-se no fundo da canoa e fez a necessidade. Enquanto mijava, Marcimiano observou que em volta da canoa começava a surgir bolhas de ar. - Tibúrcio, que bolhas de ar são essas em volta da canoa? - Nossa Senhora, rapaz, é um tintureiro, abaixe-se logo no fundo da canoa que o bicho é bravo, ele morde até a sombra!!! Diante desta pavorosa revelação, Marcimiano acabou mijando dentro da canoa e ficaram ali deitados no fundo da canoa até que o bicho fosse embora. Tibúrcio tremia mais que vara verde e Marcimiano com o bingolim de fora, começava a se borrar todo. O barulho das borbulhas, agora, era mais forte e a canoa começava a balançar mais fortemente, devido às marolas que surgiam. Tibúrcio que sempre em suas pescaria trazia o seu terço feito com escama de tainha começou então a fazer tudo quanto era tipo de reza. Marcimiano que estava na proa, olhou para o lado de Tibúrcio e viu surgir na popa um cano de seis polegadas feito cotovelo. O que seria aquilo? Perguntou a si mesmo. Já estava mijado e cagado, então que levasse a breca; levantou-se e deu de cara com um negócio que nunca tinha visto em sua vida. Era um submarino japonês, que tinha como nome “TÁKARRASHA LASKADA”. Uma de suas janelas abriu, e um japonês botou a cara pra fora fazendo a seguinte pergunta ao Marcimiano: - Arygatôôôôô sayonara? - O que foi que ele falou? - perguntou Tibúrcio a seu amigo. Então, dando uma de quem conhecia muito bem a língua japonesa, Marcimiano respondeu: - Ele perguntou se você “matô embetara”! Feita a tradução do japonês para o caiçarês; Tibúrcio pegou duas corvinas, das que estavam no fundo da canoa e respondeu ao marinheiro de olho puxado, que estava no submarino: - Embetara não matô; só matô corvina!!! - O japonês passou a mão nas duas corvinas, dizendo que ia fazer sashimi e se afundou com submarino e tudo pra dentro do mar. - Rapaz, ainda bem que foi um submarino; se fosse um tintureiro (tubarão tigre), nesta hora, nós já tava no bucho do bicho! Marcimiano que lavava a bunda com água salgada na borda da canoa, respondeu: - ÉÉÉ, tivemos sorte, vamos embora Tibúrcio!!!
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