MarleneCW (1, 2, 3, 5 e 6) e Elka Waideman (4) | |
1) Ana, Itanei e Frazão - 2) As casas que encantaram o Eng. Guaracy - 3) A fabriqueta, com sua barulhenta máquina de moldar - 4) A trituradora - 5) Os trabalhadores usam equipamentos de proteção - 6) A Prefeitura de Tarumã não tem medo de avaliação Estou em Assis, a 700 km de Ubatuba. Fiquei sabendo que ofereceram ao Dudu uma dica sobre como tratar o entulho de construção, experiência realizada em Tarumã, cidade que fica pertinho de Assis, onde ainda estou por conta de questões de saúde na família.
Depois de ler os elogios, aqui na revista O Guaruçá, por Guaracy Fontes Monteiro Filho, um engenheiro da CDHU, ao prefeito de Tarumã, resolvi conhecê-lo, e ao projeto mencionado. A cidade fica a 20 quilômetros daqui, uma viagem bem curta, e não houve burocracia. Telefonei para a Prefeitura, expliquei à diretora de gabinete o que pretendia, ela passou o telefone para o prefeito, o Jairão, combinamos a visita para depois do almoço, e fui para lá, acompanhado de minha mulher e minha filha, munidas de máquinas fotográficas. Quando chegamos, o prefeito Jairo da Costa e Silva pediu desculpas por não poder nos acompanhar na visita ao recém-inaugurado conjunto de 72 casas executadas no sistema de autoconstrução, em convênio com a CDHU. É que estava de saída para entregar à população um ônibus com mecanismo especial para cadeirantes. Mas nos apresentou a uma comissão encarregada de nos levar ao local: o secretário de Obras, Edenilson Frazão, a secretária de Assistência Social, Ana Luísa Yassuda, e a assistente social Itanei Guedes Ribeiro Dias. Passamos primeiro por um "condomínio" de idosos, 15 casas populares realizadas através de repasse do Estado, onde estavam sendo assentados bloquetes feitos na pequena fábrica do outro conjunto habitacional. A Prefeitura entrega os bloquetes no local, e os próprios moradores (na verdade, seus vizinhos e parentes, porque os moradores são velhinhos) os assentam, sob supervisão técnica de um funcionário do Departamento de Obras. A secretária Ana explicou que a ideia inicial era um condomínio, cujas casas seriam cedidas por comodato aos idosos. O sistema de comodato permanece, mas a ideia de condomínio foi abandonada e o conjunto integrou-se ao bairro, hoje ampliado, com mais 23 casas por sistema especial de financiamento, mediante recursos a fundo perdido do Programa de Subsídio à Habitação. Por se tratar de velhinhos, o conjunto recebe atenção especial da Unidade de Saúde da Família e da própria comunidade do bairro ao qual integrou-se. Fomos depois ao conjunto das 72 casas executadas no sistema de autoconstrução, palavra difícil que, na prática, quer dizer mutirão. São casas pequenas, mas "bem construídas, com piso, forro, azulejo na cozinha e nos banheiros, muros divisórios e belas calçadas com bloquetes de cimento", como descreveu o Engº Guaracy. Os bloquetes foram feitos ali mesmo, no canteiro de obras (que em pouco tempo se transformará em equipamento urbano que incluirá uma praça), num barracão que é uma pequena fabriqueta. Nas palavras do Dr. Guaracy, "A ideia é tão simples, que parece mentira. A Prefeitura distribui gratuitamente caçambas pela obras da cidade, recolhendo restos de materiais descartados nessas obras (telhas, cimento, tijolos usados, areia velha etc.). Todo esse material é encaminhado para esta pequena fábrica, sendo triturado, peneirado e colocado em uma britadeira, junto com areia grossa e cimento novo, formando uma massa homogênea, que colocada nas formas, transforma-se em bloquetes coloridos, bastando acrescentar um pó específico para este fim." Tarumã é uma cidade onde se cultiva a transparência. O site da Prefeitura contém um bem explicado (e atualizado) quadro de despesas e receitas e foi lá que descobri que, em novembro de 2009, a dotação orçamentária, do Fundo Municipal de Assistência Social e Inserção Produtiva, já tinha se transformado em verba, empenho e pagamento. Há mais 800 reais na rubrica "Desp Material para Produção Industrial", mas na dotação da Secretaria de Assistência Social, empenho ainda a pagar. Perguntei ao prefeito Jairão, só para confirmar, qual o custo mensal com os insumos para a fabriqueta. Ele tinha a resposta na ponta da língua: pouco menos de R$ 5 mil mensais. Com isto já pavimentou as calçadas de todo o conjunto, está pavimentando agora o do conjunto dos idosos, e já começam a ser produzidos os bloquetes para praças e calçadas de áreas públicas de toda a cidade. Nas épocas de maior produção, contando com uma máquina trituradora e uma moldadora de bloquetes, a fabriqueta já entregou, num só dia, perto de 2.000 bloquetes. Mas a produção média situa-se ao redor de 1.600 peças. Há algumas variedades de moldes, mas o mais comum é o que está nas fotos. Todo o sistema é operado pelos mutirantes, com assistência técnica de funcionários das Secretarias de Obras e de Assistência Social. Todos os trabalhadores recebem os equipamentos de proteção individual: capacetes, protetores auriculares (é incrivelmente barulhenta a máquina de moldar), luvas, botinas. Quem põe a mão na massa, em todo esse processo, é a assistente social Itanei. Pessoa afetiva que sabe ser suave, mas também firme quando necessário. Perguntou-me se sabia o significado de seu nome. Rebusquei na memória minhas pesquisas sobre nomes indígenas, já que sou da tribo dos Bebe, e arrisquei um palpite: ita, pedra. Mas não soube dizer, de pronto, o que significaria o nei. Ela me deu a resposta: "Também não sei, mas para mim quer dizer preciosa". Todos sorriram afirmativamente, e fica muito evidente, ressaltado, o carinho que o Jairão e todos os demais têm pela Pedra Preciosa. A pessoa certa no lugar certo. O Engº Guaracy disse aqui, na revista O Guaruçá (Uma dica para o Prefeito Eduardo César), que "A boa ideia se espalhou e o CIVAP - Consórcio Intermunicipal do Vale do Paranapanema, conseguiu junto a Secretaria do Meio Ambiente do Estado, recursos para a compra de um caminhão, para recolher e triturar esse material e poder servir todos os municípios da região." Já estava ficando tarde e voltamos para a Prefeitura, onde novamente conversamos com o Jairão. Foi conversa breve, porque o prefeito estava novamente de saída: preparava-se para viajar para São Paulo, onde, no dia seguinte (a terça-feira, 22/12/2009), tinha compromissos, como tesoureiro do CIVAP, consórcio que integra vinte Prefeituras desta região. O principal compromisso era a recepção dos recursos para comprar um caminhão com equipamentos especiais, alimentado por pás carregadeiras, para produzir o agregado a partir do entulho de construção. Não consegui os dados técnicos, mas trata-se de uma verdadeira usina de trituração sobre rodas, para produção em escala. Segundo os planos do CIVAP, o caminhão circulará pelas 20 cidades, atendendo cada uma um dia por mês, o suficiente para triturar todo o material recolhido e armazenado no período. MarleneCW | | O prefeito Jairão recebeu um exemplar do Auto do Boi de Conchas. |
Como disse o Engº Guaracy, "Enfim, uma ideia simples, ecologicamente perfeita, que gera emprego e agrega civilidade, bastando boa vontade e dinamismo para ser concretizada em Ubatuba. Estamos a disposição para fornecer todos os dados, basta solicitar." Resolvi conferir. Falei com o engenheiro Guaracy, por telefone, na CDHU. Ele me disse que ninguém solicitou os dados, ninguém daqui (agora falo como se fisicamente estivesse em Ubatuba, onde já mora meu coração) se interessou. Digo eu, agora. Prêmio no Ministério do Minc não faltou (foi registrado aqui, em O Guaruçá: E no Café Soçaite de Ubatuba... - 08/12/09). Mas falta preocupação com uma possível solução técnica e ecologicamente correta para a disposição do entulho de construção em Ubatuba e na orla adjacente, já que a natureza não tem as mesmas fronteiras da organização administrativa. Lixo doméstico comum e entulho de construção significam problemas ambientais, se não forem bem tratados. Existe um clima de animosidade entre Caraguatatuba, roteiro dos caminhões de transbordo de lixo, e Ubatuba, quando o necessário é o entendimento, a superação de bairrismos e picuinhas políticas, em busca de soluções abrangentes e coletivas. O que um não consegue resolver sozinho, um consórcio poderá dar conta. Talvez não fosse necessário aumentar taxas como se faz hoje, para apenas cuidar paliativamente dos problemas. Ninguém do Poder Executivo se interessou, mas o secretário de Obras de Tarumã revelou que alguém de Ubatuba o procurou. Recebeu e-mail de um assessor do vereador Sílvio Carlos de Oliveira Brandão (PPS), perguntando sobre o projeto de reaproveitamento do entulho de construção. Nunca pus os pés na Câmara Municipal de Ubatuba (cheguei há pouco de fora), mas o Legislativo tem um site que publica (é certo que com algum atraso) as atas, áudios e vídeos das sessões. Rebuscando nas atas, encontrei, na da sessão do dia 17 de novembro, algo sobre um substitutivo a projeto do vereador Adílson Lopes (PPS), que dispõe sobre o controle ambiental do descarte e destinação dos resíduos, entulhos e/ou materiais de demolição de reforma e de construção civil, no Município de Ubatuba. A votação foi inicialmente adiada por duas sessões, e depois adiada novamente, conforme me explicou, agora, por telefone, o vereador Silvinho Brandão. Precisa de um pouco mais de amadurecimento. De qualquer forma, o que está em debate é como recolher entulho e entregá-lo, ou à administração da Emurb, ou a entidades assistenciais, ou associações de moradores, para tapar valas e buracos, e coisas desse tipo. Numa palavra, desespero e paliativos. Não uma solução abrangente, integrada e integradora. Não é menos louvável a preocupação do Legislativo quanto ao tema - alguém precisa fazer alguma coisa, urgente! - mas o caminho adotado, mais uma vez, parece ser o do olhar próximo, muito próximo. Talvez seja necessário subir no alto de um de nossos belíssimos morros para olhar o mar, a orla e a própria montanha, de Paraty a São Sebastião. Não é a primeira vez que se fala em consórcio por aqui. Em março de 2001 alguém pareceu mexer com isso, mas não faço ideia qual foi o resultado. Não encontrei nenhuma referência na internet, exceto Cidades de Rio e SP formam consórcio verde. Mas se a situação já era feia em 2001, hoje é insustentável, por mais que se fale em Ubatuba Sustentável. O governante está adstrito à Ética da Responsabilidade, no dizer de um dos pais da Sociologia, Max Weber. Não se trata de um cínico "o importante são os resultados, não os meios". Mas a formulação contempla a realpolitik, e os resultados são sim importantes, desde que obtidos por meios lícitos. Os resultados que vemos hoje, tanto pelas minhas choramingações, pelas choramingações aqui da revista O Guaruçá, como pelas choramingações que podem ser ouvidas nos mp3 que a Câmara Municipal divulga, esses resultados são precários, insuficientes, ainda que existam os que, pelo oposto, digam ufanismos e jactâncias. Ao visionário gestor do Estado cabe a palavra Estadista. Ao prefeito caberia a palavra Municipalista? Não. Precisamos de um Estadista, de um gestor de uma parte do Estado, mas que veja além de seu município em particular, e sim a integração de seu município ao Estado nacional, que entenda o conceito de que Estado é a organização administrativa que engloba União, Estados, Municípios e o Distrito Federal (o DF, hoje administrado pelo Arruda (DEM), por uma Câmara Distrital com boa parte de seus membros sob suspeição). Não há como Ubatuba ser uma ilha de sustentabilidade (por enquanto, apenas uma palavra) se toda a nossa orla não for sustentável, com soluções ecologicamente aceitáveis. Mas para isso, é necessário pensar grande, ter grandeza. Não é aceitável a "anãozice": Ubatuba não merece isso. Elcio Machado, 55, é recém-ingresso na tribo dos Bebe, à espera de ser batizado como Elciobebe, caiçara em construção (elciomachado@ubaweb.zzn.com).
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