Enquanto os mais ilustres representantes da humanidade se reúnem em Copenhague para salvar o nosso planeta de uma catástrofe, aqui em Ubatuba estamos a fazer pouco caso das questões ambientais. Explico-me. Ao ver n’O Guaruçá a foto que encima o texto " Urubus à espera de lixo", do nosso editor, senti que ia para o beleléu o pouco da camada de ozônio que ainda resta sobre meus neurônios. Onde já se viu uma coisa dessas! Os urubus são elementos fundamentais ao desenvolvimento auto-sustentável do município. A história está aí para comprovar. Quem é que no passado limpava as nossas praias dos restos das pescarias, dos canganguás e marias-moles que ficavam espalhados na areia? Eles, os urubus. E no "lixão", quem é que ajudava a eliminar o lixo orgânico? Pois então. Haverá em Ubatuba alguma ONG em defesa desses catartidiformes descendentes? Esses bípedes emplumados que nascem brancos e, na idade adulta, se vestem da plumagem preta do ofício tão meritório às gerações presentes e futuras. Agentes sanitários. São servidores municipais voluntários. Haverá alguma ONG, Julinho? Você, que é um urubuservador juramentado das causas ambientais e defensor das minorias, diga algo a respeito. Quem sabe haverá alguma entidade, uma Urubu’s Watch? Existirá uma CUUT, uma Central Única dos Urubus Trabalhadores? Caberia uma ação popular? Uma Moção de Repúdio? Talvez a criação do Projeto Urubatu para preservar a espécie e evitar-lhe a extinção? Pois, é o que vai acontecer, caso não se impeça o transbordo do lixo. E, para nos judiar, no ano que vem, a taxa da coleta de lixo será aumentada! Cumplicidade moral no extermínio? Dormiremos de consciência tranqüila? Estamos exportando divisas, minha gente. O lixo é nosso e queremos preservar os nossos urubus. Conversei com o Belinho que, depois de considerar as relações de custo-benefício, sugeriu um projeto de adestramento dessas inestimáveis aves. Treiná-las para que transportem no bico (como fazem as cegonhas com os recém-nascidos) os sacos de lixo e só os abram em outras localidades. Aventou-se, en passant, no município de Barueri ou no de Ladainha, que hoje deve estar deserta, já que a população de lá veio toda para cá. Por que o município de Barueri? Porque, no retorno, os urubus poderiam servir de pombos-correio e nos trazer notícias da cidade do nosso munificente deputado cidadão ubatubense. Tantas, como são tantas as coisas que poderiam ser transbordadas de Ubatuba, Julinho... Cadê a oposição? Teria sido transbordada? O preço que se paga para o transbordo é justo? O que não se pode comparar não se pode compreender, certo? Quanto se paga em outras cidades que adotam o mesmo tipo de transbordo? Os fiscais do povo já viram as planilhas de custo? Há alternativas? Temos de impedir que os nossos urubus morram de fome, Julinho. Você poderia compor uma elegia ao urubu. Se não conseguir, serve uma marchinha de carnaval. Disso tudo, podemos concluir que Ubatuba está no bico do corvo (primo rico, distante, do urubu) no que diz respeito a desenvolvimento auto-sustentável. Transbordo do lixo? Como diria o urubu, digo, o corvo do Allan Pöe - "Never more".
Nota do Editor: Eduardo Antonio de Souza Netto [1952 - 2012], caiçara, prosador (nas horas vácuas) de Ubatuba, para Ubatuba et orbi.
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