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COLUNISTA
Eduardo Souza
14/05/2009 - 06h10
Turismo, alternativas e o Tato
 
 

Sujeito por quem tenho admiração e respeito é o Anderson José Rodrigues, o Tato. Outro dia, li um texto dele — Acabou a temporada... — em que abordava a questão comatosa da economia do município. Dizia da necessidade de "a cidade ter VIDA PRÓPRIA, ou seja, o povo ter emprego e condições de consumo o ano todo. É claro que as temporadas geram empregos e aquecem parte da economia da cidade, mas se usarmos a cabeça poderemos solucionar muito mais problemas ’criando empregos’ através da criação de fábricas não ’poluentes’, fábricas essas voltadas ao turismo. É, poderíamos fabricar produtos para alimentação, lazer, vestuário entre outros tantos itens. Os jovens da nossa cidade precisam ter outras opções de emprego com salários perto da realidade de outras cidades" (sic). A discussão sobre essa questão de Ubatuba ter alternativas ao turismo sazonal, de veranistas, não é de hoje. Mas anda um pouco de escanteio depois que houve, conforme andaram dizendo, a tal explosão de auto-estima, detonada pelo atracar daquele navio de passageiros na baía da cidade.

A idéia de que o turismo é praticamente a nossa única atividade econômica me faz associá-la à monocultura agrícola. Na entressafra, se anteriormente a ela não tiver havido boa safra e boa colheita, o agricultor come o pão que o diabo amassou. Ubatuba, em priscas eras, dependeu da monocultura do café do Vale do Paraíba. Na verdade, dependeu das atividades do porto que havia ali na Prainha do Matarazzo, por onde se escoava a produção do "ouro negro". Quando o plantio do café mudou para outras regiões do Estado, nóis ó...

Até a década de 70, Ubatuba, embora a população fosse bem menor do que a que temos hoje, em torno de 23 mil habitantes (Bons tempos aqueles!), tinha outras atividades econômicas que garantiam a circulação de dinheiro no município.

Segundo levantamento feito em 1978 pelo professor Alcyr José Quaglio¹, o município, sem levar em conta a construção civil, em acelerada expansão, na estimativa do censo para aquele ano, teve na produção agropecuária da horticultura, uma receita de 25 milhões de cruzeiros. A produção de banana, em 1977, foi de 700 mil cachos; a de cacau (campo pioneiro com 100.000 mil pés), em 1978, foi de 8.000 kg; em 1977, a produção de milho (vendida como milho-verde) foi de 96 toneladas. Pronta para o corte, naquele ano, 20.000 pés de seringueiras. O município tinha 562 propriedades agrícolas registradas no INCRA, e, no censo agrícola de 1975, 320 produtores. Já no setor de produção mineral, 11 empresas atuando na extração de granito. Em 1977, foram extraídos 9 milhões de cruzeiros na exportação de granito verde, sendo que 30% exportado para os EUA, Itália, Espanha, Dinamarca e Japão. Havia também a presença marcante da pesca e da indústria pesqueira, que na época abastecia São Paulo, Santos e o Vale do Paraíba. Cinco empresas ligadas à pesca, sendo duas para a conserva do pescado, 3 fábricas de gelo e a empresa San Tokura que estava, na época, investindo na criação de enguias, cuja produção seria exportada para o Japão. Bem, deixemos os dados estatísticos de lado.

O turismo é inquestionavelmente nossa atividade econômica principal. Mas não estamos tendo competência para que essa atividade gere frutos o ano inteiro. A busca de alternativas deve ser discutida já. Penso que devemos conhecer melhor nossas vocações e investir em atividades auxiliares e subsidiárias ao próprio turismo. Aliás, Tato, se levássemos a sério o Plano Diretor Participativo — Lei Municipal nº 2892, de 15-12-2006 — essas questões já teriam um bom encaminhamento. Cito alguns dispositivos do PDP para melhor ilustrar:

"Art. 16 – As políticas públicas atenderão às três ordens de que se compõe a realidade humana do Município, são de caráter obrigatório e serão elaboradas no prazo de 180 (cento e oitenta) dias após a instalação do Conselho da Cidade.

Parágrafo único – As ordens a que se refere o presente artigo são:

I.   A Ordem Econômica;
II.  A Qualidade de Vida;
III. A Gestão Administrativa.
"

"Art. 17 – A Política Pública de Ordem Econômica compõe-se, dentre outras, das seguintes políticas setoriais:

I.   Do Turismo;
II.  Da Produção;
III. Do Comércio e Prestação de Serviços;
IV.  Da Receita, Despesas, Investimentos e Incentivos.
"

O capítulo I do PDP trata do Turismo que, como vetor econômico, é composto, dentre outras, pelas seguintes categorias: infra-estrutura de apoio turístico, serviços turísticos, educação para o turismo, hospedagem, entretenimento, gastronomia, náutica, ecoturismo, turismo esportivo, turismo cultural, cita as instalações especiais, ou seja, o Aeroporto Gastão Madeira, O Pier do Saco da Ribeira, a Estação Experimental do I.A.C. (Horto Florestal), o Cais do Porto de Ubatuba (Itaguá), as instalações do Instituto de Pesca, a Base do Instituto Oceanográfico da USP, e o imóvel onde está instalado o DEPRN, na Ilha dos Pescadores, a Sede e o Centro de Visitantes do Parque Estadual da Serra do Mar (Núcleo Picinguaba).

O capítulo II do Plano Diretor Participativo trata da Produção. Diz o artigo 71: "A Produção, considerada um dos vetores básicos de desempenho econômico do Município, responde pela atração de investimentos, pela geração de empregos e contribui para a elevação dos níveis de qualidade de vida da Cidade". O PDP estabelece a criação de um Conselho Municipal da Produção e das seguintes atividades econômicas: agricultura, pesca, maricultura, indústria náutica, mineração, a biodiversidade, o comércio e a prestação de serviços, a construção civil, marcenarias, serralherias e estabelecimentos assemelhados, serviços e comércios de praias.

Como você pode ver, Tato, não é por falta de amparo legal que a discussão sobre alternativas econômicas ao turismo e também sobre atividades econômicas subsidiárias ao turismo sejam realizadas. O que impede as nossas lideranças políticas, os representantes das entidades civis não governamentais, dos órgãos públicos e da iniciativa privada de implementarem o Plano Diretor, de discutirem e buscarem soluções para a gravíssima questão econômica do município? A quem interessa não bulir nessas coisas e manter o status quo? Quem ganha e quem perde com a continuidade dessa situação? Acho que me estendi em demasia e, não querendo cansar você e o querido leitor, que gentilmente se esforçou em chegar até aqui, pingo o ponto final.

¹ Outro ubatubano competente e de respeito. Funcionário aposentado do IBGE que, naquela época, prestava serviços à Prefeitura. Por onde andará o amigo Alcyr?


Nota do Editor: Eduardo Antonio de Souza Netto [1952 - 2012], caiçara, prosador (nas horas vácuas) de Ubatuba, para Ubatuba et orbi.
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