O governo, em suas propagandas eleitorais na televisão, vem, de forma bastante concisa, conscientizando-nos da importância e da responsabilidade que temos em votar. Eu estou consciente, mas a injeção diária de propaganda, poluição sonora e visual, causa-me tentações. Aí eu rezo: “...perdoai-nos as nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido, não nos deixei cair em tentação, mas livrai-nos do mal. Amém”. Toda noite eu rezo e tenho obtido graças, mas na noite do 51, foi terrível. Vou lhes contar o meu sonho (pesadelo): Rapaaaaaaaaaz! Eu parecia um cavalo. Aquele negócio me apertava a boca e me forçava ir dum lado pro outro, sem eu querer ir. A cidade estava eufórica por causa das eleições. Bandeiras nos semáforos, nego entregando santinho, muros pintados, e aonde eu ia tinha um rosto, até bonito, maquiado, com um sorriso tipo “colgate”, olhando pra mim e parecendo dizer: - Seu voto é meu! Estava eu de cabresto e aquele artefato já tinha me dominado, me influenciando e me direcionando para tudo quanto era lado, e o gozado era que para o lado que eu ia tinha uma cara me olhando e dizendo: - Seu voto é meu! Passava um carro por mim e no vidro detrás tava lá a cara me olhando: - Seu voto é meu! Que caramba é isso? Lavagem cerebral? O duro era que além do bridão na minha boca tinha ainda o tapa olho que só fazia eu olhar reto, não dava chance de eu olhar pros lados. Já tava sentindo o arreio nas costas, e continuava andando. Às vezes virava à esquerda, às vezes à direita, mas sempre guiado pelo cabresto e sempre enxergando, já psicodelicamente, aquele sorrisinho: – Seu voto é meu! Nesse caminhar ouvia pessoas eufóricas gritando: - 51, 51, 51! Viva, viva! 51, 51! O que seria aquele número? No rádio, o 51 parecia picolé de pinga na boca do locutor. Ainda pensei comigo: - Será que o cachaceiro trocou de pinga? Não! Não! O cara é honesto e é fiel à Ubatubana! Fui andando e só descobri o motivo da euforia do 51 quando o cabresto me levou até uma banca de jornal. Estava lá estampado. O 51 era a porcentagem de uma pesquisa eleitoral. Aí ferrou! Tinham me colocado um sedém na virilha. Feito cavalo de rodeio comecei a pular e dar coices pra tudo quanto era lado. Aquele sorrisinho, agora mais aberto, continuava dizendo: - Seu voto é meu! Veio-me, de súbito, um acesso de relincho que eu não conseguia mais parar. Foi preciso me aparecer um par de ferraduras. Continuei. Já tava com cabresto, arreio, bridão, tapa-olhos, ferraduras, relinchando, virilha inchada... Agora não vai me acontecer mais nada, pensei. Pelo menos me sentia um cavalo: um manga-larga marchador talvez, ou um puro sangue árabe. Mas que nada rapaz! O pior me aconteceu. Ao passar por uma igreja, um líder religioso, que eu não sabia se era padre ou pastor, me veio com uma conversa fiada pra eu votar em fulano de tal para prefeito. Eeeeeepa! Pare aí! Assim também já é querer aproveitar da minha fé! Acordei desse pesadelo. Posso até ser um pangaré, mas burro jamais! E o cabresto sou eu que dirijo! Uuuuufa! Que noite terrível! Passado o susto, fui aos pés de meu oratório e durante 51 minutos, rezei 51 Pai Nosso e 51 oração à São Cristóvão. Olha minha gente, a minha fé no santo padroeiro dos motoristas foi tão grande que ouvi ele me dizer: - Julinho siga “novos caminhos”. Fiz o sinal da cruz e com todo respeito, assim como gato escaldado, resmunguei pro santo: “Novos caminho? Não dá pra ser por um caminho menos usado ou uma picadinha de mato?” Uuuuuuuufa!
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