- O bicho é danado! É um exímio ladrão, rouba e ninguém sente. É mais vivo que um gato, mais esperto do que um rato e mais astuto do que uma raposa. Gosta de viver escondido e, quando sai, sai disfarçado e, mesmo assim, com um olho virado pra frente e outro pra trás. O bicho é egoísta e traiçoeiro, pois não reparte nada com ninguém e põe os outros em fria. Geralmente tem duas ou três mulheres. Tem uma lábia que, de tudo o que ele fala, todo mundo acredita. É um verdadeiro larápio. Se falar em dinheiro, o bicho se derrete todo, seus olhos brilham e suas mãos coçam. Temos que ter cuidado com esse bicho! - Terminado o seu discurso, o siri-santola passou a palavra ao camarão. - Temos que caçá-lo! - Mas como? - Perguntou o sapinhauá. - Vamos fazer uma arapuca e armar na beira do caminho. Na hora que ele for comer a isca, nós puxamos a corda! - Não seja burro, camarão! - exclamou o baiacu - Você não sabe que ele faz outro buraco e foge? - E se eu fizer uma porcaria dentro do buraco dele? - prontificou o peixe-porco. - Não adianta nada. O bicho é mais porco do que você e vai gostar muito disso! - Interveio o saquaritá. A polêmica estava formada e cada vez mais a Câmara dos Debates se enchia. Na fileira de baixo estava a lula, o polvo e o mexilhão; na fileira do meio: o timbale, o robalo e a perajica; na ala de cima: o peixe-cabra, o peixe-galo e o peixe-gato... E a discussão cada vez mais se acirrava, até que chegou o peixe-frade para por ordem na discussão. - Calma, meus filhos, com esse nervosismo vocês não arrumam a solução. Deixem que eu irei conversar com o corrupto. Irei lhe mostrar as palavras de Deus. - Seu Frade, o cação-anjo já teve esta idéia e não adiantou nada, o bicho também é ateu - Retorquiu a lagosta que estava de antenas ligadas. O bafafá recomeçou e o auditório era uma zoeira só... De repente, vindo cambaleando da superfície, caiu no meio do salão uma moeda de um real. O silêncio se fez total. Estava ali a solução do problema. Com toda sabedoria, o peixe-rei pensou na solução para caçar e prender o corrupto. - Chamem aqui e agora o linguado e o siri-mirim! - Ordenou o peixe-rei. Enquanto aguardavam os dois, o rei explicou o seu plano para o auditório: - O linguado e o siri-mirim são bichos que se camuflam na areia. Fica o linguado de um lado e o siri do outro lado do buraco. Na hora que o corrupto sair do buraco, o linguado fecha e o siri agarra-o com suas pinças. - Mas como fazer o corrupto sair do buraco? - Perguntou o burro do camarão. - Tá vendo esta moeda de UM REAL, é só colocá-la um pouco afastada do buraco que o bicho vem correndo. Não deu outra, na hora que sentiu o cheiro do dinheiro, o corrupto começou a suar frio, seus olhos faiscaram e, como um relâmpago, saiu do buraco para pegar o dinheiro. Foi aí então que prenderam o corrupto! Com essa onda de corrupção em nosso Brasil, a mente do brasileiro fica traumatizada e começa a ter alucinações e pesadelos ruins. Comigo foi esse estranho sonho no fundo do mar. Acordei porque algo me apertava a garganta. Era o siri que me agarrava, pois era eu o corrupto. Coitado do corrupto! Ele é um bichinho que vive na beira da praia e que pode até estar em extinção devido à caça predatória de pessoas que o pegam para usá-lo de isca, sugando-o de sua toca na areia com aquela bomba, um aparelho feito com canos de PVC. Salvem os corruptos!!! Nota do Editor: A crônica “Salvem os corruptos”, publicada originalmente em 21 de maio de 2000, no número 32 da antiga revista UbaWeb (antecessora d’O Guaruçá), era um alerta. Os Lysiosquilla scabricauda, usados como iscas nas pescarias, são conhecidos em nossa região como corruptos e uma ação predatória os atinge enquanto os “indivíduos” homônimos perambulam à solta.
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