O amigo Gilmar Rocha, dia desses, postou-me uma pequena mensagem no Orkut, com um certo tom de arrebatamento, pelo fato de estarmos hoje utilizando computadores e a Internet para comunicarmo-nos um com o outro. Justamente nós, ubatubanos que aprenderam, como todos os de nossa geração, a escrever com caneta de madeira e pena de metal, tinteiro e mata-borrão. Foi no grupo escolar Dr. Esteves da Silva. O professor Lauristano exigia boa caligrafia. Depois veio a máquina de escrever, e alguns jovens se tornaram datilógrafos, com a professora Dionísia Bueno Velloso. Ah, saber datilografia naquela época era a glória! No colégio "Capitão Deolindo", lançamos um tablóide - o Asteriskus. Não era bem um tablóide, mas sim folhas de sulfite mimeografadas. Alguém ainda se lembra do mimeógrafo? Era a HP daqueles tempos. O Asteriskus teve vida brevíssima. Também pudera, o diretor do colégio se borrava todo de medo de que nossos textos pudessem ser considerados "subversivos". Eram tempos de regime militar. Bons tempos aqueles! Não pelo regime, mas pela nossa juventude, por termos vivido naquele período de profundas transformações. Muitas delas, vejo hoje em dia, de uma irradiante estupidez. Mas no presente do passado tudo era azul. Não estávamos preocupados com o julgamento da história. Estávamos inventando o mundo. Éramos só vitalidade. Liberdade, amor, sexo, rock’n roll, ideologias de botequim e revoluções entre uma cerveja e outra. Naqueles tempos, ser jovem era tudo. O que levou Nelson Rodrigues a aconselhar os jovens, com aquela obsessiva profundidade, a envelhecerem. Diria que o Gilmar e eu, e todos os de nossa geração, temos um pé no vilarejo, na província, e outro, na pós-modernidade, no mundo globalizado. Tal como o guaruçá - entre a terra e o mar - realizamos a síntese dialética vivendo na areia. De um lado, a parafernália tecnológica, as conquistas da ciência, o materialismo marxista, o hedonismo, o epicurismo, o homem como centro do universo. De outro, o rústico, a tradição, o Deus te abençoe, o se Deus quiser, o banho de bacia, a farinha de mandioca, os santos no oratório, o Sinal da Cruz e a Ave Maria. De um lado, a televisão; de outro, a janela. Havia tédio naqueles tempos, Gilmar? Hoje até as crianças são entediadas. Sorte que, dispondo de computadores, ainda temos o que dizer para matar o tempo. Mesmo porque, como diria novamente o Nelson Rodrigues - "As coisas não ditas apodrecem em nós".
Nota do Editor: Eduardo Antonio de Souza Netto [1952 - 2012], caiçara, prosador (nas horas vácuas) de Ubatuba, para Ubatuba et orbi.
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