Crescem as expectativas quanto aos planos de redução das emissões de gases de efeito estufa que cada país submeterá à COP 21 (Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima), de 30 de novembro a 11 de dezembro, em Paris. Como em um grande mosaico, é a junção dessas propostas, denominadas INDC’s (Contribuições Nacionalmente Determinadas), que permitirá avaliar o resultado em relação à meta de redução da temperatura global. No cenário doméstico, detalhados estudos e simulações, realizados por especialistas de comprovada capacidade técnico-científica, exploram as possibilidades de um caminho seguro, mas nada trivial, que compatibilize compromissos ambiciosos do ponto de vista ecológico e a capacidade de crescimento do Brasil. É um grande desafio, já que são duas demandas legítimas da sociedade: preservação ambiental e desenvolvimento. Embora os objetivos não sejam excludentes, é evidente a forte correlação entre a expansão do PIB e as emissões de gases de efeito estufa. Ademais, as medidas necessárias para a mitigação em alguns setores específicos da economia representam custos que, por vezes, podem comprometer a própria atividade se não forem bem calibrados. São inegáveis, também, as muitas oportunidades nessa agenda, pois existem temas que já pavimentaram um caminho no qual é possível avançar a passos largos em um casamento bem-sucedido entre o desenvolvimento produtivo e a preservação dos recursos. Em 2009, quando o Brasil comprometeu-se a cortar entre 36,1% e 38,9% de sua curva de emissões projetada até 2020, aquilo que foi apresentado de maneira voluntária na Dinamarca, na COP 15, virou política nacional e, para cada setor da economia, foram elaborados planos de mitigação. Além dos louváveis resultados, reconhecidos internacionalmente, da política de combate ao desmatamento, os compromissos brasileiros renderam outro fruto. Nasceu no País a iniciativa mais ambiciosa dos trópicos para a redução de emissões no meio rural: o Plano Setorial de Mitigação e de Adaptação às Mudanças Climáticas Visando à Consolidação de uma Economia de Baixa Emissão de Carbono na Agricultura, o Plano ABC. Este direciona parte dos recursos do crédito agrícola para financiar atividades e tecnologias de mitigação, como a recuperação de pastagens degradadas, plantio direto, integração lavoura-pecuária-floresta, sistemas agroflorestais e fixação biológica do nitrogênio. Trata-se de mudança expressiva na orientação da política agrícola, já que oferece ao produtor agropecuário a oportunidade de olhar todas as possibilidades de interação e otimização dos recursos existentes dentro de sua propriedade. Com isso, dá a ele a possibilidade de verificar, através dos resultados obtidos na prática, que é possível equilibrar de maneira cada vez mais harmônica o tripé econômico, ambiental e social. Apesar de bem estruturado do ponto de vista conceitual, é necessário, ainda, um conjunto de ajustes para que o plano ganhe a escala que se deseja. A COP 21 pode ser um excelente estímulo para isso. Em uma iniciativa inédita, a Fundação Getúlio Vargas, por meio de seu Centro de Agronegócio, realizou um conjunto de propostas de revisão do plano, através do Observatório ABC. As sugestões apresentadas, a partir de consultas públicas com a participação de importantes entidades do agronegócio, abordam desde a necessidade de se disponibilizarem juros diferenciados, até o desenvolvimento de coeficientes e indicadores de emissões e remoções de gases de efeito estufa dos diversos sistemas produtivos. Além disso, o documento aborda a necessidade de se ampliar a divulgação das tecnologias apresentadas e a capacitação de pessoal, por meio de assistência técnica e treinamento, já que o ABC representa mudança profunda. O monitoramento e o controle ágeis e precisos dos resultados são fundamentais para se mensurar a efetividade do programa, e isso somente poderá ser realizado com investimentos em novas tecnologias. O potencial é enorme e pode superar em mais de dez vezes a meta originalmente estipulada pelo governo no Plano ABC. Em um cálculo conservador, realizado pela equipe da FGV, no qual se consideram apenas a utilização de algumas práticas previstas no plano e um grupo de sete culturas, além do rebanho bovino em 1.285 municípios, as emissões evitadas em um período de dez anos, somadas ao estoque de Co2eq (Equivalência em dióxido de carbono) no solo, chegariam a 1,8 bilhão de toneladas, utilizando-se a métrica GWP (Global Warming Potential/Potencial de Aquecimento Global) e as projeções da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e do Ministério da Agricultura. Desde 2009 o agronegócio movimenta-se rapidamente, permitindo que o Brasil chegue à COP ao final do ano com vários ativos importantes: além do Plano ABC, um Código Florestal que deverá recuperar de 12 milhões a 25 milhões de hectares de florestas nativas e, mais recentemente, a contribuição decisiva para a aprovação do marco legal da biodiversidade. Toda essa evolução tem um custo significativo, mas que não pode ser alto a ponto de inviabilizar as iniciativas propostas. É aí que mecanismos de financiamento estruturados e um mercado de carbono bem calibrado serão fundamentais ao cumprimento das metas. Uma vez mais, o agronegócio mostra como produzir mais com menos, oferecendo um caminho seguro e concreto para alimentar o mundo de modo cada vez mais sustentável. Nota do Editor: João Guilherme Ometto, engenheiro (Escola de Engenharia de São Carlos – EESC/USP), é vice-presidente do Conselho de Administração do Grupo São Martinho, vice-presidente da FIESP e coordenador do Comitê de Mudança do Clima da entidade. Roberto Rodrigues, engenheiro agrônomo (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz – ESALQ/USP), foi ministro da Agricultura (2003-2006), é Coordenador do Centro de Agronegócio da FGV, embaixador especial da FAO para as Cooperativas e presidente do LIDE Agronegócio.
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