O Superior Tribunal de Justiça (STJ) consolidou recentemente os deveres e obrigações da Serasa perante aos consumidores. A polêmica decisão, referente ao julgamento do Recurso Especial 1.033.274, traz mudanças consideráveis no sistema de funcionamento da empresa, que pode considerar-se vitoriosa em detrimento ao consumidor. Este pode sair prejudicado em pontos importantes. A Serasa Experian é a maior empresa (privada) do país na área de informações de crédito, respondendo aproximadamente por quatro milhões de consultas diárias, demandadas por mais de 400 mil clientes. Não há dúvida de que os bancos de dados de proteção ao crédito desempenham papel relevante no mercado de consumo. É praticamente impossível a concessão de crédito sem eles. No entanto, o serviço deve observar regras e respeitar limites, sob pena de causar danos materiais e morais aos consumidores. Com a decisão do STJ, a Serasa será obrigada a checar e retirar do cadastro todo consumidor que tiver sua dívida prescrita ou com inscrição superior a cinco anos. Ponto positivo do julgado, que segue o determinado pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC). Em outro ponto harmônico da decisão, o STJ determinou que a Serasa deverá excluir o nome do consumidor que comprovar erro ou inexatidão sobre sua inscrição. A última obrigação fixada na decisão fica a cargo da empresa que solicitou a inscrição, que terá prazo de cinco dias, contados da data do efetivo pagamento, para requerer a exclusão do nome do devedor, sob o risco de responder por danos morais. Em contrapartida, a Serasa obteve êxito em questões cruciais, que trazem maior conveniência à empresa. Para a inscrição do consumidor, havia a exigência – ao credor – de exibição de documento que comprovasse o débito. A decisão afastou tal obrigação, tornando o ato da inscrição mais informal. Bastará uma simples informação via e-mail, por exemplo. O motivo da mudança foi a constatação de que a Serasa não tem competência de deliberar sobre a dívida, mas apenas de realizar a anotação. Outro ponto polêmico, já abordado pela súmula 404 do STJ, repousa na necessidade da Serasa em notificar o consumidor por meio de um aviso de recebimento informando sua inscrição. A súmula foi ratificada, bastando à Serasa o simples envio de correspondência ao endereço fornecido pelo credor. Por último, a turma julgadora decidiu que a Serasa não tem dever de notificar o consumidor quando a informação for proveniente de cartórios de protesto e distribuição judicial, por se tratar de bancos de dados públicos. Decidiu também que a simples discussão judicial não é o bastante para impedir a inscrição do consumidor. A decisão certamente agradou à Serasa, que conseguiu grande parte do que sempre quis: manter-se como uma empresa meramente informante – o que, de fato, é. A função da Serasa é armazenar informações relativas aos consumidores, que lhe são prestadas pelos fornecedores/credores de todo país. Certamente a operação da empresa ficaria prejudicada, caso ela tivesse que pesquisar e comprovar a veracidade dos milhões de pedidos diários de informações que recebe. No entanto, como é notório país afora, a Serasa é a grande arma – talvez a maior – do comércio em geral, para avaliação e liberação de crédito. Logo, o sistema é essencial para a decisão de um fornecedor em liberar ou não um crédito. E até de uma empresa, em empregar ou não dado cidadão. Portanto, a importância do cadastro ser exato e fiel com a realidade é excelsa. Sendo assim, a desnecessidade de notificação inequívoca do consumidor vai à contramão do bom senso e a própria lei consumerista. O artigo 48 do Código de Defesa do Consumidor preconiza que o consumidor deverá ser informado por escrito quando incluído em cadastro, ficha ou registro contendo seus dados pessoais e de consumo. A decisão, de certo modo, exime de responsabilidade a empresa, que impulsiona e é parte responsável – mesmo que indiretamente – por muitos negócios em todo o Brasil. Quanto maior a relevância, maior a responsabilidade, o que parece não ocorrer no caso da Serasa. O entendimento do STJ pautou-se, sobretudo, na tentativa de defesa da sociedade em geral, como meio de buscar evitar o aumento da inadimplência, que traz insegurança à sociedade como um todo. Porém, sob o crivo do direito consumerista, a diminuição das responsabilidades da Serasa trará crescimento da já tão frequente negativação indevida, acarretando danos à reputação dos consumidores, que certamente buscarão o Judiciário para reclamar seus direitos. Nota do Editor: Leonardo Furlaneto é advogado da área cível do escritório Peixoto e Cury Advogados. E-mail: leonardo.furlaneto@peixotoecury.com.br.
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