O conceito de consumo responsável é complexo e caracterizado por uma grande diversidade de práticas. A primeira definição foi criada por Fisk (1973), que se referiu ao consumo responsável como o uso racional e eficiente dos recursos em relação à população humana global. No entanto, concentrou-se apenas no lado da oferta, mostrando como as empresas podem contribuir para o consumo responsável. Desta maneira, o que é produzido é regido em parte pelas necessidades e desejos dos consumidores. Como tal, o foco no consumo do lado da demanda, ou seja, dos consumidores, fornece um complemento estratégico à definição de Fisk. Em apoio a essa noção, estudos existentes, como os de Antil (1984), Roberts (1995), Webb, Mohr e Harris (2008), mostram o consumo responsável como comportamento do consumidor. Webster (1975), estabeleceu as bases para um trabalho adicional sobre o consumo responsável do ponto de vista da demanda. Ele propôs que os consumidores sejam “socialmente conscientes” quando consideram as consequências públicas de seu consumo privado e tentam usar o poder aquisitivo para provocar mudanças sociais. A base dessa conceituação está fundamentada na construção psicológica do envolvimento social, que afirma que os consumidores socialmente conscientes devem: 1. Estar atentos aos problemas sociais; 2. Acreditar que têm o poder de fazer a diferença; 3. Estar ativos na comunidade. Apesar da definição ampla de Webster (1975), do conceito, os resultados de seu estudo desviaram-se da palavra “social”, e foca nos aspectos “ambientais”. Roberts (1995), posteriormente refise o conceito de Webster e introduziu o termo “consumidores socialmente responsáveis”, ou seja, são aqueles que compram produtos que têm um impacto positivo (ou menos negativo) do meio ambiente e auxiliam empresas que tentam efetivar mudanças sociais positivas relacionadas. Essa definição abrange duas dimensões: a preocupação ambiental e a social. Da mesma forma, Mohr, Webb e Harris (2001), sugeriram que o comportamento do consumidor socialmente responsável se baseia em decisões de aquisição, uso e disposição no desejo de minimizar ou eliminar quaisquer efeitos nocivos e maximizar o impacto benéfico a longo prazo do meio ambiente e da sociedade. Em contraste, alguns estudiosos optaram focar nos aspectos éticos e cidadania ecológica do comportamento do consumidor (SHAW; RIACH, 2011; MACLARAN; BRADSHAW; CHATZIDAKIS, 2012; WHITE; MACDONNELL; ELLARD, 2012; CHATZIDAKIS, 2015; CARRINGTON; ZWICK; NEVILLE, 2016; RODRIGUES, 2021). Embora este fluxo de pesquisa seja frequentemente referido como consumo ético/consumidor-cidadão, existe uma clara sobreposição entre esse conceito e o consumo responsável. Smith (1996), sugere que o consumo ético significa simplesmente consumir produtos que são congruentes com o que a sociedade vê como “bom”. Desta forma, a literatura de sustentabilidade de marketing tem comumente retratado os consumidores “bons” como aqueles que são éticos/consumodores-cidadãos, ou seja, são aqueles que consideram o bem-estar social e ecológico importantes e, como resultado, conduzem seus estilos de vida de consumo de acordo com essas questões (BARNETT; CLOKE; CLARKE; MALPASS, 2005; SHAW; RIACH, 2011; LIM, 2016; RODRIGUES, 2021). De fato, o que é considerado “bom” (ou “certo”) no que diz respeito à sustentabilidade é muitas vezes baseado em filosofias morais amplamente aceitas e adotadas pela maioria dos cidadãos globais, por exemplo, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas (LIM, 2017). Todavia, o mais importante, embora o consumo responsável seja frequentemente examinado na literatura, há pouca consistência na terminologia e definições utilizadas, por exemplo, Anderson e Cunningham (1972) e Webster (1975) usam “consumidores socialmente conscientes”; Antil (1984), Mohr et al. (2001) e Roberts (1995) usam “consumidores socialmente responsáveis”; Follows e Jobber (2000) usam “consumidores ambientalmente responsáveis”; e Schlegelmilch et al. (1996) usam “consumidores ambientalmente conscientes”. Ozcaglar-Toulouse (2005), define consumo responsável como sendo “um conjunto de atos voluntários, situados na esfera do consumo, alcançados a partir da consciência das consequências julgadas como negativos do consumo no mundo exterior para si mesmo, essas consequências não, portanto, não a partir da funcionalidade das compras nem do interesse pessoal imediato”. Embora essa definição não explicite um foco em preocupações sociais, ambientais ou éticas/consumidores-cidadãos, ela fornece um contexto em que a “responsabilidade” é moldada pelo meio ambiente, e tanto as preocupações sociais quanto éticas/consumidores-cidadão fazem parte indiretamente desse ambiente (LIM, 2017; RODRIGUES, 2021). Lim (2017), afirma que, gradualmente, as preocupações sociais, por exemplo, maximizando os benefícios para a sociedade e a equidade social, as preocupações ambientais, minimizando o uso de recursos, incentivando a preservação e reduzindo a degradação ambiental e a preocupação ética, moralmente errada para a sociedade se envolver em atividades que poluem e destroem o ambiente econômico, natural e social, serão incorporadas ao termo guarda-chuva de consumo responsável. Ou seja, os consumidores responsáveis são aqueles que incluem preocupações sociais, ambientais, éticas e cidadania ecológica (consumidor-cidadão/cidadão-ecológico) em suas decisões de consumo (LIM, 2016, RODRIGUES, 2021). Para Lim (2017), os consumidores responsáveis consideram as preocupações sociais, ambientais, éticas e cidadania ecológica, e as traduzem em responsabilidades expressas por meio de suas escolhas e decisões de consumo. Os consumidores que abraçam e praticam o consumo responsável estão cientes dos efeitos negativos do consumo no mundo. Décadas de protecionismo (medida econômica) deram lugar a ávidos abordagens de livre mercado em todo o mundo e, portanto, existe um estado de “soberania do consumidor” no qual a liberdade e o consumo estão indissociáveis e traduzidos na base da cidadania ecológica (LUNT; LIVINGSTONE, 1992; SMITH, 1994; RODRIGUES, 2020). Consequentemente, os consumidores hoje sentem o dever como cidadão de promover a causa do consumismo, o bom consumidor é um bom cidadão, especialmente nas políticas econômicas neoliberais (ALDRIDGE, 1994). Hobson (2002), embora tenham sido levantadas questões sobre a legitimidade da “soberania do consumidor” como reflexo das práticas sociais e econômicas e se os atos de consumo podem ser considerados “racionais”, a abordagem do consumidor responsável não ameaça o consumo, mas se esforça para incorporar uma nova preferência sem implicar (supostamente) estilos de vida sagrados e profundamente enraizados. Assim, a incorporação de preocupações sociais, ambientais, éticas e cidadania ecológica pelos consumidores responsáveis em preferências, e responsabilidades decretadas por meio de decisões de consumo é uma forma de forjar a agenda de consumo sustentável (LIM, 2017; RODRIGUES, 2020). Nota do Editor: José Austerliano Rodrigues. Especialista Analista Sênior e Doutor em Sustentabilidade de Marketing pela UFRJ, com ênfase em Marketing e Sustentabilidade, com interesse em pesquisa em Sustentabilidade de Marketing e Comportamento do Consumidor. Fonte: Portal EcoDebate (www.ecodebate.com.br)
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