Lia, por favor, traga o café para mim. Vá lá fora e espie: acho que vem chuva forte, melhor tirar as roupas do varal. Darcy chegará mais tarde, não se preocupe, a comida de ontem ainda está boa, ele não é visita de cerimônia. Zé Raul não para de latir, melhor que ele durma aqui dentro, preciso de um sono tranquilo. Daqui a pouco a noite chega e o lampião tem que ficar aceso. Se preferir podemos acender as velas, acho até mais aconchegante. Sabe, Lia, tenho pensado muito: nossa casa é tão grande, os filhos quase não aparecem. Poderíamos vendê-la, começar vida nova em uma cidade melhor, comprar um sítio. Menos despesas, menos trabalho. Pense sobre isso. Yara esteve aqui e fotografou as galinhas de Angola. Acredita? Aquela ali enxerga longe, nota beleza em coisa que ninguém vê. Até pedra já foi alvo de retrato. Posso com essa juventude, Lia? Acho essa moçada diferente demais. Depois que o Márcio deu uma Polaroid antiga para ela, não quer outra vida. Os remédios estão aqui do lado, o copo com água também, bom que não lhe incomodo caso acorde de madrugada. Você não tem dormido bem, me lembre de preparar um chá de camomila amanhã, antes de deitarmos. Acalma, faz bem. Lia, só eu falei até agora, você anda monossilábica. Isso me deixa apreensivo. Vamos fazer o seguinte; amanhã peço pro Carlinhos lavar o jipe e vamos até Oliveira Fortes dar um passeio. Paramos na capela de Nossa Senhora da Rosa Mística, fazemos nossas preces e voltamos para nossa vida tranquila, sem sobressaltos. O que acha, Lia?
Nota do Editor: Sayonara Lino é jornalista, com especialização em Estudos Literários pela Universidade Federal de Juiz de Fora e atualmente finaliza nova especialização em Televisão, Cinema e Mídias Digitais, pela mesma instituição. É colunista do Literário e também do Sorocult.com.
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