Anita caminha pela praia em um dia frio. Pensamentos velozes como o vento que sopra. Sente uma imensa vontade de colocá-los no papel. Como está de mãos vazias, decide sentar e escrever na areia, a mesma que sustenta seus passos diariamente. Com o dedo indicador da mão esquerda, começa: “saudades da infância”, “vontade de subir em um pé de jabuticaba”, “desejo rever a casa amarela”, “como era bom viajar de fusca!”, “fugi das abelhas que teimaram em me perseguir”. Era certo que Anita estava um tanto nostálgica, ávida por recuperar um tempo que não regressaria. Continuou a desenvolver a escrita. O cenário era propício. Apesar do céu nublado, havia uma beleza poética e um encantamento que a inspiravam. Prosseguiu com palavras soltas, sem compromisso em formar frases que fizessem sentido. Todas refletiam seus sentimentos mais profundos. “Sublime, vida, caos, casa, chão, saudades, força, plenitude, contradição, beleza, amor, angústia, lucidez, totalidade, busca, sonho, pulsão, vivência.” Parecia criança novamente, tamanho era seu contentamento. Sorria, gargalhava ao libertar as emoções que estavam aprisionadas e que a afligiam em alguns momentos. Descobriu que transportar seu universo íntimo para a areia era como deixar um registro, ainda que momentâneo, para o mundo. Uma idiossincrasia. Anita era singular. Com o entardecer, após um dia inteiro em contato com as letras, parou e observou tudo o que ali estava. Além das frases e palavras, um pequeno conto, uma carta aos pais e alguns versos sobre separações. A maré subiu e tudo foi levado mar adentro. Anita estava de alma lavada.
Nota do Editor: Sayonara Lino é jornalista, com especialização em Estudos Literários pela Universidade Federal de Juiz de Fora e atualmente finaliza nova especialização em Televisão, Cinema e Mídias Digitais, pela mesma instituição. É colunista do Literário e também do Sorocult.com.
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