Bianca chamava a atenção desde menina. Belíssima, com seus fartos cabelos ruivos, olhos castanhos e boca bem delineada. Destacava-se das outras crianças pelo jeito introspectivo e a forma amadurecida com que agia. Estava sempre atenta. Ouvia o que os adultos diziam e, não raro, emitia sua opinião a respeito de alguns temas. Quando a conheci, havia completado nove anos de idade. Mudou-se para o prédio onde eu morava e por lá permaneceu com a família – os pais e um casal de irmãos mais velhos – até os dezessete anos. Me lembro bem de uma fase em que ela me fazia companhia no horário da noite, quando minha mãe saía para lecionar. Ficava em sua casa, ouvindo suas histórias nas quais acreditava piamente, mas que provavelmente foram inventadas. Bianca era muito imagética. Alguns dias atrás, caminhando pelo centro da cidade, vi uma moça de longe e rapidamente lembrei da ruivinha que fez parte de minha vida. Andava ao lado de um homem moreno que carregava um menininho no colo. Imaginei que fosse filho deles. Apertei o passo para constatar se era ela. E era! Fiquei sem jeito de abordá-la. Será que lembraria de mim, seria simpática? Com receio de ser invasiva, controlei o desejo de dizer "Olá, como vai?". Por medo, perdi a oportunidade de conversar com alguém que faz parte de minha memória, que enriqueceu meus dias pueris. Por uma insegurança tola que poderia ter sido superada. Continuarei olhando com a atenção de Bianca quando andar pelas ruas do centro da cidade. Talvez a encontre em um outro dia e crie coragem para falar com a menina ruiva, que se transformou em mulher.
Nota do Editor: Sayonara Lino é jornalista, com especialização em Estudos Literários pela Universidade Federal de Juiz de Fora e atualmente finaliza nova especialização em Televisão, Cinema e Mídias Digitais, pela mesma instituição. É colunista do Literário e também do Sorocult.com.
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