Houve tempo em que o consumidor era cobrado com bandinha de música. A fim de constrangê-lo, o credor comparecia até a sua residência com uma banda, para que todos soubessem da existência da dívida. Isso, por óbvio, causava a segregação do consumidor no seu convívio social. Também eram comuns as cobranças mediante ligações para o chefe do consumidor ou para membros de sua família, a fim de constrangê-lo a pagar. Para evitar essas formas de cobrança vexatórias, o Código de Defesa do Consumidor, no seu art. 42, “caput”, proíbe que o consumidor inadimplente seja exposto a ridículo, ou ainda submetido a constrangimento ou a ameaça. Hoje ainda existem formas de cobrança vexatórias. Algumas padarias, por exemplo, colocam nos vidros do caixa os cheques devolvidos por insuficiência de fundos, que discriminam o nome do emitente, o número da sua conta corrente, o número do seu CPF etc.. Não há dúvida que esse tipo de situação constrange o consumidor e é vedada pelo Código. A proibição de cobranças vexatórias não significa, por óbvio, que o consumidor não possa ser cobrado. Continua possível a cobrança das dívidas por meio de cartas, de telefonemas, pessoalmente, etc.. Quem deve não pode reclamar de ser cobrado e essa cobrança pode acontecer aos sábados ou em dias de semana até as 22 horas, porque geralmente esse é o horário que o consumidor está em casa. Constrangem o consumidor, a nosso ver, cobranças após as 22 horas e aos domingos, porque esses são horários de descanso. Nos demais, a cobrança é permitida, mas deverá recair sobre o consumidor e não sobre sua família. Quando o consumidor fornece seus dados profissionais, está tacitamente autorizando que as cobranças sejam efetuadas no seu trabalho, sem que isso implique qualquer constrangimento. A cobrança, no entanto, deverá ser feita ao consumidor e nunca ao seu chefe ou a colegas de trabalho. É comum também o consumidor ser cobrado por aquilo que já pagou. Essa cobrança não confere ao consumidor o direito de receber o dobro do valor cobrado. Esse direito só existirá quando o consumidor for cobrado e venha, acreditando na cobrança, a efetuar o pagamento novamente. Quando o consumidor é cobrado e informa ao credor que já pagou, nenhum direito possui, já que isso é natural no mercado de consumo. A insistência na cobrança de dívida já paga poderá, no entanto, acarretar constrangimentos. O consumidor que não paga pode ter seu nome inscrito em serviços de proteção ao crédito, a dívida pode ser levada a protesto etc.. Se a negativação do consumidor decorrer de dívida já paga, terá ele, em tese, direito a indenização. Quando cobrado de forma vexatória, o consumidor terá direito à indenização, pelos danos materiais e morais que sofrer. O Governo Federal vai divulgar, a partir de julho, a relação dos devedores inscritos na dívida ativa da União. Sem dúvida que essa medida acarreta constrangimentos ao contribuinte. O pior é que isso acontece ao mesmo tempo em que se busca a flexibilização no pagamento dos precatórios. Quando o Governo é credor constrange seus devedores na cobrança. Quando deve, dá calote. Há nítida desproporção entre esses procedimentos, que revela que o que vale para o Governo não vale para os cidadãos. As normas do CDC em relação à cobrança de dívidas são principiológicas, o que significa que comportam aplicação também nos demais ramos do direito. Ninguém, nem mesmo o Estado, pode constranger seus devedores na cobrança de dívidas. Quem for constrangido, tem direito a indenização. Nota do Editor: Arthur Rollo é advogado especialista em Direito do Consumidor.
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