A água desconhece fronteiras, corta territórios, une e divide nações. É o principal elo entre as civilizações desde o princípio da humanidade. Símbolo de fertilidade e prosperidade, deu lugar no século 20 ao petróleo como principal indicador de riqueza de uma nação. No início do século 21, economistas, empresas, políticos e lideranças comunitárias voltam a levar em conta a água como determinante para o progresso de um país. Patrimônio natural e essencial a todas as formas de vida, a água transformou-se em um recurso econômico, fonte de lucro e razão para conflitos. Sua escassez atinge mais de 2 bilhões de pessoas e, se não forem adotadas medidas para racionalizar sua exploração, em algumas décadas 4 bilhões de pessoas não terão água para as necessidades básicas. Na América Latina, onde se concentram as principais reservas estratégicas de água e biodiversidade, a soberania dos povos está no centro da geopolítica mundial, exigindo um plano urgente para sua preservação. As águas da Amazônia integram nove países e têm a maior riqueza de biodiversidade do planeta. As águas do Prata interligam outros quatro, cruzando as regiões mais industrializadas do continente, que contaminam as águas marinhas. O Aqüífero Guarani é a maior reserva subterrânea do mundo, com capacidade para abastecer mais de 700 milhões de habitantes. Localizado entre Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, vem sendo vítima de um ciclo de cobiça e colonização de suas terras, a partir do investimento de grandes grupos econômicos estrangeiros no local. Para seu controle, inclusive militar, os EUA planejam uma base no Paraguai e propagandeiam o risco terrorista na Tríplice Fronteira, onde está Foz do Iguaçu, a mais importante área de recarga do manancial. Nesse contexto, é bandeira estratégica para a sobrevivência do planeta a criação de uma Organização Latino-Americana da Água, sob a liderança de Venezuela, Bolívia, Cuba, Equador, Nicarágua e governos populares, a partir do Fórum Social Mundial de 2009. A entidade teria a missão de promover a defesa da água como direito inalienável dos povos, como contraponto às políticas neoliberais preconizadas pelo Fórum Econômico Mundial e materializadas pela OMC (Organização Mundial do Comércio). Sua interface com as lutas sociais no campo da saúde pública (a partir do tratamento de esgoto, lixo e drenagem) e da economia (a partir de seu uso na geração de energia), cujos conflitos causados pelo modelo dominante se agravam a cada dia, a colocará em posição decisiva para que a sociedade vença o caos do sistema e as lideranças humanistas e populares assumam seu papel na redefinição do modelo de desenvolvimento, em prol do futuro da humanidade. É nessa direção que o Movimento Grito das Águas lança a campanha pela água como direito fundamental e dever do Estado, no Rio de Janeiro, no próximo dia 22 de março (Dia Mundial da Água), visando uma emenda constitucional que garanta fornecimento gratuito de 45 litros de água-dia por habitante, como estratégia de mobilização para o Fórum Social Mundial da Água, em janeiro de 2009, em Belém do Pará. Nota do Editor: Leonardo Aguiar Morelli (aguiarmorelli@hotmail.com) é ambientalista, coordenador do Movimento Grito das Águas e secretário-geral do Instituto para Defesa da Vida.
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