Capacitar professores de ciências e alunos do ensino fundamental para a disseminação do conhecimento sobre a preservação dos manguezais, com ênfase no ciclo de vida de uma de suas principais espécies: o caranguejo-uçá (Ucides cordatus). Essa é a proposta do trabalho de educação ambiental conduzido pelo biólogo Marcelo Amaro Pinheiro, coordenador executivo do campus Experimental do Litoral Paulista (CLP) da Universidade Estadual Paulista (Unesp). A iniciativa, realizada em escolas públicas e particulares, é um desdobramento do Projeto Uçá, que promove a otimização do manejo do caranguejo-uçá em ambiente natural com apoio da FAPESP na modalidade auxílio a pesquisa. No segundo semestre de 2006, mais de mil alunos e professores das cidades de São Vicente e Praia Grande (SP) já participaram do trabalho de educação ambiental. “A nossa meta é atingir sete mil jovens até o final de 2007, incluindo as escolas dos municípios de Iguape e Cananéia, onde o Projeto Uçá foi desenvolvido”, disse Pinheiro à Agência FAPESP. Primeiramente, os alunos são submetidos a um questionário para avaliação de seu conhecimento empírico sobre o assunto, para depois participarem de uma palestra multimídia. Em seguida, eles recebem uma cartilha com histórias em quadrinhos sobre os hábitos do crustáceo. Intitulada Gu & Gui e o Caranguejo-Uçá, a publicação mostra, com humor e embasamento científico, a importância da preservação dos manguezais, ecossistema vital para o ciclo de vida do mar e dos rios. Na história, com auxílio do professor “Magrão”, dois garotos conhecem a biodiversidade e as características peculiares dos mangues. No final do processo, os alunos são submetidos a um novo questionário, de modo a avaliar a eficiência do aprendizado. “Como os alunos levam as cartilhas para casa, a idéia é utilizar a criança como fonte de divulgação do conhecimento entre seus familiares, como o ciclo de vida, a importância ecológica e as formas de manejo do caranguejo”, conta Pinheiro. Entre o mar e os rios O biólogo explica que os mangues, um ecossistema ecótono, ou seja, um ambiente de transição entre o mar e os rios, vêm sofrendo com a degradação humana. “O aterro de manguezais para fins de especulação imobiliária é cada vez mais comum em todo o país, por se tratar de terras baixas que ficam próximas ao mar”, lamenta. Apesar de serem desmatados, aterrados e vendidos como terreno para a construção de casas, os manguezais são considerados berçários da vida marinha, por abrigarem uma série de espécies animais de importância econômica, em especial crustáceos e peixes, que se utilizam dessas áreas para refúgio e alimentação. Como as águas normalmente são mais rasas e quentes, o ambiente também é propício à reprodução. Pinheiro, que há mais de 15 anos estuda os crustáceos brasileiros, aposta que a divulgação de conhecimentos para a comunidade litorânea, adquiridos em pesquisas científicas conduzidas pela Unesp, assume primordial importância nesse cenário. “Quem chega a um ambiente de manguezal logo sente um cheiro forte, parecido com ovo podre. Por conta disso, a área é muitas vezes confundida com esgoto e lixo público”, alerta. “Um dos objetivos do projeto de educação ambiental é mostrar que aquele cheiro ocorre pela liberação de gás sulfídrico devido à decomposição de bactérias”, explica. Segundo ele, os mangues são ambientes ricos em matéria orgânica e hospedam microrganismos que degradam restos de árvores e folhas. Esses microrganismos consomem tanto oxigênio que o gás não chega à camada inferior do solo, onde ficam as bactérias que não precisam de oxigênio, conhecidas como anaeróbias. “São essas as bactérias responsáveis pelo mau cheiro dos manguezais. Elas são responsáveis por processar o enxofre, elemento químico oriundo de ambientes ricos em matéria orgânica. Com o processamento do enxofre, o gás sulfídrico é liberado”, explica Pinheiro. “E é justamente a grande quantidade de matéria orgânica dos manguezais que atrai os peixes e crustáceos”, disse. Marcelo Pinheiro calcula que as áreas ocupadas pelos mangues no Brasil totalizem cerca de 25 mil quilômetros quadrados, com 85% concentrada nos estados do Amapá, Pará e Maranhão. Somente a área existente no Maranhão engloba a metade dos manguezais brasileiros, que correspondem a 15% do total desse ambiente em termos mundiais. “Na última década, a redução das áreas de manguezal no Brasil é estimada em mais de 10%”, aponta o pesquisador da Unesp.
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