Estradas perfeitas, carga tributária adequada, leis de trabalho rigidamente cumpridas. Este cenário da maioria dos países da União Européia é o oposto do encontrado no Brasil, onde a má conservação rodoviária, os excessivos impostos - agravados pela cobrança de pedágio - e a ausência de uma legislação trabalhista específica para o setor são os principais desafios dos transportadores. Mas apesar de todas as dificuldades, o desempenho das empresas nacionais não deve em nada ao de suas semelhantes européias. "Já estamos em pé de igualdade com os europeus em relação à qualidade e tecnologia de caminhões e carretas e um passo à frente no que diz respeito à logística do transporte", afirma Markenson Marques, diretor-presidente da Cargolift Logística e Transportes, que esteve recentemente na Bélgica para avaliar as soluções de transporte lá adotadas para aplicá-las aqui no Brasil. O contato com transportadores europeus mostrou alguns dados alarmantes, que apenas comprovam os principais problemas do setor no Brasil. "Na Europa, as estradas são bem planejadas e construídas, o que traz ganhos significativos de consumo e maior conforto e segurança aos motoristas", explica, destacando que o consumo médio de um caminhão carregado em um trajeto entre França e Bélgica é de 3,1 km/l. Caminhão semelhante faz média de 2,7 km/l na ligação entre Curitiba e São Paulo, que tem características parecidas. "A diferença é que lá a estrada permite ao motorista acionar o piloto automático e manter velocidade constante em praticamente todo o trecho, enquanto que aqui ele precisa adequar a velocidade às características da rodovia, como curvas fechadas, subidas e descidas constantes, desvios e outros verdadeiros obstáculos à circulação", detalha Marques, que também é vice-presidente do Setcepar - Sindicato das Empresas de Transporte de Carga no Estado do Paraná. Outra grande desvantagem brasileira é o custo para o financiamento de veículos, que contribui para encarecer o gasto por quilômetro rodado. Na Europa, o mercado trabalha com taxas médias de 5,23% ao ano, enquanto no Brasil a taxa do Finame está em 11%. "Descontando a inflação, os juros reais na Europa estão na casa dos 4%, exatamente a metade dos praticados aqui". O pedágio adotado em grande parte da malha viária é outro fator que encarece o frete. "Vale o exemplo das estradas belgas que são excelentes, totalmente iluminadas e não pedagiadas", complementa. Mas mesmo com tantas dificuldades, as empresas de ponta do setor conseguem obter em solo nacional marcas de produtividade melhores do que na Europa. A quilometragem média mensal percorrida por um motorista europeu é de 12 mil km, contra 16 mil km dos motoristas brasileiros. Umas das explicações para o desempenho está no maior comprometimento do caminhoneiro. "Ao contrário do Brasil, os motoristas que trabalham em grandes empresas na Europa não têm incentivos e motivações extras, como participações no lucro. Com isso, mesmo com o cumprimento mais rígido da jornada de trabalho, existe maior rotatividade nos empregos", destaca Marques, que defende a regulamentação da jornada de trabalho para os motoristas profissionais no país. A legislação específica sobre o tema tramita no Congresso Nacional há cerca de 10 anos e, se aprovada, trará uma série de benefícios ao setor. "Na Europa a carga horária máxima permitida é de 56 horas semanais, com paradas a cada nove horas e com a possibilidade de apenas dois picos de dez horas em uma semana. A regulamentação da jornada traria diversos avanços aqui no Brasil, principalmente porque obrigaria as empresas a melhorarem significativamente o trabalho de carga e descarga, ainda caótico em diversas delas". Com a adoção de um limite de horas de trabalho para o motorista, a demora ainda comum nestas operações será economicamente inviável. "Sem a regulamentação não conseguiremos mudar o panorama atual, em que algumas empresas, principalmente multinacionais, utilizam os caminhões como armazém. Para melhorar ainda mais o quadro, a lei deveria instituir uma carência máxima de uma hora para a descarga de um caminhão, com penalização para quem não cumprir o prazo", conclui.
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