Há cerca de 12 anos um amigo comprou um sítio próximo a Londrina, no Paraná, encantado com um riacho que cortava boa parte das suas terras. O tempo passou e o riacho começou a ter seu volume de águas diminuído, até que, no ano passado, secou por completo. Meu amigo não se conformou com o fim do "seu" riacho que, doze anos atrás, chegou a ter três metros de largura em determinado trecho e profundidade suficiente para merecer cuidados para atravessá-lo na época de cheias. Saiu terra acima até onde ficava a nascente, procurando por um desvio do curso das águas, talvez uma antecipação particular do projeto presidencial de transposição do São Francisco em terras paranaenses, mas, qual o quê, não havia nenhum sinal de desvio do riacho, nenhum indício de "mão-de-gato" fluvial. O riacho simplesmente se extinguira, sumira, desaparecera. O riacho em questão vem apenas se somar a diversos outros episódios que demonstram a perda de qualidade ambiental no Brasil e no mundo, a começar pela seca que assolou o oeste de Santa Catarina e parte do Rio Grande do Sul, em plena época que normalmente seria considerada de chuvas, causando enormes perdas nas lavouras de milho, soja e feijão, e também na produção de leite. Em novembro último, mês que tem média histórica de 167,5 mm, caíram apenas 72 mm, e em dezembro, cuja media é de 172,9 mm, caíram somente 26,9 mm. Por outro lado, o ciclone que atingiu Santa Catarina foi classificado como o primeiro furacão no País documentado pela Organização Meteorológica Mundial, mostrando que o Brasil não está imune aos desvarios que enlouquecem o clima do planeta. No exterior, a situação é tão alarmante quanto aqui. Os Alpes, por exemplo, perderam 10% do gelo em um ano. O Kilimanjaro, os pólos e o Tibete também estão perdendo gelo. E, segundo a Nasa, a agência espacial americana, 2005 foi o ano mais quente já registrado, desde que os registros meteorológicos começaram a ser feitos, no final do século 19. E os demais anos mais quentes foram 1998, 2002, 2003 e 2004, o que indica mais do que uma tendência, indica uma realidade catastrófica. Nos últimos 30 anos, a temperatura da Terra aumentou 0,6 grau Celsius, ante 0,8 nos últimos cem anos. Na Europa, a circulação do Atlântico Norte está 30% mais fraca de 1957 para cá, o que é uma confirmação sombria de previsões realizadas, indicando que o efeito estufa virá a eliminar a chamada corrente do Golfo, mecanismo que impede que o noroeste daquele continente tenha temperaturas árticas no inverno. De acordo com o oceanógrafo Detlef Quadfasel, da Universidade de Hamburgo, na Alemanha, na revista "Nature", "isso é algo previsto pelos modelos climáticos, mas que estamos vendo acontecer pela primeira vez". A Organização Meteorológica Mundial informa que os desastres climáticos em todo o planeta responderam pela morte de 350 mil pessoas e por prejuízos acima de US$ 200 bilhões somente no ano passado. 2005, aliás, foi o ano de maior número de tempestades tropicais (26) e de furacões (14), alguns devastadores, como os tsumanis e o Katrina. Dependendo da continuidade das emissões de gases do efeito estufa, a temperatura ao longo deste século 21 poderá subir até quase 4 graus Celsius. No Brasil, pode subir 4 graus na Amazônia, de 2 a 3 graus no Nordeste e 3 graus no Sul. Em nosso país, a propósito, será preciso repensar nossos caminhos, pois não podemos continuar contribuindo com cerca de 4% do total mundial de emissões de gases, o que nos coloca entre os principais emissores. Precisaremos de mudanças radicais nas políticas amazônicas e não podemos continuar indiferentes à devastação que vem ocorrendo no Pantanal e na Mata Atlântica, que só conserva 7% de sua área original. Se nada fizermos a respeito, só nos restará pedir fervorosamente a Jesus, como no episódio da mulher samaritana, que nos dê para beber a água milagrosa ("aquele que beber da água que eu lhe der, nunca mais terá sede"). Quem sabe, assim, o riacho do sítio do meu amigo volte a brotar, os Alpes parem de perder gelo e a Mata Atlântica volte a ostentar seus 1 milhão e 290 mil km² contra os seus atuais 90.438 km². Nota do Editor: Dr. Márcio Dantas de Menezes é cirurgião vascular, presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Sexual e conselheiro consultivo da Sociedade Brasileira de Medicina Estética - Regional São Paulo.
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