Quando falamos de cinema, uma palavra logo nos vem à mente: Hollywood. Isto não é por acaso, afinal, a indústria cinematográfica americana e mundial, muitas vezes, tem nesta lendária palavra uma espécie de sinônimo de glamour da sétima arte. Por mais céticos e críticos que sejamos ao nos referirmos à produção em massa e de qualidade ética e cultural questionável dos "enlatados" americanos, pelo menos uma vez por ano paramos diante da indústria hollywoodiana para aguardar a apresentação de uma produção cinematográfica que nos faça rever nossos conceitos e acreditar que quando se tem uma boa história e muitos talentos comprometidos envolvidos com esta. O encanto do cinema reaparece e nos faz sonhar, refletir, aprender, questionar, sofrer ou mesmo libertar a mente para novos pontos de vista sobre o mundo e sobre a maneira de entender os comportamentos humanos. Pois neste final de semana, especificamente no dia 19/02 tive a felicidade de assistir ao filme "O Aviador", que conta a vida de Howards Hugles, brilhantemente interpretado por Leonardo Di Caprio que soube emprestar seu corpo, sua mente e um pouco de sua alma para viver o excêntrico milionário que revolucionou a aviação mundial no século passado. Só por isso o filme já vale a pena ser visto. No entanto, ele vale mais. Além de ser visto, deve ser observado com um olhar mais cuidadoso e generoso por parte de nós, expectadores. Afinal, mais do que atos corajosos e mesmo desafiadores, o filme mostra um homem nitidamente genial, a frente do seu tempo, com uma paixão e obstinação por suas idéias e ideais que o fizeram, por diversas vezes, arriscar todo seu status e estabilidade de multimilionário - que poderia ter limitado sua vida às mais caras e bizarras luxurias, mas não o fez. E isso talvez tenha ocorrido justamente por ser Howard Hugles uma personalidade incomum, anormal para muitos, mas certamente um prisioneiro sofredor de um transtorno que o levou ao isolamento e a uma ruptura com a realidade, tamanha a gravidade de seu TOC (Transtorno Obsessivo Compulsivo). Mais uma vez Hollywood nos surpreende e traz ao universo leigo um belo filme, com uma bela e precisa informação sobre um transtorno desafiador e que afeta de 3 a 4% da população mundial. É uma ótima oportunidade de tirar o TOC das estantes acadêmicas e colocá-lo na sala de estar, de festas e bares como assunto de conversas produtivas. Uma grande chance de sermos menos preconceituosos e mais empáticos com os nossos semelhantes, afinal somente através do conhecimento desprovido de julgamentos cheios de vaidade, poderemos auxiliar indivíduos com TOC na busca de tratamento adequado, o que pode abreviar e reduzir o sofrimento e as limitações vivenciadas por eles, quase sempre de maneira penosamente solitária. No caso de Howard Hugles, o transtorno chegou a tal ponto de gravidade que ele mandou lacrar portas e janelas na tentativa de imunizar sua casa. Sua doença foi o grande fator responsável para que o crescimento de seu império estacionasse. Se não tivesse sido paralisado pelo TOC, Hughes poderia ter ido muito mais longe nas asas de seus aviões, quem sabe teria alcançado a liberdade de viver feliz entre nuvens e as "bactérias nossas" de todos os dias. Nota do Editor: Ana Beatriz Barbosa Silva é Médica Psiquiatra, especialista em Medicina do Comportamento pela Universidade de Chicago. Autora do Best-seller "Mentes Inquietas", além dos títulos "Mentes & Manias" e "Sorria, Você Está Sendo Filmado", Editora Gente.
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