A criança que tem muitas atribulações no dia-a-dia pode, na tentativa de não decepcionar os pais, ter o desenvolvimento do seu caráter prejudicado e sofrer algumas reações físicas e psíquicas, comparadas em grau e intensidade aos adultos. Acontece, no próximo dia 12 de outubro, um dos momentos mais esperados por todas as crianças do Brasil. Desde 1960, esta data foi oficialmente estabelecida para comemorar o dia das crianças e, desde então, elas estão adquirindo cada vez mais espaço e conquistas perante à sociedade, até mesmo com a aquisição de um regimento próprio, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). A criança, entretanto, até o século XVII, convivia igualmente com os adultos, não havia um mundo infantil, diferente e separado, ou uma visão especial da infância e, muito menos, o dia das crianças. Mas, durante a Idade Moderna, a história começou a mudar totalmente. A partir de então, a criança é vista como um indivíduo que precisa de atenção especial e passa a ser considerada como um ser inocente e dependente do adulto. Por isso, hoje em dia muitos pais têm a concepção da infância como o espaço da alegria, da inocência e da falta de domínio da realidade; muitos outros, contudo, preferem à moda antiga, ou seja, tratam as crianças como adultos, inserindo-as no atual mundo agitado, repleto de informações, tecnologia e uma grande quantidade de atribulações no dia-a-dia. Estas crianças que são tratadas como adultas são muito exigidas em função do mundo em que vivemos: devem saber dominar a informática, falar outras línguas, praticar esportes, tirarem sempre notas altas na escola, serem boazinhas e obedientes, enfim, serem "eficientes" em tudo o que fazem, sempre ocupadas com atividades que precisam cumprir, mesmo que não sobre tempo para brincar, não conseguem ser o que são: crianças. De acordo com a psicoterapeuta e diretora do Instituto de Psicologia Avançada AMO, Maura de Albanesi (www.mauradealbanesi.com.br), tantas responsabilidades podem ser colocadas como obstáculos para a criança, uma vez que nem sempre ela consegue se adaptar a tantas atribulações. Isso pode prejudicar o seu desenvolvimento sadio. Com tantas informações, atividades e na tentativa de não decepcionar os pais, a criança sofre algumas reações físicas e psíquicas, tais como: agressividade, hiperatividade, angústia, medo, bondade em demasia, ser apegada aos adultos, desenvolver tiques, dificuldades escolares e de relacionamentos com os colegas e pais, falta de limite, síndromes de pânico, depressão infantil, dentre tantos outros distúrbios comparados em grau e intensidade aos adultos. "Os pais querem ocupar o tempo dos filhos cada vez mais cedo para que eles não dêem trabalho e não tenham momentos ociosos. Mas, temos que estar cientes de que uma criança que exerce tantas atividades incompatíveis com a idade vai ter alguns problemas de saúde precocemente, até mesmo o estresse, que é justamente a reação do organismo quando a cabeça está ocupada com tantos compromissos e preocupações a ponto de não ser mais possível pensar em algo diferente e criativo. Portanto, os momentos vagos e as brincadeiras de criança também são importantes para se fazer uma "faxina" nos pensamentos, até mesmo para os adultos", diz a psicoterapeuta. Através das brincadeiras é que a criança consegue ativar a sua criatividade, desenvolve o aparato conjuntivo, estabelecer limites e regras nos jogos, que se entendem nas relações pessoais, desenvolvendo ética, respeito de maneira natural e espontânea. Infância: época de brincar A psicologia não tem dúvida de que a infância é a etapa de preparação do pensamento para a vida adulta. O pensamento infantil não tem ainda uma lógica racional, por isso as brincadeiras de crianças são muitas vezes ingênuas e sem graça para os adultos. Mas há crianças que já levam uma vida de adulto, e gente grande que ainda acha que é uma criança, por que isso acontece? No mundo interior de cada pessoa, há uma parcela do nosso campo energético reservado à percepção de si mesmo e dos outros, isto é, observar e comparar o nosso comportamento em relação ao das outras pessoas. Trata-se da auto-imagem e do autoconceito, onde o indivíduo percebe e atribui valores à realidade que o cerca, ou seja, percebe e dá significados a si mesmo, formando gradativamente a sua opinião sobre as coisas e as pessoas à medida que se relaciona com os outros e com o meio ambiente. "Este autoconceito forma-se principalmente durante a infância, desde a fase de bebê, podendo alterar-se ao longo da vida. O processo de formação do autoconceito vai levar a criança a compor um "perfil", uma imagem daquilo que ela julga ser certo e errado na vida dela", explica Maura. Algumas vezes, contudo, a criança pode vir a incorporar valores de outrem ao seu autoconceito sem perceber isso como, por exemplo, ter a rotina corrida de um adulto que, geralmente, é o conceito dos pais, porque são as pessoas mais próximas da criança. Quando isto acontece (fenômeno denominado interjeição) surge uma obstrução na comunicação da criança com ela mesma. Neste momento, a criança fica confusa, esquece o que ela julga ser certo e errado e absorve dos outros valores éticos, morais e energéticos. "Quando estes valores absorvidos forem negativos, a criança, quando for adulta, na realidade, ainda vai agir e querer ser uma criança, pois este indivíduo vai se sentir perdido no mundo dos adultos porque ele não obteve os seus conceitos e caráter formados como deveriam, sem a influência de conceitos alheios. É desta forma que às vezes um adulto passa a ter o comportamento e reações infantis, porque ele incorporou os valores que lhe fora passados, sem a peneira dos seus sentimentos. Logo, surge a vontade de voltar a ser uma criança para resgatar o seu si mesmo, explica a psicoterapeuta. Tratamento A criança que já está na fase da obstrução na comunicação com ela mesma precisa de ajuda imediatamente. Dessa forma, não há porque estranhar a necessidade de um processo psicoterapêutico para resgatar e assegurar o bom andamento do desenvolvimento da criança. A psicoterapia vai auxiliar a criança e os pais, quando algo não está bem no desenvolvimento emocional ou social da criança. Entende-se assim, a necessidade de um ambiente que proporcione momentos à criança e os pais para que pensem suas relações, suas escolhas, suas dificuldades, seus sonhos e suas possibilidades. "Por meio da utilização de algumas técnicas que têm embasamento na psicologia, a criança pode se experimentar sendo ela mesma e no relacionamento estabelecido em terapia, que é uma analogia em relação com as outras pessoas; pode "organizar" seus conflitos vivenciados internamente, aproveitando sua fase de desenvolvimento com mais tranqüilidade", finaliza Maura.
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