No século XIX as crianças não participavam das refeições familiares, se apresentavam na sala de jantar somente para as bênçãos noturnas. Criança não participava das conversas de família, nas classes abastadas faziam suas refeições com a governanta em local próprio; nas famílias menos privilegiadas embora estivessem à mesa, ficavam caladas e somente podiam responder perguntas a elas dirigidas diretamente. A partir de meados do século XX a infância conseguiu ser inserida nos bate-papos à mesa de refeições, mas esta conquista foi abalada com o advento da televisão. O aparelho inicialmente colocado em ambiente comum, trouxe o que chamamos de mutismo familiar, embora juntos, todos se calavam para ouvir o noticiário ou a novela e o diálogo foi morrendo. O aparelho de micro ondas e a popularização dos receptores de TVs, trouxeram outras mudanças: o jantar deixou de ser uma atividade coletiva e passou a ser individual... e estes foram os instrumentos finais e mortais das reuniões familiares à mesa. Os jantares coletivos ficaram restritos às comemorações de datas importantes para a família. Neste princípio de milênio encontramos uma família emudecida, amordaçada pelas agendas, pelo trânsito, pela televisão, pelo DVD, pelo vídeo game... os lares tornaram-se casas, um lugar onde dormimos, guardamos nossos pertences, onde realizamos refeições solitárias e tropeçamos com nossos familiares nos raros momentos de ócio partilhado. Nossas diferentes e intensas atividades não nos permitem "jogar conversa fora" e isso acaba cristalizando conflitos que solidificam relações vazias e frustrantes. Sonho com a possibilidade de conhecer um jovem que desliga espontaneamente o computador ou o telefone para jantar com seus pais, de um pai e de uma mãe que organizem suas agendas de forma a estar em casa para partilhar uma refeição com seus filhos... de uma família que resgate o espaço físico do diálogo e que este seja uma rotina amena e agradável. Como educadora, sonho com a da sala de jantar como instrumento do diálogo livre, contínuo, que nos dá possibilidade de conhecer o pensamento do outro, suas opiniões, suas crenças, suas dúvidas, seus desejos... aquela conversa que edifica a credibilidade e a confiança, o respeito e a tolerância... características essenciais ao relacionamento saudável. Nota do Editor: Edmara de Lima é educadora com formação em psicopedagogia e Diretora Pedagógica da Prima - Escola Montessori de São Paulo.
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