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Arte e Cultura
17/06/2004 - 10h00
A grande farsa da literatura
Rodrigo D’Almeida Bertozzi
 

Os livros existem porque nós escritores não encontramos com quem conversar. E deste labirinto de letras que impulsionam a alma a sonhar, a pensar criticamente e a guardar a memória. Em contrapartida vivemos uma época de anorexia intelectual em nosso glorioso país, talvez por preguiça, talvez por uma vocação consumista de produtos externos, mas o fosso em que nos enfiamos não pode mais ser ignorado. Uma ditadura imposta pela world literature onde nem sempre importa o conteúdo cultural, mas o potencial de mercado que o livro (produto) tenha e o forte apelo que possa causar. Trata-se de um embrutecimento gradativo, filha direta do excesso de opções midiáticas que existem, forçando uma cultura mais fragmentária, como minúsculos mosaicos que favorecem o encolhimento da cultura no Brasil. Vivemos a grande farsa, fingimos que conhecemos os assuntos (migalhas jornalísticas televisivas) para esconder a preguiça intelectual. Desta fratura intelectual que a falta da literatura na vida altera o potencial criativo, atrofia a visão de mundo e nos torna presas fáceis para o engodo imposto pela mídia.

Para que ler se tenho filmes? Para que me informar se posso consumir pequenas notas na Internet? Por que me enfronhar nas grandes questões humanas se isso traz a melancolia? Outro fator fundamental para entender esta grande crise que atravessamos é a superespecialização das profissões impulsionadas pela concorrência, obrigando um advogado, por exemplo, a estar somente atento a sua profissão e a atualização da mesma, ficando em segundo plano a formação na literatura.

O marketing bem trabalhado pelas editoras nacionais, impulsionados pela força mundial dos best-sellers fez com que o domínio do mercado nacional sejam de obras americanas ou de autores anglo-saxões. É mais fácil comprar os direitos autorais de uma máquina em andamento do que investir a fundo perdido em um autor desconhecido. Ou seja, nem sempre o que move a indústria do livro é a qualidade, mas o potencial do produto. Na visão de Pierre Lepape, autor francês, o livro não tardou muito a se submeter às normas da gestão industrial e da rentabilidade financeira com a visão do lucro predominando sobre a arte. Não estou a defender os autores, muitos deles precisam atualizar-se, realmente encarar a escrita como uma profissão séria e descer do sapatinho de cristal que muitos aceitam usar de bom grado. Eles necessitam sair dos bolsões de conforto e produzirem também uma literatura mais competitiva.

É preciso lembrar que o público nacional ­ (que pouco consome livros) no seu conjunto, assim como o sistema editorial e seus anexos de mídia, opõe apenas uma frágil resistência a esta tendência da internacionalização da cultura pop. É preciso satisfazer as expectativas do público-alvo. É a lógica hollywoodiana aplicada à cultura das letras. O jornalismo cultural também não colabora muito, seja pela falta de tempo ou paciência em analisar um jovem autor que não esteja no ciclo de conhecidos, ou por pura má-vontade, ser um escritor no Brasil é mais triste e complexo que possa parecer. Não existe lugar para os pequenos e pior que isso são sempre os mesmos nomes, das mesmas editoras, das mesmas regiões do país a dominarem a cena nacional que é abastecida de informações pelos gigantes do setor literário. Tudo isso é cansativo.

O dia que a literatura for engolida, não viveremos mais, apenas nos arrastaremos sem lembranças por entre sombras da existência existencial. Aristótoles acreditava que o homem prudente luta para libertar-se do sofrimento, não do prazer. E, ler, é um enorme prazer. Somos reféns desta lógica manequeísta de mercado. Mas, de quem então seria a culpa deste quadro melancólico? Editoras? Autores? Jornalistas? Leitores? Cada um a sua maneira participa deste extenso mosaico que representa a cultura e com um pouco mais de bom senso poderemos sair deste atoleiro.

Existe realmente algum movimento significativo na literatura brasileira ou somente um espetáculo farsista de uma ditadura editorial mundial?

Cabe a você a resposta. Faça isso antes que seja tarde. Muito tarde mesmo.


Nota do Editor: Rodrigo D’Almeida Bertozzi, autor dos livros Um Futuro Perfeito, Depois da Tempestade, O Senhor do Castelo e O Despertar, membro do conselho editorial da Juruá Editora.

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