Todos temos uma ferida na alma que nos dói e, por isso, algumas vezes, nos sentimos como alguém que partiu ou morreu, e entregamo-nos a uma sucessão de lamentos sem fim diante desse ou daquele problema que nos atinge, frente a uma e outra crítica que nos é dirigida. Claro, nenhum de nós é de ferro, apesar de nos considerarmos fortes feito uma rocha, só porque repetimos algum “mantra” supostamente filosófico, ou pretensamente edificante. Tanto não o somos que, incontáveis vezes, lá estamos nós, reclamando de tudo e de todos, menos de nós mesmos. Lá estamos nós, nos sentido melindrados, derrotados diante da vida, fazendo caras e bocas para que alguma alma generosa se apiede de nós. É óbvio que nenhum de nós irá admitir que em algum momento nos entregamos a esse papelão - ridículo, porém, humanamente compreensível - porque só de lembrarmos que já fizemos isso inúmeras vezes, mais do que depressa sentimo-nos envergonhados e, mesmo assim, não conseguimos largar essa mania pra lá de feia. Bem, não sou ninguém na ordem do dia para dar conselhos a alguém sobre como lidar com os perrengues da vida, porém, se derem uma licencinha a essa figura quixotesca, permitam-me dar um pitaco. Só um. Toda vez que estivermos sentindo pena de nós mesmos, clamando aos céus para que alguém tenha dó da gente, faça o seguinte: chegando a noite, no momento em que formos dormir em nossa cama limpinha e confortável, deitemos em posição fetal, peguemos um crucifixo e durmamos abraçado com ele e, abraçado com o crucificado, procuremos lembrar de tudo o que está nos apoquentando e reflitamos sobre isso, abraçadinhos com Nosso Senhor crucificado. Tenho certeza de que nosso mimimi desaparecerá num estalar de dedos. Tenho plena convicção de que o derrotismo transformar-se-á num desejo irresistível de servir ao próximo, de lutar pelo que é digno e justo, sem pestanejar, sem esmorecer, sem lamentar. A vida é, como bem nos lembra a oração da “Salve Rainha”, um vale de lágrimas, não um mar de rosas. Por isso, abrace-o, seja forte e sirva ao próximo com amor, não com murmurações e lamentações.
Nota do Editor: Dartagnan da Silva Zanela é professor e ensaísta. Autor dos livros: Sofia Perennis, O Ponto Arquimédico, A Boa Luta, In Foro Conscientiae e Nas Mãos de Cronos - ensaios sociológicos; mantém o site Falsum committit, qui verum tacet.
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