Estamos terminando o novembro mais longo da história brasileira. As eleições, realizadas a 2 e 30 de outubro, estão sob contestação, a maior parte das urnas eletrônicas nelas empregadas sofre restrição técnica e os poderes institucionais, em vez de harmônicos e independentes, atuam desarmoniosos e insubmissos à Constituição. O principal problema é estrutural e está no Judiciário, onde os magistrados, cuja razão da sua investidura é julgar, têm o ônus de administrar o processo eleitoral e, com isso, perdem a isenção e até o equilíbrio quando provocados a julgar. Como alguém pode julgar de forma isenta e aconselhável aquilo que foi realizado sub a sua própria administração? O concreto é que os resultados foram declarados, existem as contestações técnicas e partidárias, há o revide da Justiça Eleitoral, o povo descontente está nas ruas (especialmente nas portas das unidades militares) clamando por providências e não sabemos quem estará habilitado para deslindar as divergências e acessar a esperada paz. Precisamos de soluções, as mais rápidas e aceitáveis possíveis. O País não pode seguir indefinidamente na provisoriedade ou, pior, na incerteza. Não sou daqueles que pregam a ruptura constitucional, mas por uma questão de consciência, tenho de clamar pela conclusão do processo eleitoral com a devida aceitação de ganhadores e perdedores, sem o que dificilmente haverá a estabilidade de que tanto necessitamos. Todos os atores deste desagradável teatro precisam colocar as mãos na consciência para, antes de tudo, lembrar quais são seus papéis no contexto e, em seguida, executá-los da melhor forma. Queremos a manutenção constitucional, mas, para isso, é preciso pelo menos cessar os efeitos de medidas inconstitucionais já ocorridas que hoje determinam o impasse. Lembrem-se que, em todas as vezes que se quebrou o jarro, esse não era o propósito inicial, mas revelou-se a única forma de acabar com a crise. Hoje os personagens são outros, o quadro é diferente dos anteriores, mas a mecânica poderá ser a mesma e levar a mais um duro revés à nossa problemática democracia que, apesar de cantada em prosa e verso ao longo das últimas quatro décadas, ensejou a instalação do quadro crítico hoje vivenciado. Os verdadeiros democratas e cultores do respeito ao ordenamento jurídico devem atentar para a necessidade de reformas em todo o arcabouço legal, institucional e administrativo do País. A despeito de todas as mudanças a que estivemos submetidos, ainda convivemos com institutos e procedimentos do período Vargas (1930/1945) que, com o passar do tempo, foram apenas remendados, mas nunca efetivamente reformados. Vêm de lá as estruturas da Justiça Eleitoral, o centralismo da União, que fica com a parte do leão da arrecadação tributária e controla com mão de ferro os endividados Estados e Municípios, e outras coisas que precisam ser modernizadas e colocadas dentro da perspectiva do mundo globalizado. Como alguém do povo - de onde, segundo a Constituição - emana todo o poder, esperamos que os nossos representantes, eleitos ou delegados, recorram à parcela de patriotismo que ainda deve lhes restar e façam o que de sua obrigação para encerrar a crise do processo eleitoral sem que haja distúrbios e, principalmente, derramamento de sangue entre irmãos. Acho que não é pedir muito... Nota do Editor: Dirceu Cardoso Gonçalves é tenente da Polícia Militar do Estado de São Paulo e dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo).
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