A eleição que parecia que não iria acabar mais, enfim terminou e, diante de seu fim, muitas são as questões que ficaram nas valetas da apuração. De cara, vem à minha mente, uma questão: a tal da “polarização”. Muitos se manifestaram alarmados diante dessa divisão como se isso fosse uma ameaça à democracia, um perigo para as instituições, uma fonte inexaurível de tensões e assim por diante. De minha parte, francamente, não vejo a dita cuja da “polarização” como sendo um mal. Muito pelo contrário. Vejo nela um sinal benfazejo para o amadurecimento político da nossa sociedade. Explico-me: até pouco tempo atrás, o que tínhamos era uma encenação farsesca de rinhas eleitorais onde não havia uma clara disputa entre projetos de Brasil, ideologias e visões de mundo diferentes, mas apenas e tão somente uma "lutinha ensaiada" entre compadres para disputar cargos públicos entre o que poderíamos chamar de “esquerda”, a “direita da esquerda” e as “forças do atraso”, as agremiações fisiológicas que abundam pelo Brasil. Com a “polarização” que, de certa forma, começou a germinar em 2013, vemos pessoas simpatizarem com a imagem de uma “direita conservadora” incipiente, indivíduos que se afeiçoando com o retrato de uma “esquerda tupiniquim” e, é claro, muitos indiferentes a tudo isso. Digo que simpatizam e afeiçoam-se, porque os elementos que constituem cada uma dessas visões de mundo, não estão ainda bem claras para os cidadãos que optam por uma ou por outra, mas, mesmo assim, esse contraste mínimo já é um grande progresso, tendo em vista que a confrontação entre uma visão conservadora e uma perspectiva revolucionária permite que possamos, gradativamente, ter uma visão mais clara da realidade política brasileira. É imprescindível que os opostos existam para que possamos ver nossos erros e excessos e, vendo-os, corrigi-los, pois, como nos ensina Goethe, a clareza nada mais seria que o fruto do contraste entre a luz e as sombras. E, nesse sentido, a mornidão política que havia entre nós em nada contribuía para isso e, por essa razão, vejo na polarização um elemento indispensável para o amadurecimento da nossa democracia e para o fortalecimento do nosso senso cívico.
Nota do Editor: Dartagnan da Silva Zanela é professor e ensaísta. Autor dos livros: Sofia Perennis, O Ponto Arquimédico, A Boa Luta, In Foro Conscientiae e Nas Mãos de Cronos - ensaios sociológicos; mantém o site Falsum committit, qui verum tacet.
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