Confúcio, o grande sábio chinês, em seu “Analectos”, ensina-nos que, para uma sociedade poder superar uma crise, primeiramente deve-se procurar retificar as palavras. Ora, quando estamos em uma situação de crise é porque, necessariamente, não mais conseguimos nos entender com um mínimo de clareza a respeito do que estamos discutindo e, se não conseguimos dizer com relativa precisão o que está nos causando desassossego, provavelmente nós não conseguimos identificar de uma forma minimamente razoável o problema que está nos causando sofrimento. E se não sabemos identificar o problema para o qual precisamos redirecionar as nossas energias, admitamos ou não, nós não sabemos o que estamos fazendo e, obviamente, não temos a menor noção do que estamos dizendo. Por isso, numa situação de crise, é urgente retificar o sentido das palavras para que elas, de fato, sejam ferramentas úteis nessa tarefa, caso contrário, serão apenas um agravante às encrencas presentes. Podem até servir para extravasar as nossas frustrações, mas não mais que isso. Aliás, façamos um experimento muito simples: todos nós, independente de nossas predileções políticas, dizemos aos quatro ventos, e a plenos pulmões, que somos defensores dessa tal de democracia e que, no nosso entendimento, não existe na face da terra pessoa mais democrática do que nós. Porém, todavia e entretanto, quantas vezes nós paramos para refletir a respeito do que seria essa tal de democracia? Quanto tempo, realmente, nós dedicamos para conhecer esse trem “maravilindo”? Provavelmente muito pouco, para não dizer menos que isso e, mesmo assim, nos consideramos pessoas tremendamente democráticas, seja lá o que isso queira dizer. E, com base nessa palavra cujo significado foi esvaziado de forma [depre]cívica pela nossa ignorância e má vontade, nós acabamos rotulando, com nossos juízos malformados, boleiras de pessoas como sendo [supostamente] antidemocráticas. Por isso, não existe a menor possibilidade de sanar de forma minimamente decente uma crise enquanto não procurarmos, com honestidade, rever os nossos conceitos e valores através da retificação das palavras que usamos.
Nota do Editor: Dartagnan da Silva Zanela é professor e ensaísta. Autor dos livros: Sofia Perennis, O Ponto Arquimédico, A Boa Luta, In Foro Conscientiae e Nas Mãos de Cronos - ensaios sociológicos; mantém o site Falsum committit, qui verum tacet.
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