Depois de toda a polêmica sobre as pesquisas e a divulgação de seus resultados - que poderiam estar viciados e utilizados como propaganda disfarçada - os últimos levantamentos mostram os dois candidatos presidenciais em situação próxima ao empate se consideradas as margens de erro. Uma visão desapaixonada do quadro leva à conclusão de que o eleitorado ainda não se decidiu ou, pelo menos, não revelou sua decisão aos pesquisadores. Há muitas hipóteses para justificar o momento e, principalmente, para deslustrar as empresas e as metodologias empregadas para aferir a intenção de votos. Vícios que vieram se acumulando eleição após eleição e hoje chegou ao ponto de fervura, exigindo mudanças para evitar a imprestabilidade das eleições como representação popular e o consequente prejuízo à atividade política, à administração pública e à população. Vivemos um período eleitoral de muitas feridas e exacerbação, onde a militância faz questão de agir belicosamente. Há pouca diferença entre a verdade e a mentira e ambas são utilizadas para atrair (e enganar) o eleitorado, cada dia mais insatisfeito com os representantes que acabam por eleger. A nefasta judicialização da política, iniciada por parlamentares irresponsáveis - que, não tendo votos em suas casas legislativas, remeteram suas derrotas para as varas judiciais - acabou por potencializar o ativismo do Poder Judiciário, que no lugar de apenas guardar e interpretar a Constituição e o ordenamento dela decorrente, hoje age como Legislativo e Executivo, na medida em que arrebata tarefa daqueles poderes. Quanto às pesquisas, gostaria de estar certo de que representam a realidade do momento e não trazem qualquer manipulação. Mas o histórico recente não nos permite essa segurança e tranquilidade. Tanto que acaba de ser encaminhado na Câmara dos Deputados um projeto que busca alterações profundas à atividade. Deputados e senadores - os que foram reeleitos e os novos, que assumem no começo do próximo ano - vão se debruçar sobre a matéria para tornar mais contemporânea a pesquisa de opinião e intenção pública, tanto de votos quanto de consumo, serviços e outras atividades. Para se aferir o pensamento de uma população, não basta fazer dois mil telefonemas ou ouvir presencialmente igual número de pessoas e concluir que aquilo é o que pensam milhares ou até milhões de seus concidadãos ou compatriotas. A conclusão carece de mais elementos que, sinceramente, não sabemos se são considerados nos atuais trabalhos. A divulgação dos resultados é outro problema, que pode levar a distorções. Ao mesmo tempo em que a população tem o direito de saber como está a posição dos candidatos, é preciso pelo menos um pouco de segurança quanto à veracidade do colocado na planilha. Será profundamente chocante ao eleitor concluir que foi enganado e orientou seu voto na direção do que diziam as pesquisas, mas elas estavam erradas. Uma coisa era pesquisar a opinião do eleitorado há quatro ou cinco décadas quando haviam apenas jornais, rádio e televisão e até o telefone era precário. Tudo era muito controlável. Mas hoje, com a internet ativa e diretamente colocada nas mãos do povo - através dos celulares - muita coisas não passa pelo controle, apesar da saga que o Judiciário desenvolve, a ponto de até restabelecer no país a censura, que é proibida pela Constituição. Marchamos para última semana da campanha eleitoral. Uma jornada negativa onde as propostas dos concorrentes foram trocadas por ofensas ao adversário. Há uma incontrolável torrente de ataques que transformam o acontecimento cívico das eleições num inconveniente aberração. O eleitor, em vez de motivado, recebe estímulos de ódio. As campanhas e seus propagandistas parecem ter se esquecido que seus clientes postulam assumir os governos para supostamente resolver os problemas da administração e tornar melhor a vida do povo. Precisamos virar logo esse ciclo, e os congressistas terem a coragem de, no próximo mandato, avançar com a reforma política e eleitoral, antes que o processo degringole e o resultado do período eleitoral em vez de cívico, passe a ser criminal... Nota do Editor: Dirceu Cardoso Gonçalves é tenente da Polícia Militar do Estado de São Paulo e dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo).
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