Em novembro de 2019, o plenário da Câmara aprovou o substitutivo para o projeto de lei sobre as armas (PL 3723/19), que regulamentou as atividades dos CACs, sigla que reúne colecionadores de armas, atiradores profissionais e caçadores. A posse de arma é entendida como um direito adquirido, no Brasil, por meio do recebimento do Certificado de Registro de Arma de Fogo, emitido pela Polícia Federal. Segundo o Estatuto do Desarmamento, em seu artigo 5º, ou seja, uma vez com o certificado, a pessoa que o recebeu pode comprar uma arma de fogo de uso permitido, mas só pode estar sob posse dela em casa ou em um local de trabalho do qual seja o dono ou responsável legal. Ou seja, a arma deve permanecer o tempo todo dentro do estabelecimento. Já o porte de armas garante aos proprietários a possibilidade de andar armados nas ruas. Ou seja, com ele é possível transitar com a arma em ambientes para além da residência ou local de trabalho do dono do armamento. Sendo além dos CACs, o porte permitido somente à pessoas que façam uso da arma para fins profissionais e de defesa, além de moradores rurais e alguns casos específicos. Resumindo, a lei garante ao cidadão comum ter uma arma em casa para defesa pessoal, e aos CACs e profissionais da segurança e moradores rurais o porte de armas. A posse é um direito de legítima defesa e o cidadão tem o livre arbítrio de poder optar por ter uma arma em casa para sua proteção e da sua família. O porte é garantido ao cidadão dentro das regras estabelecidas e normas definidas. Em ambos os casos as normas são rígidas e as exigências são muitas, pelo menos teoricamente. A negligência de alguns pode vir num futuro próximo a tolher o direito de todos. Os números crescentes de registros têm causado preocupação. Atualmente, o Brasil possui mais de 605 mil registros ativos de CACs concedidos pelo Exército, esse contingente cresceu 474%: passou de 117.467, em 2018, para 673.818 este ano, até 1º de julho. Existem 2,8 milhões de armas registradas em acervos particulares. Além da quantidade definida como pertencente a CACs, que chega a 957,3 mil, outras 692,5 mil armas pertencem a cidadãos comuns com autorização para posse ou porte. Entre junho de 2021 e março deste ano, o número de clubes de tiro ativos no país subiu de 1.458 para 2.070, um crescimento de mais de 41% em apenas nove meses. Já entre junho de 2021 e maio passado, foram abertas 620 novas lojas para venda de armas. Alguns casos de irresponsabilidades tem ocorrido com frequência: no domingo (7) uma mulher, de 32 anos, morreu baleada por um tiro, dentro da casa onde morava com o namorado e três filhos, em Curitiba, com um disparo acidental, no momento em que a vítima manuseava uma pistola do companheiro, que tinha registro regular da arma e de CAC. Na segunda-feira (8) em Jacareí (SP), um homem de 27 anos, que igualmente possuía o registro de CAC, foi morto por um tiro acidental disparado pelo cunhado, de cerca de 8 anos, que encontrou a arma no carro. No dia seguinte (9) Lindomar Benedito da Silva, de 34 anos, motorista de ônibus, foi baleado na cabeça após de ter batido em um carro estacionado que pertence ao empresário Luis Paulo Lucatelli Furlan, também registrado como CAC que confessou em depoimento ter atirado na direção do carro de Lindomar depois da batida. É possível concluir que mesmo com regras rígidas e normas bem estabelecidas, com números tão crescentes é difícil o controle e a fiscalização, mas é extremamente necessário. É indispensável realizar operações constantes para fiscalizar clubes de tiro, coibir fraudes nos laudos que atestam a capacidade dos interessados em obter o registro de armas de fogo, investigação constante sobre armas adquiridas de forma fraudulenta e apurar crimes de falsidade ideológica. E não somente isso, mas é necessário esclarecer e educar a população com campanhas educacionais de como se portar diante da posse e do uso de armas, não adianta garantir um direito ao povo, se o povo não sabe como lidar com esse direito. Restringir o direito ao cidadão é limitar a sua liberdade, mas o indivíduo deve ter consciência que todo direito vem acompanhado de deveres. Nota do Editor: Mauricio Freire é Delegado da Polícia Civil, especialista em Segurança Pública e Ciência Política.
|