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Opinião
25/04/2022 - 06h21
Agora, o caminho para a crise institucional
Dirceu Cardoso Gonçalves
 

O dia 22 de abril - descobrimento do Brasil - foi feriado por muitos anos até que, considerando sua proximidade com Tiradentes (dia 21), optou-se pela homenagem ao inconfidente. Neste ano, vislumbra-se adicionalmente a crise institucional. O Supremo Tribunal Federal condenou e cassou o mandato do deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) - que xingou ministros daquela corte e por essa razão já esteve preso e ainda é constrangido a usar tornozeleira e não tem liberdade para se movimentar como cidadão e congressista. Parlamentares se movimentam para que o presidente Arthur Lira coloque o assunto na pauta da Câmara, para o plenário decidir sobre o mandato de Silveira. Até porque, a única instância judicial a recorrer seria o próprio STF, que já se posicionou por defenestrar o deputado. Na opinião de parlamentares, o STF extrapolou ao decretar a cassação do mandato, cabendo à Câmara decidir a respeito. Só pode cassar mandato recebido do povo via eleições quem também detém mandato popular, no caso os deputados. Aconteça o que acontecer, a crise institucional estará criada. Se a Câmara tiver posicionamento diferente do emitido pelo STF, a decisão da corte será descumprida e ficará explicitamente rompido o princípio contido no artigo 2º da Constituição, que determina os poderes da União, (Legislativo, Executivo e Judiciário) como “independentes e harmônicos entre si”. E, nesse quadro nada harmônico, como se comportarão a Câmara e o próprio STF para se manterem íntegros?

Os arroubos de Silveira são indevidos. Não lhe cabe, como parlamentar, o direito de ofender membros de outro poder. Deveria a Câmara, por suas prerrogativas, ter tomado de imediato as medidas que o caso exigia. Mas os parlamentares, pateticamente, optaram por autorizar a prisão do deputado, abrindo uma cratera ao pé de todos os congressistas que, a partir de então, pelo menos teoricamente, podem ser presos acusados por “crime de opinião”. Comportamento muito diferente da tradição do parlamento brasileiro, que dificilmente permitia que seus membros sequer fossem processados e, muito menos, encarcerados. Exemplo marcante, entre outros, é o do deputado Márcio Moreira Alves, que em 1968 fez um discurso contra os militares e a Câmara negou licença para ser processado. O governo militar fechou o Congresso e editou o AI-5, duro instrumento de censura e controle que vigorou por 10 anos.

A demagogia tem aprovado leis que reduzem a proteção e a representatividade dos eleitos. No lugar da impunidade de que se reclamava, temos hoje a fragilidade, que também é perniciosa. Embora indevidas as declarações de Silveira, parecem-nos exageradas as reprimendas do STF que, o próprio noticiário diz, tem avançado sobre prerrogativas tanto do Legislativo quanto do Executivo.

O quadro de hoje é resultado da falta de cumprimento rigoroso dos ditames da Constituição, do ordenamento jurídico dela decorrente ou agregado e dos regimentos institucionais. Um dos exemplos é que, por razões que não cabe aqui discutir, o STF age exacerbado, enquanto o Legislativo é titubeante e o Executivo reage mas releva as invasões. Os freios e contrapesos do regime estão desregulados. E um dos pecados que há muito se comete é o engavetamento dos pedidos de “impeachment”. O presidente da Câmara senta-se sobre as petições pelo afastamento do presidente da República (e pode até auferir lucro político com isso) e o do Senado tranca em sua gaveta os pedidos de impedimento de ministros do STF. Tanto um quanto o outro dirigente legislativo não deveria ter força para decidir sozinho ou pessoalmente essas questões. O ideal seria que submetessem todas as petições ao plenário de suas casas e o conjunto de deputados e senadores decidisse pelo arquivamento ou sequência dos pedidos de afastamento e, uma vez instalados os processos, os acusados tivessem a chance de se defender e o assunto ser liquidado com a sua absolvição ou a consumação do afastamento.

Temos no Brasil um volumoso ordenamento jurídico e instituições altamente aparelhadas para cumpri-lo. Mas, por razões diversas, as decisões são proteladas ou engavetadas e as instituições restam débeis e questionáveis. Isso precisa acabar, pelo bem da Nação.


Nota do Editor: Dirceu Cardoso Gonçalves é tenente da Polícia Militar do Estado de São Paulo e dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo).

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